Dia 16 de Julho de 2014

26 2 0
                                    

- ... Em todo o mundo, não existe beleza maior, disse o príncipe encantado. Branca de Neve parecia dormir no caixão de cristal; o rosto branco como a neve e de lábios vermelho como sangue, emoldurado pelos cabelos negros como ébano. - a pequena Sara deteve-se na recitação do conto, olhou para Aurora na esperança que esta já estivesse acordada, mas nada.

        A face inanimada de Aurora, a postura que esta mantinha mesmo deitada, familiarizava-se com a situação da Branca de Neve. Retomou a leitura, na esperança que a amiga ouvisse.

- Continuava tão linda como enquanto vivia. Um dia, um jovem príncipe que caçava por ali passou no topo da montanha. Bastou ver o corpo de Branca de Neve para se apaixonar, apesar de a donzela estar morta. Pediu permissão aos anões para levar consigo o caixão de cristal. Havia tanta paixão, tanta dor e tanto desespero na voz do príncipe, que os anões ficaram comovidos e consentiram.

        Sara suspirou profundamente. Com os olhos a encherem-se de lágrimas e a esvaziarem-se de esperança, disse:

- Gostava que o Henrique estivesse aqui para salvar a Aurora.

- Quem disse que não estava? - uma voz rouca e baixa interrompeu por completo o pensamento da pequena menina.

- Mano!

        Sara pulou da cadeira estofada a tecido azul onde estava sentada, deixando cair o pequeno livro de bolso, correu para o irmão mas deteve-se, alguns metros diante deste, antes de lhe saltar para os braços.

        Este não parecia o Henrique que ela conhecia e tanto amava, este era mais magro, mais fraco, com uma pele mais branca, ligado a tubos e fios que o seguiam a ele, e à cadeira de rodas. Este Henrique não transmitia segurança ou conforto. O Henrique antigo abundava de felicidade, a sua face era iluminada pelo seu sorriso parvo mas que aos olhos de muitos, perfeito. Este não era o seu irmão. 

        Henrique ao perceber a estranheza da irmã a olhar para ele, sentiu como se estivesse novamente naquele carro, naquele dia, a ser atropelado, mais uma vez, pelo camião.

- O seu irmão está muito fraco. - declarou o médico.

        Sara olhou para os olhos verdes vazios do irmão.

- O menino Henrique acordou ontem à tarde e quando soube o que acontecera com a menina Aurora insistiu em vir visita-la, a ela e a si.

        Um pequeno sorriso invadiu o rosto de Sara, secalhar o irmão ainda estava com eles só que num corpo mudado. Avançou cuidadosamente até estar frente a frente com este, parou, observou e sorriu. Abriu os braços e agarrou o pescoço do irmão.

- Tive saudades tuas, mano. 

- E eu tuas, princesinha. 

        Uma pequena lágrima caiu sobre o pescoço de Henrique, pertencente a Sara. Este estava igualmente emocionado mas não podia deixar a irmã ve-lo daquela maneira, já sofrera o sufeciente. Quando esta o largou, olhou para Aurora, e novamente para Henrique. Este percebeu a mensagem, que a irmã lhe tentara transmitir.

- Como está ela? - perguntou o rapaz ao médico.

- Em estado de choque, nada de permanente, mas tivemos de lhe admistrar relaxantes para ver se descansava um pouco.

        Henrique acenou positivamente com a cabeça.

- Princesinha.

- Diz, mano.

- Empurras-me até à cama da nossa amiga?

        Esta sorriu e tomou o lugar do médico atrás da cadeira de rodas. O médico dispensou a enfermeira que os seguia agarrando nos tubos e fios que estavam constantemente ligados a Henrique, ele próprio trataria disso. 

        Chegaram perto da cama de Aurora e Henrique segurou-lhe a mão direita, olhou para a esquerda, estava engessada.

- Posso ter um momento a sós com ela? - pediu Henrique.

- Claro. - confirmou o homem de bata branca e estetoscópio ao pescoço. 

        O médico agarrando a pequena e frágil mão de Sara, disse:

- Que tal irmos ver do teu pai e irmos lanchar os três?

        Sara sorriu e saiu juntamente com o médico que correu as cortinas, deixando um pouco mais de privacidade aos dois adolescentes. 

        A mão de Aurora estava fria, os seus lábios secos e o cabelo despenteado, mas Henrique, nada se importou, estava ali era o que interessava. Ao reparar, mais uma vez para a mão esquerda de Aurora, uma onda de culpa invadiu-o.

- Desculpa. - disse garrando cada vez com mais força a mão direita de Aurora. - Tu não devias sofer pela minha parvoíce! Não devias ter perdido a mobilidade da mão direita! - este passava a mão pelos cabelos de Aurora, tentando reter as lágrimas que estavam prontas para escorrer lhe pela face. - A culpa é toda minha! - disse baixando a cabeça, não aguentando mais as lágrimas. 

- Mas dissem que a culpa é das estrelas. - disse a voz de mel de Aurora, olhando para Henrique, este ergueu a cabeça, recuperando a intensidade do seu olhar.

a cor da vidaOnde histórias criam vida. Descubra agora