O Despertar do Caos

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O vento frio corta minha pele como navalhas afiadas. Minha respiração está acelerada, cada batida do meu coração ecoa em meus ouvidos. O cheiro metálico do ar é estranho, pesado.

Eu não sei onde estou.

Como vim parar aqui?

Minha mãe sempre disse que, quando estamos perdidas, devemos refazer nossos passos, tentar lembrar da última coisa que fizemos antes de nos encontrarmos em uma situação desconhecida.

Respiro fundo e fecho os olhos.

Pense, Kuon. Pense.

Eu estava em casa, me preparando para a escola. O cheiro do café da manhã ainda parece pairar em minha mente — arroz quente, peixe grelhado e missoshiru. Minha mãe e eu conversávamos sobre o futuro. Foi um momento breve, mas aconchegante. Então, olhei pela janela e vi...

Aquele arranha-céu.

Uma torre gigantesca, que eu jamais havia visto em Tóquio. Foi estranho. Como algo tão imenso poderia simplesmente surgir do nada? Antes que pudesse processar, tudo ao meu redor se dissolveu, como se o mundo fosse apenas uma simulação... e, de repente, despertei aqui.

No topo de um prédio desconhecido.

Sozinha.

A angústia me aperta o peito. Minha mãe... onde ela está? Ela também veio para cá?

— MÃEEEEE!— minha voz ecoa pelo vazio da cidade abaixo.

Nenhuma resposta.

As lágrimas queimam meus olhos, e eu tento contê-las, mas não consigo. Meu corpo inteiro treme. Meu peito sobe e desce em uma respiração descontrolada. Eu preciso me acalmar. Eu preciso...

Tateio minha bolsa. Ainda está comigo. Dentro dela, encontro meu celular, meu caderno, algumas canetas, um lápis e uma pequena garrafa d'água. Tento ligar para minha mãe. Nada. A ligação não completa.

O medo toma conta de mim.

De repente, um grito rasga o silêncio.

Meu corpo se enrijece.

Olho na direção do som e vejo, no prédio à frente, uma garota correndo desesperada na sacada. O pânico está estampado em seu rosto. Atrás dela, um homem mascarado caminha lentamente, segurando uma catana.

Não... não pode ser real.

A máscara branca dele possui um largo sorriso esculpido, um contraste macabro com sua postura tranquila e letal. Seu traje é um hakama escuro, adornado com placas de metal brilhantes. Ele se parece com um samurai dos livros de história, mas algo nele é profundamente errado.

A garota tropeça.

Eu grito antes mesmo de pensar:

— CORRA!

Ela não me ouve. Ou talvez esteja em choque. Seus lábios se movem, mas estou longe demais para entender o que diz.

O samurai mascarado levanta a lâmina.

— NÃO!

A catana corta sua perna. O grito dela é um som que jamais esquecerei. Um lamento de pura agonia e desespero. Meu coração martela contra o peito.

Ela cambaleia até a beirada.

— NÃO FAÇA ISSO!

Mas já é tarde demais. Seus olhos se encontram com os meus, e por um breve instante, vejo a resignação em seu olhar.

Ela se joga.

Eu cubro a boca com as mãos, prendendo um soluço.

O samurai se aproxima da borda e olha para baixo, como se estivesse verificando se ela realmente morreu. Então, simplesmente se vira, sem emoção alguma.

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