Capítulo 4

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Eu, Amren e Rhysand estamos estáticos. O corpo inconsciente de Fenrys agora repousa em um dos quartos de hóspedes. Nenhum de nós conseguiu falar nada desde que saímos da cabeça dele.

Essas criaturas... O que elas fizeram... É pior do que eu pensei. Não julgo o homem lobo por tentar me atacar, não depois do que eu vi.

Um rei valg que escondia lascas de portais na pele de seus "escolhidos", que colocava colares e anéis para permitir que seus filhos demônios possuíssem corpos de pessoas inocentes, que pretendia transformar o mundo em trevas. Uma rainha valg que enganou a todos por séculos, que foi capaz de entrar na cabeça de um feérico e fazê-lo acreditar que a fêmea que estava vendo era sua parceira só para depois permitir que ela e seu bebê fossem assassinados, ela torturou fisicamente e psicologicamente uma garota para que alcançasse seus interesses próprios. Aquilo tudo era horrível.

Não tinha dúvidas agora de que meu pai fora um deles. Mas agradeci a Mãe por algo ter mudado nele quando veio para esse mundo, e principalmente pela minha mãe ter sido uma feérica.

Os Valgs são criaturas imortais, mas vi uma rainha com poderes de uma deusa do fogo capaz de queimá-los, uma mulher com poderes de uma deusa da cura capaz de destruí-los. Aquilo me tranquilizou. Se algum dia eu me descontrolasse e não conseguisse mais voltar, talvez Feyre e Helion poderiam acabar comigo. Talvez até mesmo Eris fizesse isso.

Não deixei de notar o quanto as histórias de Fenrys e Rhysand são parecidas, os sacrifícios que fizeram pelas pessoas que amam. Talvez fosse por isso que o Grão-Senhor parecia tão abalado.

-Eu... - Começou. - Eu vou mandar um mensageiro convocando Helion para vir nos visitar.

Sem dizer mais nada, ele deu as costas e saiu. Eu tinha certeza de que além disso, ele falaria com Feyre.

-Descanse por agora, garota. - Amren fala sem se virar para mim. - Vou procurar algumas coisas que vamos precisar e mais tarde começamos.

E assim ela sai. Me deixando sozinha para pensar em tudo que eu havia descoberto sobre meus "descendentes". Talvez fosse por isso que eu subi as escadas e entrei no quarto de hóspedes onde um homem inconsciente estava deitado em uma cama grande. Puxei uma cadeira e me sentei ao seu lado, o acordando apenas o suficiente para que conseguisse escutar e falar, mas que não fosse possível me atacar. Fenrys franziu o cenho antes de abrir os olhos, e quando abriu, arregalou-os me vendo parada ali.

-Só quero conversar. - Mantive minha voz calma.

-Não tenho nada para conversar. - Seu tom era hostil.

-Mas eu tenho. - Me recosto na cadeira e cruzo as pernas. - Não sou como eles.

-Você é uma valg!

-Metade valg. - Sorrio ironicamente.

Confusão brilha em seus olhos enquanto ele tenta se sentar. Afrouxo um pouco da minha magia para que consiga.

-Como? - Pergunta.

-Tudo o que precisa saber é que só descobri que sou parte valg agora. - Franzo o cenho. - Na verdade eu só descobri que isso existia recentemente.

-E como isso é possível?

-Meu pai veio de outro mundo, provavelmente do seu. - Ele faz mensão de falar mas eu o interrompo. - Não me pergunte como ele fez isso. Não tenho ideia.

Nós ficamos um tempo em silêncio, apenas nos encarando. Fenrys estreita os olhos, eu descruzo as pernas e me sento de forma ereta.

-Não acredito em você. - Ele diz por fim. - Conheci uma rainha que esteve por séculos na cabeça de um reino inteiro e...

-É eu sei. - Faço um gesto com a mão. - Vi nas suas memórias.

-Você esteve na minha cabeça? - Arregala os olhos.

-Sim. - Reviro os olhos. - Isso não é uma coisa de outro mundo, Fenrys. Sou uma daemati.

Ele não pergunta, nas vejo em seu rosto que ele não sabe o que é isso. De onde diabos ele veio?

-Feéricos que conseguem entrar na mente das pessoas.

-Maeve podia fazer isso. - Ergue uma sobrancelha.

-Rhysand pode fazer isso, eu posso fazer isso. - Volto a me recostar na cadeira e cruzo os braços. - Se for chamar de valg todo mundo que pode fazer isso vai gastar muito do seu tempo.

-E quem me garante que você não é como eles?

-Ninguém. - Dou de ombros. - Mas acho que o fato de que nenhum de nós sabia muita coisa sobre eles desde recentemente ajuda.

-Nunca ouviram nada a respeito deles?

-Só em livros sobre lendas. Mas considerávamos histórias de terror, como aquelas em que a criatura assustadora mora debaixo da cama que as mães contam para que seus filhos durmam depressa.

Ele continua me encarando, mas não há mais aquela hostilidade em seus olhos, apenas cautela.

-Olha, Fenrys... - Começo. - Imagino que seja difícil acreditar em mim depois de tudo o que você passou. Não te julgo por isso, na verdade eu até entendo. Mas não sou como aquelas criaturas e nem quero ser. Eu sou metade feérica, e é essa metade que prevalece.

O homem lobo não responde. Decido que já chega de conversa por agora.

-Descanse. - Me levanto. - Quando estiver pronto nós procuraremos seu amigo.

Me viro de costas para que ele entenda que não o vejo como um inimigo, e caminho até a porta.

-Ah! - Paro de andar quando giro a maçaneta. - Se eu fosse mesmo como uma dessas criaturas. - Viro meu rosto apenas o suficiente para que conseguisse vê-lo pelo canto do olho. - Eu teria matado você assim que saiu do portal. - Eu sorrio quando ele estremece. Saio do quarto e fecho a porta atrás de mim.

Enquanto seguia para o outro quarto, estive pensando se Helion poderia destruir a parte valg de mim, assim como a mulher nas memórias de Fenrys havia feito com um dos reis valgs. Como se estivesse curando uma doença. Quando me deitei para descansar, tinha decidido que não importava, eu não queria me livrar. Isso era uma parte minha, parte de quem eu sou, parte de quem meu pai foi. Mesmo que fosse uma parte assustadora. Eu tinha aprendido a aceitar isso, aceitar quem eu sou. E eu não negaria mais.

A Corte de Mundos e Alianças (Vol.2)Onde histórias criam vida. Descubra agora