Sydney, Setembro de 2015
Não posso acreditar que já estou na escola novamente. Este sentimento de contradição que vai e vem dentro do meu corpo, não me permite estar confiante e segura nesta espelunca que é o meu único escape para sair de casa, e ao mesmo tempo tornasse uma segunda prisão.
Este verão as coisas mudaram tanto. Há três meses atrás não esperava estar como estou agora. Sozinha, sentada numas escadas na parte de trás da escola, com os fones nos ouvidos e a ler um livro. E estou tão bem assim. Sozinha.
Quem diria que eu, Faith Miller, ia estar desta forma algum dia. Eu que outrora fui uma pessoa sociável, agora isolei-me. Isolei-me do mundo, da crueldade e da dor.Folheio as páginas do livro que leio agora, envolvida em cada palavra com a potência que aquilo me puxa para a vida real. Sinto a força de cada virgula corroer o meu emocional cada vez que um detalhe é acrescentado, uma palavra dita, um sentimento explicado. Sinto também na minha epiderme o arrepio ser intensificado, deixando-me fragilizada com o ponto final. Com o fim inacabado capaz de destruir um coração de aço. Sim, aqueles corações que não existem, mas querem ser vistos aos olhos do mundo. Querem ser mostrados; galardoados pela originalidade de ser banal. Não querem ser criticados por ter uma alma, como toda a humanidade tem, mas em contrapartida estão a marimbar-se ao serem julgados por não a ter.
A campainha toca, às oito e vinte da manhã, anunciando a primeira aula deste novo ano letivo que me espera. É o último ano, Faith. Lembra-te. Percorro os corredores desta imensidão chamada "escola", à qual eu chamo de manicómio. A sério. Só podia ser isso. Mesmo. A cada passo que eu dava ouvia um berro vindo de um adolescente qualquer com as hormonas descontroladas e, pelos vistos, com as cordas vocais demasiado bem afinadas. Ou então vejo raparigas a tagarelar sobre o namorado de B, que andou com C, mas a A gosta dele loucamente, só que na verdade ele vai acabar por ficar com D. Tudo isto porque ainda existem mais letras no alfabeto, e então ele ainda tem mais uns quantos anos de vida para os gastar.
Revirando os olhos com a ironia que isto soou - vindo de uma ex-típica-adolescente- tiro a pasta das costas e tento procurar nela o horário onde nele dizia a sala onde eu iria ter aulas.
Basicamente aquilo parecia mandarim. Não entendia nada do que lá dizia, pois para além da confusão que me cercava, o papel era explicito. Sou nova nesta escola. Para mim cada corredor é uma nova porta, uma nova entrada e uma nova saída. Mais uma surpresa e mais um desespero de estar num sitio onde não quero. Fixo-me nele e nas letras que lá estavam colocadas, talvez por acaso, talvez porque foram cuspidas para o papel. B128. Olho em volta, no meio de tantos mamutes vindos do nada, procurando por uma placa inexistente. Porra, esta escola é pior que um shopping! Acho que deveriam mesmo colocar placas de sinalização, pois eu não encontro alguma funcionária a quem perguntar, e creio que a minha maneira de ser - deveras sociável por sinal - não me irá permitir interrogar um alienígena que habita respirando ao meu lado, vestindo roupas normais, com uma vida normal, gritando normalmente histérico e, aparentemente, excitado para o primeiro dia de aulas.Vagueio pelo corredor, sem a minima ideia do que posso estar para aqui a fazer. De um lado vejo um rapariga sentada no chão a ouvir música, sem sequer se preocupar com o facto de que já tocou e as aulas já começaram. E do outro lado vejo um rapaz a andar ao mesmo passo que eu. Mas ele não me parecia perdido. Apenas me parecia despachado.
Ao fundo desta ala havia uma mulher com uma bata azul e branca, para quem eu corri - pois neste momento eu era toda preocupação e ela notou isso. Abriu os braços com um sorriso amigável de quem dizia "que se passa rapariga?", e por minha vez suspirei de alivio. Tinha encontrado uma funcionaria. Uma pessoa que me ia ajudar. Finalmente.
Quando ambas nos alcançamos, esta senhora, um pouco mais baixa que eu, pousou as mãos sobre os meus ombros e perguntou-me o que se passava para eu estar em pânico. Bem, a minha vontade foi dizer-lhe que estar no meio de tanta gente me sufocava, mas por fim disse-lhe que apenas estava perdida pois sou nova nesta escola.
A amável senhora, com o nome de Anne Marie - como o próprio crachá ao seu peito indica - riu de compaixão e logo me indicou o caminho certo, após ter visto no papel o suposto lugar para onde eu deveria ir.
Estar perto desta senhora relembrava-me a minha antiga escola, e o meu antigo eu. As amizades que outrora lá fiz, e o carinho que, tanto professores como funcionários tinham por nós.
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PAPER SOULS • CALUM HOOD
FanfictionFaith e Calum. Adolescentes com passados com arestas para limar. "Ele só queria ser meu amigo, mas eu escolhi amá-lo." Plágio é crime Copyright © 2015 All Rights Reserved by Joana Nunes