50

15 1 0
                                    

Ainda é complicado para mim o facto de que tenho de dividir os natais entre a minha família. Um dia com o pai, um dia com a mãe. Para algumas pessoas deve ser fácil pois está a maior parte dos dias apenas com um deles, mas comigo não. Muito pelo contrário. Parece que quanto mais os anos passam, mais difícil se torna.

Independentemente disso, e em oposição aos outros anos, este natal foi passado com tranquilidade. Tanto da parte do meu pai, como da minha mãe. Sem exageros ou discussões. Só gostava que tivesse sido assim desde o inicio, ou até mesmo ter sido assim desde que nós éramos uma família de realidade.

Agora estamos a três dias do fim do ano. Estranho, e o que não era de esperar para a minha mãe, poucas mensagens foram trocadas com Calum. Acho que até só foram mesmo duas. Uma delas quando cheguei a Melbourne e outra para desejar bom natal. Terá ele caído na realidade que sempre lhe quis mostrar agora que estamos separados por uma cidade e terá acreditado de que uma relação não condiz connosco? Ou apenas será o mesmo motivo pela qual foi criada a discussão entre Ariel e Luke: a viagem da banda e o entusiasmo acentuado. Não o julgo por isso. Até eu estou entusiasmada.

Para me abstrair desse assunto que, querendo ou não me afeta de alguma maneira possível, combinei uma saída de raparigas. Daisy não pôde vir pois o pai dela está cá e ela quer aproveitar todos os momentos com ele. Mais tarde talvez passo por casa dela visto que não fica a uma distância abismal da minha. Mary está excitadissima para estar comigo e Clarke não consegue evitar os sorrisos de compaixão. Porém de nada lhes disse do que se passava em Sydney e creio que nunca vou dizer, pois o dia em que isto vai acabar está perto. Eu sinto isso. Eu sinto como todos aqueles presságios agoniantes que realmente acabam por acontecer e foder com a minha cabeça e pensamentos todos. Parece que tenho uma vida dupla. Metade de mim está cá, com elas. A outra metade está lá com Calum e ele sabe da existência das minhas amigas, mas elas nem sequer sabem que há um ser humano masculino na minha vida.

- Faith! - Repentinamente Clarke grita, assustando-me. - Descobri uma banda tão fixe! Acho que deverias ouvir. - Ela aponta para o seu Iphone.

Arqueio-me para chegar até ela, pousando a sandes de volta no prato. Estamos as três num café a lanchar e como sempre Clarke verifica as noticias do momento, ligada à wi-fi deste café onde sempre costumávamos vir. Muitas vezes era ela que me mantinha informada sobre as noticias mais recentes do mundo da música e outras tantas era ela que me dava a conhecer novas bandas. Foi com ela que comecei a ir a bares de rock, ainda que no inicio tivesse sido difícil tanto para mim, como para ela. Eu porque não era muito apreciadora de bares e saídas - o que certamente mudou imenso - e ela com as restrições que os pais impunham.

Pelo meio houveram muitas mentiras para podermos sair de casa. Deve ser típico nas nossas idades mentir para conseguir aquilo que queremos. Umas vezes dizíamos que tínhamos a companhia de um adulto, então aí eu punha o meu tio - que foi nosso aliado deveras vezes - a falar com os pais dela ao telemóvel; outras vezes o primo dela dizia ir connosco. Muitas vezes isso não acontecia mas outras ele realmente ia. Por fim, de quando em quando, uma dizia vir dormir a casa da outra. Principalmente ela a minha casa quando a minha mãe estava a trabalhar.

Mary, em frente a mim e do lado direito de Clarke, aproximou-se também deixando de comer, para ver de que banda se tratava. Ela não liga muito a bandas ou a rock, mas ela gosta de estar a par de tudo como eu. Eu que tenho os gostos mais ecleticos de sempre. Gosto de tudo um pouco.

- Como se chama? - Pergunto ainda antes de olhar para o visor, ao mesmo tempo que mastigo um pouco da sandes que me está a saber maravilhosamente bem. Deve ser por ser daqui, deste café do qual já tinha imensas saudades de vir.

- 5 seconds of summer.

Literalmente pensei que fosse cuspir todo o meu almoço, lanche, jantar ou comida da semana passada fora ao ouvir aquelas quatro pequenas palavras. Desde quando é que eles conseguiram ser tão conhecidos ao ponto de Clarke saber da existência deles?

PAPER SOULS • CALUM HOODOnde histórias criam vida. Descubra agora