Você tem cinco recados na sua caixa postal:
- Bom Dia, querida! Acho que ainda é cedo para te ligar, mas bem... Não agüentei você sabe e me conhece, não tem jeito, não gosto de me sentir ansiosa, costumo estragar surpresas, e isso tudo... Dulce, você está aí? Recuso-me te dar parabéns por uma secretária eletrônica idiota! Acorde e me ligue, eu te amo! Ah caso não tenha reconhecido é a idiota da sua irmã!
- Parabéeeeeeeeeeeens Dulce! Ah Cara, você fazer aniversário é tão excitante para mim! A idiota da sua irmã não estragou a surpresa não né? Se ela estragou... Ahh peraí, o telefone está tocando, deve ser sua irmã, acorde logo, mandei algo de especial para você! Ligue-me, dê um sinal de vida, faz mais de três dias que não vemos você. Amo-te cunhada!
- Dulce, você está aí? Está dormindo? Ligue para mim, a mamãe está preocupada, hoje é seu aniversário, não quero você nesta casa. Sua irmã já te ligou? Ela não estragou a surpresa não, né? Ligue-me, eu te amo filha. O fato de você retornar a ligação é uma ordem mocinha.
- Dulce, você está aí? Estamos esperando você aqui na firma, o chefe vai fazer uma festinha, não falte! Parabéns amiga, levante dessa cama e venha comer um pedaço de bolo!
- Dulce...
O botão de pause foi rapidamente acionado.
Será que ela simplesmente não poderia dormir? E daí que fosse seu aniversário? Era cedo, estava cansada e o sol da manha cismava em bater em seu rosto. Seus olhos se abriram, mirando o teto tão branco acima de sua cabeça. Levou as mãos ao rosto, afastando seus cabelos dos olhos, desejando que simplesmente não tivesse amanhecido. A noite havia sido calma, o sono havia sito tranquilo, ela conseguira dormir... Virou a cabeça e notou que a secretária eletrônica continuava a piscar aquela luz irritantemente vermelha, avisando-lhe que havia um recado ainda não ouvido. E quem se importa? Era só um dia qualquer. Mais um dia qualquer.
Chutou as cobertas, sentando-se na cama, erguendo os braços na tentativa fracassada de expulsar a preguiça e o cansaço que sentia. Era seu aniversário de trinta anos de idade... E isso, neste ano, uma vez mais, não alterava nada em sua vida. Tomou coragem e levantou-se, tirando pela cabeça a fina blusa que usava para dormir, desatou o laço da larga calça que também foi ao chão, a calcinha teve o mesmo rumo, abriu a porta do banheiro bocejando, tirando os cabelos que uma vez mais insistiam em cair em seus olhos. Entrou no boxe ligando o chuveiro, afastando-se para que os primeiros jatos de água fria não atingissem seu corpo tão quente. Colocou a mão onde a água caia, esperando que a temperatura fosse de seu agrado, equilibrou-se, esticando o braço para abrir a primeira gaveta da grande cômoda para pegar a pasta e a escova de dente, bocejou uma vez mais e pensou cerca de 2 minutos na opção de voltar para a cama.
O toque do telefone alertou-a que necessitava se levantar, mirou o relógio na terceira prateleira, já se passa da sete da manha. Escovou os dentes, se banhou, deixou o chuveiro embrulhada em uma toalha. Enxugou-se rapidamente, escolhendo uma roupa adequada para mais uma sexta feira de trabalho. Não se preocupou em arrumar-se, deu um breve jeito em seu rosto, afastando as olheiras com um eficiente e agradável pó que sua irmã lhe deixara há algumas semanas. Sorriu, precisava ligar para aquela maluca, e a pressionar – um pouco, não muito, não era necessário. – para lhe contar que diabos de surpresa eles estavam preparando. Não queria festas, não gostava de festas. Colocou em seus pés o sapato de salto que seu emprego lhe obrigava. Secou os cabelos com a toalha, deixando-os bem recolhidos em uma trança embutida que chegava até o meio de suas costas. Sim, estava ótimo.
Levantou-se recolhendo as coisas que sua natureza bagunceira havia deixado pelo caminho, estendeu a toalha molhada em um lugar qualquer, desejando de forma desesperada um quente café. Deixou o quarto, notando que o corredor naquela manha parecia ainda mais extenso. Suas pernas deixaram de caminhar e o silêncio que costumeiramente parecia não lhe incomodar, lhe causou incômodo naquela manha. Continuou a andar, parando em uma pequena mesa que servia de apoio de correspondência e pequenos objetos. Pegou a chave do carro, sua bolsa que certamente havia deixado jogada na noite anterior. Segurou seus olhos, tentando impedir que os mesmos mirassem a segunda porta do corredor. Dul – Não, maldita seja. Não vai entrar ali hoje, não hoje. E não entrou, continuou a caminhar pelo corredor, com ainda mais firmeza, descendo as estreitas escadas com ainda mais rapidez.
A luz do telefone chamou-lhe a atenção uma vez mais. A ignorou pela segunda vez, parando na cozinha para um rápido café requentado. A companhia tocou, a xícara escorregou de sua mão estraçalhando-se no chão.
Dul – Oh merda!
Deixou que a bolsa escorregasse de seus ombros, correu até a porta, desejando não estar com aqueles sapatos. Era um entregador de flores, com um buquê de rosas exageradamente grande em seus braços, sorrindo-lhe, desejando-lhe feliz aniversário com aquele discurso ensaiado que serviria para tantas outras pessoas naquele mesmo dia.
Dul – Obrigada. – Respondeu com um sorriso forçado no rosto, recolhendo o buquê em seus braços, pegando de forma desajeitada o cartão que vinha lhe acompanhando. Fechou a porta, deixando o buquê encima do sofá, ou da mesinha de centro, não se lembrava. Recolheu os cacos da pia, limpou os respingos de café, pegou sua bolsa enquanto caminhava de volta para a sala, tirando dela seu vidro de perfume o passando rapidamente antes de tirar a chave do bolso, pronta para sair.
Dul – Merda! Voltou a dizer, deixando a droga da bolsa em cima da poltrona, recolhendo as rosas do sofá, pegando o cartão, certamente era da sua irmã, ou do palhaço de seu cunhado. Bem, não era de nenhum dos dois.
- Tentaríamos te ligar, mas certamente você não atenderia devido ao seu relacionamento conflituoso com o telefone. Desejamos a você muitas felicidades, paz nesse seu coração, alegrias, redescobrimentos, amores e prazeres. Acredite que sinto grande admiração pela sua força, pela sua beleza e pela sua coragem. Estou torcendo por você. Feliz aniversário. Maite...
Os olhos de Dulce fecharam-se ao ver o sobrenome rabiscado a caneta, sendo substituído pelo sobrenome que durante tantos anos havia conhecido Maite. Porque ela não havia deixado? Porque ela havia rabiscado o que de certo já era um costume para ela assinar. Maite Uckermann. Que mal havia? De fato, por longos anos Dulce havia assinado em qualquer lugar, para qualquer pessoa: Dulce Uckernann. Seus olhos uma vez mais voltaram para a secretária eletrônica e se fecharam enquanto suas mãos guardavam o cartão no meio das inúmeras rosas que constituíam o buquê de aniversário. Apertou o inferno do botão vermelho, esperando que chegasse a porta antes que a mensagem já tivesse se iniciado.
Bem, mais uma vez não foi isso o que aconteceu.
- Dulce... – ele começava dizendo. – Espero que de fato você esteja dormindo. Perdoe o exagero de Maite com o buquê de rosas que neste instante você já deve ter recebido. Eu tentei avisar que algo mais simples lhe desagradaria menos. Não importa. Bem... – Houve uma grande pausa, na qual Dulce continuou parada em frente à porta, com a testa encostada na mesma. – Parabéns! Decidi não mandar presente esse ano, para não correr o risco de encontrá-lo lá no escritório quando eu chegar. – Houve outra pausa. – Saia dessa casa... Vá para a casa da sua mãe, eles estão a esperando, não os deixe plantados. Escute, sua mãe está preocupada... Sei que faz três dias que você não liga e nem aparece por lá. Bem, faça essa força, sim? Felicidades, saúde e... Acho que é isso. – Outra grande pausa.- Eu queria poder lhe dar um abraço, checar pessoalmente como você está, mas também não acho que seja uma boa ideia. Apenas saia dessa casa, tente se divertir. Preciso ir, parabéns... Caso não tenha percebido é o idiota do Christopher.
Dulce fechou os olhos, sorrindo por um breve instante. - Caso não tenha percebido, é o idiota do seu marido. Ele costumava a dizer. Mas isso fora antes, antes de o dia amanhecer e ela encontrar uma vez mais o quarto ao lado do seu completamente vazio, como se jamais tivesse sido habitado, como se jamais houvesse recolhido entre àquelas paredes coloridas cobertas de balões alguém que desde sua existência havia sido amado com todas as forças concedidas por Deus... Se de fato ele existisse. Abriu rapidamente a porta, trancando-a ainda mais rapidamente. Não, não ficaria naquela casa, não hoje.
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A FALTA QUE VOCÊ ME FAZ
FanfictionAs consequências de um perda. Inquebrável ligação. A química. Os olhos dele. O sorriso dela. A falta que você me faz.