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~ 𝒯𝑜𝓂𝒶́𝓈 ~

A terça feira seguiu mais calma e eu e a Catarina voltamos à rotina de evitar o outro, como se aquela manhã nunca tivesse existido.

É melhor assim, já que ambos estamos constantemente a misturar as coisas e vamos acabar por sair magoados.

Segundo as notícias, os casos de Covid-19 aumentam a cada dia e as coisas começam a fechar gradualmente, gerando muita incerteza.

Na quinta feira, eu optei por fechar os ginásios e há dois dias que praticamente não durmo, tentando arranjar soluções para todos os problemas que isso levanta.

A logística das aulas online, conseguir garantir a qualidade do serviço com as pessoas a treinarem em casa para que o serviço não fique sobrevalorizado, o que fazer com os funcionários que ficarão em casa sem exercer qualquer função... E por aí vai.

Atiro o telemóvel para o sofá e passo as mãos pelo cabelo, frustrado. Mais uma vez o meu advogado ligou apenas para dizer que continua sem novidades, continua tudo igual. Só que não está tudo igual, está a acontecer uma pandemia mundial e tudo está diferente.

- Parece que o pai está chateado. - A voz da Catarina surge do silêncio. Deixo-me ficar de costas para ela, porque se estiver a falar com a Beatriz, a pequena vai perceber que eu realmente estou irritado.

Observo o céu já escuro através da janela da sala e percebo pelo reflexo que a Catarina caminha na minha direção, com o Diogo no colo.

- Está tudo bem? - Pergunta desta vez para mim.

- Tudo ótimo. - Murmuro incisivo.

- Aconteceu alguma coisa? Posso ajudar? - Insiste.

- Aconteceu uma pandemia e nada do que tu faças vai mudar isso. - Respondo.

Com tantas horas no dia, porque é que ela decidiu escolher precisamente esta para parar de me ignorar?

- Ele está irritado mesmo. - Ela confidencia ao nosso filho e para ao meu lado, continuando a balançar o corpo de perna para perna.

Cruzo os braços e mantenho o silêncio.

- Quanto tempo será que isto vai durar? - A Catarina pergunta algum tempo depois. - Os casos aumentam de dia para dia, as pessoas estão a morrer...

- E os negócios vão morrer também por este andar. - Murmuro frustrado.

- Algum problema nos negócios? - Ela deduz. - Precisas de dinheiro?

Sinto o meu sangue ferver na hora e engulo em seco para não dizer nenhuma coisa de que me vá arrepender depois, principalmente com o bebé ali.

- Não preciso do teu dinheiro. - Respondo entredentes.

- Não te ofereci o meu dinheiro. - Ela responde ignorando o meu tom. - Só estou a perguntar se é esse o problema, falta de dinheiro.

- Não, não é esse o problema. E se fosse, continuaria a não te dizer respeito.

- Vendo assim ninguém diria que a vó Margarida educou o teu pai, meu amor. - Ela sussurra no ouvido do bebé que em resposta fecha os olhos, cansado.

- Não tens negócios para tomar conta, uma vida para cuidar? - Sou direto. - Cuida dela e deixa a minha em paz.

Passo as mãos pelo cabelo mais uma vez, irritado. Os prejuízos não param de se somar na minha cabeça e eu só quero que a Catarina me deixe sozinho com os meus problemas.

Não preciso do seu caso de sucesso para me esfregar na cara que eu sou um fracasso.

- Eu estou a cuidar da minha vida. - Ela diz indiferente. - Tu fazes parte dela. És pai dos meus filhos e vais ser sempre.

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