PAPER SOULS • CALUM HOOD

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Desperto com um suspiro de felicidade enquanto vejo Calum a dormir, também ele com um sorriso no rosto. Era engraçado a maneira como ele estava. Com o braço sobre mim, agarrado ao meu corpo, ainda que tivesse metade da cama para ocupar. Ele aquecia-me durante esta noite toda, e parecia, por via de uma confirmação, querer aquecer-me pela minha vida toda.

Arqueio-me sobre o rosto dele, beijando-lhe a face rosada. Eram sete da manhã e esta era a maneira como eu o ia acordar, ainda que desajeitada por natureza.

- Bom dia. - Sussurro ao seu ouvido.

- Hum... - Ele geme, tapando a cara com a mão. O sol entrava pelos lanhos da janela batendo-lhe diretamente nos olhos. - Bom dia, princesa.

- Por favor, não me chames isso. - Torci o nariz. Podia até ser muito querido de se dizer, mas era estranho de se ouvir. - Eu não sou nenhuma princesa. E isso é demasiado romântico e não aceitável para o nosso tipo de relacionamento.

Levantando-me da cama, deparo-me que era verdade o que tinha dito. Apesar de tudo o que passei e de tudo o que eu quero é ter carinho, a palavra relacionamento e relações assusta-me, ainda que isto não seja nenhuma propriamente dita, pois Calum está com Tracy. É ele que eu quero, e eu não estou pronta para tal.

- E o que será, afinal, aceitável para o nosso tipo de relacionamento? - Ele questiona, levantando-se logo em seguida, por entre risos.

- Apenas Faith.

- Hum... Muito bem, Apenas Faith, como foi a tua noite? Dormiste bem?

Uma parte de mim já se preparava para fingir que nada disto aconteceu, mas no entanto a outra parte gritava ainda mais dizendo que isto não poderia passar despercebido ou então eu ia acabar magoada, como aconteceu com Tyler.

- Olha, Faith, eu sei que estás ai a remoer e a pensar no que aconteceu ontem. Mas tu não tens culpa. Eu gosto de ti, mais do que o que devia.

- Tu não podes, Calum. Tu não podes gostar de mim, e eu não posso gostar de ti.

Ainda me lembro de quando eu jurava não estar a cair de amores por ele, ou então quando pensava que só o iria ver como amigo. O problema talvez seja esse mesmo. Eu já não o vejo apenas como um amigo e isso é frustrante, porque eu não me quero relacionar amorosamente com alguém. Em dezassete anos nunca o fiz. Não sei o que é beijar alguém todos os dias, ou demonstrar afetos. Beijá-lo, ou abraça-lo todos os dias. Sentir o calor e o carinho de uma pessoa do sexo oposto.

Aos poucos, sem termos nada a não ser amizade, Calum foi-me mostrando isso e foi dessa forma que eu me apaixonei, como sempre o fiz por outras pessoas. Só não estava a pensar ser correspondida desta vez. De qualquer maneira um relacionamento assusta-me de verdade porque eu não sei o que fazer. Poder errar com uma pessoa assusta-me porque não sei até que ponto somos capazes de lidar um com o outro ou, mais importante, qual é o ponto de saturação de cada um. Não sei com quem estou a errar, se é a pessoa certa ou errada. Só sei que isto se trata de um sentimento contraditório que ora quero e necessito, ora tenho medo de amar e obter.

O amor é a pior coisa que pode existir.

- Porque não? - Ele cruzou os braços. Não por arrogância, mas porque queria entender a minha forma de pensar sobre isto que está a acontecer diante de nós.

- Porque tu... tu tens a Tracy e eu... eu não estou pronta para alguém depois do Tyler. - Disponibilizei-lhe a verdade sem quaisquer rodeios. - Agora, vamos acabar com isto. Sem mais perguntas. Sem mais nada. Apenas vamos fazer de conta que isto não aconteceu e ir para a escola.

Onde está a minha cabeça? Esquecer isto e ir para a escola? Como irá isto acontecer? Oh, eu bem que tento negar mas sempre que o faço o meu coração acelera, porque sim, é impossível de ignorar as vontades que tenho e agora foram concretizadas. As vontades contraditórias de amar e não querer ser magoado, pois no amor, nem que seja uma vez, todos saímos com feridas.

- Eu só não quero estragar a nossa amizade, Calum. - Aproximei-me lentamente dele. Sabia bem agora aqueles típicos abraços calorosos que, de muitos braços que já experimentei, só ele mos sabia dar assim.

- Achas que ela ia ser estragada desta forma? Faith, eu luto por ti desde que te vi. Eu dei quase todos os meus momentos para te fazer sorrir. Achas que eu iria deixar que isso se estragasse? - Ele suspirou. Puxou-me para um abraço. O terrível sentimento de borboletas apoderava-se de mim quando ele plantou um beijo na minha testa. - Mas, tudo bem, eu vou fingir que isto não aconteceu e continuar com a minha vida; e tu vais fingir que nada disto aconteceu e continuar com a tua.

[...]

Fingir que nada aconteceu. Bem, nunca pensei que fosse assim tão difícil, mas a realidade é que nem eu nem Calum conseguimos falar direito um com o outro.

Estamos no carro a caminho da escola e a única coisa que paira aqui dentro é o som da música que toma conta de nós e dos nossos pensamentos.

Pensei em perguntar algumas coisas como: "Como vais fazer com a Tracy? Afinal, tu beijaste-me e namoras com ela" ou "Tu realmente gostas da Tracy? Estás dividido em dois?"

Porém nada disso eu fiz. Apenas me contentei a ouvir a música e a pensar quantas perguntas a Ariel ou o Michael vão fazer se nos virem a chegar juntos à escola.

Pela minha visão periférica acabo por olhar para Calum. Ele molha os lábios e isto foi como uma tortura para mim. Era enervante porque o mundo inteiro consegue prever o que eu queria neste momento. Eu sou enervante por saber o que quero neste momento.
A vontade de chorar é enorme porque eu o quero beijar agora.

- Achas que esta noite conseguimos fazer a noitada de filmes em tua casa? Afinal é sexta e é halloween. - Pergunto, quebrando o silêncio e atirando para longe o desejo.

- Porque não? Afinal, não aconteceu nada entre nós, não é? - Ele dizia, tentando disfarçar o seu tom magoado. - Oh, hum... E a Tracy vai passar por lá com a Abigail também. Pelos vistos os pais da Tracy não estão e ela não quer ficar sozinha em casa.

Merda, merda, merda. Isto parecia uma completa provocação e eu não estava habituada a ver um Calum tão provocador desta maneira.

- Boa. Adoro uma casa cheia de gente. Ainda para mais no halloween. - Sorri cinicamente.