CAPÍTULO NOVE

926 97 90
                                    

Dias depois de começar a entregar currículo tanto pessoalmente quanto via e-mail, eu finalmente recebi a primeira ligação. No dia da entrevista, eu consegui a ajuda da vizinha para poder ficar com Diego o tempo em que eu estivesse fora, e eu pedi muito aos céus que aquele dia em especial ele se comportasse bem e não desse nem metade do trabalho que me dava, porque ela já era de idade.

Enquanto aguardava a entrevista em uma sala reservada, peguei uma revista na intenção de folheá-la para fazer com que o tempo de espera passasse logo e porque eu sabia que isso também era uma tática para se sair bem na entrevista. Folheei algumas páginas, fingindo ler o conteúdo de cada página alcançada, mas logo me vi perdida em meus pensamentos. Eu já tinha levado tantos não em entrevistas antes de conseguir conquistar meu último emprego que me deixava nervosa o fato de estar prestes a ser bombardeada com perguntas que eu já tinha respondido tantas outras vezes, mas em vão. As borboletas no meu estômago pareciam estar dando uma festa e minhas mãos suavam apesar de senti-las mais frias que o comum e eu precisava secá-las constantemente na minha calça.

— Senhorita Saviñon?

Me levantei no mesmo instante ao ouvir a voz de um homem e no meu nervosismo e falta de jeito, derrubei a revista que estava em meu colo no chão, me atrapalhando ainda mais na hora de cumprimentá-lo. O que eu deveria fazer? Pegar o objeto que deixei cair ou cumprimentar aquele homem? Optei pela primeira opção e somente depois de garantir que a revista estivesse junto com suas outras companheiras e só então consegui encarar o senhor à minha frente.

Sua aparência tão familiar me fez sentir uma queimação instantânea no alto do estômago e ao invés de cumprimentá-lo com um aperto de mão, eu simplesmente recuei. Seus cabelos grisalhos muito bem penteados, seus óculos de grau em formato retangular de hastes douradas, o formato de seus olhos e até mesmo sua camisa xadrez em tons de vermelho e preto me trouxeram memórias que a muito eu tentava bloquear.

— Senhorita? Está tudo bem?

— Me desculpe, o senhor me lembra muito uma pessoa.

— Pela sua cara não é uma memória boa.

Me mantive calada sem conseguir encará-lo por mais que alguns segundos. Eu precisava colocar na minha mente que ele era apenas um homem qualquer, que iria me entrevistar e se tudo desse certo, seríamos colegas de trabalho, nada além disso. Ele não era a pessoa do meu passado.

— Prazer, sou o senhor Tadeo Nieto, por que não se senta?

Sua aparência e seu jeito de falar não me permitiu concentrar na entrevista e, apesar de ter tantas respostas para suas perguntas nas pontas das línguas, eu sabia que todas elas tinham saído mais vazias do que deveriam. Eu sabia que estava apta para o cargo, conhecia minha trajetória e como eu me esforçava quando precisava fazer algo, mas naquele momento eu estava me saindo um completo zero à esquerda. No final, eu ganhei um combo de dor de cabeça, gastrite nervosa, estresse e uma vontade imensa de chorar que eu estava prestes a perder o controle. Aquela foi, de longe, a melhor entrevista que eu tinha feito e piorou ainda mais a situação quando mencionaram o fato de eu ter sido demitida pelos atrasos que sempre tive no outro emprego.

Passei o restante do dia com muito mal humor, mas para minha sorte, Diego estava num humor bom, na verdade ele estava querendo ficar brincando sozinho e vez ou outra eu me pegava olhando para aquele ser tão pequeno rindo sozinho de algo que ele falava e eu não entendia. Era uma gargalhada gostosa, de um ser completamente inocente que via graça em coisas que adultos jamais achariam, como um giz de cera rolando pela mesa e caindo no chão.

— Amor, quer ir passear? — Perguntei, me sentando no chão ao lado dele, mas ele sequer parou o que estava fazendo, não me dando muito atenção. — Hein? A gente pode ir jogar bola no parque.

Confiar | VONDY - FINALIZADAOnde histórias criam vida. Descubra agora