Doente

601 57 0
                                    

Quinta. Abri os olhos e vi as horas no despertador, eram 3h da manhã. Tentei dormir novamente, mas não conseguia. Tinha que ir à casa de banho. Levantei da cama, com alguma dificuldade até porque ainda sentia me tonta. Saí do dormitório, apalpei a parede que estava perto, para encontrar o interruptor. O melhor é começar a andar com lanterna. Não conseguia encontrar o interruptor. Ainda o procurava, quando do nada a luz acendeu se sozinha. Olhei o longo corredor que se estendia à minha frente. O meu coração estava acelerado. Talvez seja melhor voltar ao quarto, pensei com medo. Mas estou tão aflita. Sem pensar, continuei a caminhar apressadamente até o banheiro. Entrando lá dentro, entrei numa das cabines. Pensamentos absurdos vieram me à cabeça. O colégio não está assombrado. Deixa dessas coisas Alice, senão ainda pensam que és maluca. Saí da cabine, fiquei em frente ao espelho para lavar as mãos. Ia desequilibrando me, mas consegui agarrar me ao lavatório. Coloquei a mão na minha testa, ainda estava quente. Virei me, mas ele tapou me a boca para não gritar. Pôs a outra mão na minha testa. Aquela mão fria sabia tão bem. Tirou a mão da minha boca e ficamos a encarar nos.

- Quem és tu?

- Não precisas de saber quem sou.- falou bruscamente.- É melhor voltares ao quarto.

- Eu não consigo dormir.

- Eu vou fazer com que consigas.- sussurrou me na orelha, deixando me arrepiada.

- Como? Vais me cantar uma canção de embalar?- ironizei, ele afastou a sua mão da minha testa. Não sei como, mas comecei a ficar sonolenta.- O que...é...que me...fizeste?- antes que caísse, ele agarrou me.

******

Olhei para o despertador, já eram 9:35. Levantei me rapidamente da cama sentindo uma tontura. Então voltei a sentar me. O que será que se passa comigo? Eu não sou de ficar doente. Coloquei um casaco comprido, de forma a que escondesse um pouco o pijama. Saí caminhando pelo corredor, desci as escadas lentamente. Não tinha forças. Fui rastejando pela parede até chegar ao refeitório. Parecia que via tudo a andar a roda.

- O que é que me fizeram?- caí no chão de joelhos.

- Estás bem, menina?- perguntou a funcionária aproximando se de mim.

- Não se aproxime, não preciso de ajuda.

- Tens a certeza? É melhor sentares. Eu ajudo te.- ela ajudou me a levantar e a sentar me.- Vou trazer te já o tabuleiro.- ela voltou pousando o na mesa.- Estás a transpirar. Tens de ir à enfermaria. Nem sequer devias estar aqui de pé. Queres que fique aqui contigo?

- Não é necessário.

- Se precisares de algo, chama me.- ela foi lá para dentro da cozinha.

Observei o refeitório vazio. Por aqui estava tudo calmo. Peguei o guardanapo e limpei a cara por causa da transpiração. Senti alguém ao meu lado. Mas quando virei não tinha nem uma sombra. Olhei o tabuleiro, descobri que não estava com fome. Mirava o pão com manteiga, mas parecia que não me ia entrar, parecia que ia ficar preso na garganta. Engoli em seco.

- Tens de comer.- sentou se à minha frente.

- Vamos ver se tu és real.

- É claro que sou.- disse a rir.- Ou julgas que sou uma assombração?

- Começo a achar que este colégio está assombrado.- confessei olhando bem nos seus olhos.- FUNCIONÁRIA. FUNCIONÁRIA, POR FAVOR.- gritei olhando para a cozinha.

- O que foi?

- Está aqui um rapaz...- olhei para frente, mas a cadeira estava vazia.

- O que dizias?- perguntou confusa.

- Não viu ninguém a entrar aqui?

- Nem uma sombra.

- Esqueça. Desculpe ter lhe incomodado.

- Não vais comer?- perguntou vendo o meu pão ainda inteiro.

- Pode deixar.- ela então afastou se novamente. Quando virei a cara, ele estava novamente à minha frente.- Ai meu deus. Eu estou a ver coisas.

- Isso foi muito feio, o que acabaste de fazer.- repreendeu me.- Come.

- Vais obrigar me novamente?- ironizei.- Sabes eu também não gosto de desperdiçar comida, por isso ofereço te.- empurrei o tabuleiro na sua direção.

- Não estou interessado até porque já comi.- disse com desdém.- Por isso come.

- Não me vais obrigar outra vez.- no momento em que levantei, fui logo ao chão.

- Estás a ver? Precisas de comer para ter forças.- ele pegou me nos braços levantando me. Tentei empurrar lhe, mas foi em vão.

- Tu não existes.

- Já que não comes, não estás aqui a fazer nada.- concluiu pegando me ao colo.

- Quem és tu?- sussurrei lhe na orelha, enquanto que ele me levava de volta para o quarto.- Já sei, és o meu anjo. Por isso é que ninguém te vê.- entramos no quarto, ele ajudou me a tirar o casaco e a deitar me na cama.

- Descansa. E aproveita para dormir.- disse aconchegando me com os cobertores.

- És um anjo muito mau.

- Neste momento dizes coisas sem nexo.- mencionou dando um beijo na minha testa.- Dorme.- ele ia levantar, mas eu agarrei lhe na mão com a pouca força que tinha.

- Vais voltar?

- Não sei.- ele pareceu receoso.- Mas acho que vou voltar.

- Eu gosto de ti.- falei sem pensar.- Quer dizer, agora é que estou a dar conta de que estou a dizer coisas sem nexo.

- Descansa. Depois nos vemos por aí.- levantou se da cama e saiu do quarto.

Olhava para todos os cantos do dormitório com atenção, já que não tinha sono. Quem é que ele será? Agora que estou doente é que ele me aparece sempre à frente. Na volta é tudo da minha cabeça. Ele nem sequer deve existir. Virei me muitas vezes na cama, tentando encontrar uma posição confortável. Alguém entrou desesperadamente no quarto. A Rute sentou se na minha cama pegando me na mão. Colocou a outra mão na minha testa, ficou uns minutos e depois tirou.

- Meu deus Alice. Tu ainda estás muito quente. Acho que é melhor levar te novamente à enfermaria.- disse com um tom de preocupação na sua voz.- Não quero que te vás.

- Calma, isto não é o fim. Vais ver que eu vou melhorar. Não tarda nada, já estou aí com vocês pelos cantos da escola.- tentei tranquilizar lhe.- Eu o vi novamente. Começo a achar que eu é que estou a ver coisas.

- Viste quem?

- Aquele rapaz que eu já te tinha falado.- esclareci.- Eu fui ao refeitório para tomar o pequeno almoço, estava distraída e quando olhei para a minha frente deparei me com ele.

- E então? O que foi que ele disse?- perguntou curiosa.

- Não disse nada de jeito. Depois para comprovar se ele era real, eu chamei a funcionária. E quando voltei me novamente para frente, ele tinha desaparecido.

- Desaparecido novamente? Como é que isso pode ser possível?

- Não faço ideia. Por isso é que eu acho que é tudo da minha imaginação. Não fales disto com ninguém, senão ainda vão querer internar me, e eu não estou louca.

- É claro que não vou comentar isso com ninguém. Podes confiar em mim.- garantiu e deu um beijo na minha testa.- Ficas bem?

- Sim. Podes ir.

- Vê se melhoras rápido. Já sinto saudades da minha Alice.- deu um sorriso e saiu do quarto.

O ColégioOnde histórias criam vida. Descubra agora