A História de Thomas

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Thomas

Eu sou um senhor de 43 anos, que apesar de estar um pouco relaxado com o físico, ainda tenho um corpo bem definido. Só agora começou a aparecer uma barriguinha de leve. Com estatura mediana, sou bem forte. Como não posso mais viver na vila onde eu e a esposa Ruth nascemos, tento oferecer aos meus filhos tudo que um dia fora tirado de nós. Havia saído da vila a princípio para estudar. Quando estava prestes a me formar, ainda com vinte e poucos anos, e já namorando com Ruth, me vi em meio a um impasse.

Na época, costumava lavar piscinas em casa de famílias ricas para ganhar uns trocados e me divertir nas festas da faculdade. Essas famílias eram contatos de antigos amigos de meus pais e eles faziam questão que eu tivesse algum serviço além do estudo.

Estava na casa de máquinas da piscina, rodeado por produtos químicos, quando ouvi alguns estrondos. Acabei deixando um pacote de cloro granulado cair em meus pés. Sempre fui um homem de exatas, nunca compreendi artefatos químicos ou biológicos, então tive receio de tudo ir pelos ares, portanto fiquei quieto e apreensivo.

Já deveria estar atento antes pois meus instintos tinham me alertado que havia algo diferente, mas como não era problema meu, continuei meu trabalho. Ouvi vozes alteradas e alguma correria dos funcionários. Tenho excelente audição e olfato. Logo senti um forte cheiro de sangue, seguido pelo cheiro que mais parecia ser carne assada. Pensei em me transformar e talvez ajudar alguém, mas eu estava proibido de mostrar meus dons enquanto estivesse longe de casa. Quando percebi que tinham pelo menos uns quatro seres com grande poder e diferentes dos donos e dos funcionários na casa, optei por permanecer sendo prudente e aguardar ali mesmo. Talvez o fedor forte do cloro espalhado pelo chão pudesse disfarçar meu cheiro e minha presença passar despercebida. Assim eu não revelaria o meu segredo.

A família que servia no dia era composta de cinco pessoas. Pai, mãe e três filhos, sendo um deles um bebê de colo. Eram unidos e reservados. Não sabia ao certo o que aquela família era, ou representava. Sabia que não eram lobos como eu. Apenas que eles também pertenciam ao meu mundo. Já os "patrões" tinham certeza que eu era um licantropo. Talvez os invasores não tivessem este conhecimento. Então preferi esperar tudo acalmar. Peguei um pouco do cloro no chão e esfreguei com força em meu corpo. Saiu até um pouco de sangue... E ardia, mas minha pele se recuperava logo absorvendo aquele produto e cicatrizando em seguida. O importante era esconder meu cheiro pra não ser descoberto. Tentei fazer um silêncio absoluto.

Houve gritos, discussões, explosões e muita luta. Até ficar tudo quieto por segundos.

-- Está sentindo mais alguém? -Ouvi um homem perguntando.

A mulher respirou fundo antes de responder que não.

-- Ainda falta o menor. Não o encontrei. -Afirmou uma terceira voz masculina.

-- Creio que conseguiram o tirar da casa antes de chegarmos. E mesmo que ainda esteja por aqui, ele não irá sobreviver por muito mais tempo, sozinho. -A primeira voz finalizou a frase zombando.

Uma outra voz masculina completa:

-- Concordo. Acho que o menino não está mais aqui. Também não o sinto.

-- Mas isso não resolve nosso problema caso ele ainda continue vivo... -Pensa alto a mulher.

-- Continuaremos as buscas. Se permanecer vivo, mais cedo ou mais tarde o menino terá que aparecer.

Realmente estava difícil de sentir qualquer coisa em meio aos odores diversos que surgiram após a briga.

Depois de mais uns dez minutos de total silêncio resolvi sair da casa de máquinas. Tive muita sorte por sobreviver ao ataque daqueles que provavelmente eram os descendentes de Drácula. Sabia que existia um grupo entre os vampiros ditos "descendentes de Drácula" que tentavam reinar em nosso mundo. E apesar de eu ser bem forte, de uma longa linhagem de Alfas, não sobreviveria sozinho e no meio do caminho daquele grupo.

Me vi de frente a um cenário de guerra com sangue, corpos esbranquiçados e membros espalhados em todo terreno. Quando saía da propriedade, ouvi um choro fraco. Aproximei rapidamente de um móvel feito de freixo e ali, enrolado em vários panos estava o bebê citado pelos assassinos da família. Totalmente sem jeito, peguei a criança no colo mas não sabia o que fazer. Resolvi o levar até minha aldeia. O bebê usava um colar com cheiro de ervas e que continha outras pedras. Eu tive a certeza de já ter visto este colar com a mãe do garoto. Não sabia o nome dele, então o batizei de guerreiro Anthony.

Na aldeia, os anciões decidiram que eu deveria criar a criança como se fosse da minha família, numa cidade totalmente diferente, longe de qualquer um que conhecia. E que ainda deveria esconder totalmente meus poderes, desligando-me de qualquer contato com outros lobos, para que ninguém da aldeia sofresse com a fúria dos tais descendentes.

Me lembro de ter ficado muito irritado e não tinha ideia de como cuidar de uma criança, então Ruth resolveu abrir mão de sua vida de lobo também para ajudar a mim, seu amado namorado.

Consegui terminar meu curso de longe. Faltavam pouco para o término das aulas quando houve aquele incidente e já estava aprovado em todas as matérias. Então não houve necessidade de voltar à universidade naquele momento.

Consegui um dinheiro com minha família antes de sair da aldeia, tinha esperança de poder voltar para lá em breve. Ajeitei minha moradia e montei uma empresa. Logo Ruth se formou também e resolvemos ter nossos próprios filhos, na tentativa de suprir a falta de nossos familiares e amigos. Apesar de cuidarmos do bebê, não tínhamos amor por ele. Afinal, era por conta daquele pequeno ser que tivemos que deixar nosso mundo para trás.

Tentei fazer de tudo para que meus filhos não se irritassem e acabassem descobrindo sua natureza antes da hora. Então dava tudo o que eles queriam. Luna, minha linda menina, estava prestes a completar 16 anos e sua transformação seria inevitável. Era essa a idade limite para um licantropo mutar. Por isso havíamos chamado, pela primeira vez, os meus pais e os de Ruth para jantar e depois eles levariam Luna para a vila. Lá a minha lobinha poderia despertar seus poderes e conhecer um mundo totalmente novo. E eu tinha certeza que ela amaria essa vida. Éramos seres superiores e não simples humanos como Anthony. Não precisávamos mais nos rebaixar àquela vida se as crianças não quisessem. Finalmente Anthony já tinha idade suficiente para desaparecer de nossas vidas.





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