44

13 1 0
                                    

Faith

Silêncio era algo impossível nesta casa e eu acho isso fabuloso. Calum ficou para jantar a convite da minha mãe e ela está tão feliz agora. Acho que a partir deste momento ela se começa a acostumar de que estou crescida e pronta para uma vida. Mas é tão estranho.

Ainda que não lhe tenha dito que eu e ele estamos num impasse e que não namoramos, apenas nos limitamos a ficar, Bela já o considera da família. Ele apareceu poucas vezes cá em casa, porém creio que as expressões contagiosas dele a cativaram desde o primeiro instante.

Acho que a nossa relação a faz lembrar do inicio da dela e do meu pai, só que também acho que ela reza para nós não termos o mesmo fim.

- O jantar estava bom? - Questiona Bela, levantando-se da mesa.

- Muito bom, senhora Miller! - Responde Calum.

Todos saímos da mesa, seguindo a mãe galinha que se dirigia para a cozinha. Era lá que ela costumava fumar e fazia-o sempre depois das refeições. Ela acendeu o cigarro. Virei a cara. A vontade de também eu acender era enorme, mas obviamente que não o irei fazer. Estou em frente à minha mãe. Calum acanhou-se. Levou a mão à cabeça, envergonhado e com vontade de fumar também.

- Se fumares, podes fazê-lo, Calum. Não te prendas por mim. - Diz a minha mãe, mostrando o seu lado liberal, enquanto o fumo lhe saia pelo nariz.

Vi-o hesitante, porém cedeu e acendeu também ele o seu cigarro. Logo nesse instante o telefone toca proporcionando-me um sobressalto. Por dentro dou graças a Deus de ter saído de perto deles pois o bichinho dentro de mim fazia cócegas com a vontade que tenho de fumar.
Achei estranho quando vi o nome de Ariel brilhar no visor a esta hora. Em outros dias só falávamos à noite pelo computador ou mesmo no bar. Uma ligação dela da parte da noite era esquisito, pois Ariel parecia esquecer-se completamente do telemóvel a partir das oito da noite.

- Estás bem? - Pergunto logo ao atender o telemóvel.

Para não ter de receber questões do Calum ou da minha mãe, afasto-me deles e falo por sussurros.
Ouço Ariel ofegante. Ela estaria a chorar. Só Deus sabe o quanto aflita fiquei e a maneira como o meu coração disparou.

- Ari! - Chamo. - Que se passa?

Ela de nada respondia. Apenas soluçava. O nervosismo e medo permitiram-me que andasse de um lado para o outro sem parar. A minha mãe e Calum já olhavam para mim, da cozinha até onde me encontro - no hall de entrada. O rapaz abanou com a cabeça como se me perguntasse o que se passava. Ergui a mão pedindo-lhe para esperar.

- O Luke. - Ela diz por fim, com dificuldade de respiração.

- O que tem? Ele está bem?

- Sim, ele parece ficar bem sem mim. - Responde-me. A amargura na sua voz era notória.

Entendo o que ela me diz e a decepção por que ela passa, embora não saiba a razão para tal. Eles são um casal tão perfeito. O que se passará no meio deles? O que mexe com o paraíso?

- Estás em casa? - Pergunto-lhe.

- Sim.

- Vou ter aí contigo, ok? Cinco minutos e estou aí.

Calum

Pela conversa que Faith estava a ter apercebi-me de que falava com Ariel. A preocupação dela disso me confirmou. Elas tornaram-se bastante próximas desde aquela noite no bar, quando as apresentei.
Faith é amiga do seu amigo e ela quer sempre que estejam todos bem. Ela é amável e preocupada. Se conseguisse ela gostaria de ser, certamente, uma heroína que juntasse todas as peças partidas de algo que está mal. De algo partido.

Admiro-a tanto por ela ser assim com toda a gente, mesmo com aqueles que outrora lhe fizeram mal. Admiro-a por tudo e por nada. O encanto por ela surgiu tão rapidamente e ele era maior do que o medo que eu tinha de voltar a errar.

- Podes levar-me, por favor? - Perguntou-me, despachada, metendo o telemóvel no bolsa de trás das calças. A sua voz transmitia-me a hesitação de me pedir tal coisa.

- Claro! Era a Ariel?

- Sim, era. Não me parece que esteja muito bem com o Luke.

Ao olhar para ela não julguei que estivesse assim só pelo estado concreto de Ariel, mas sim porque ela também já passou por isto. Provavelmente é por isso que ela a queira ir socorrer tão depressa. Talvez não seja só uma simples amizade que elas nutrem. Talvez isto seja tudo, sempre, sobre proteção.

Faith suspira nervosa. Leva uma mão ao cabelo. Acabo o cigarro e, entrelaçando os meus dedos nos seus, seguimos caminho para fora de casa. Até chegarmos ao carro ela tremia. Uma pessoa qualquer ia olhar para ela e julga-la maluca, porque de todas as vezes que algo acontece o seu estado é indecifrável. Mas eu olho para ela e de maluca ela não tem nada. De que mal tem as formas como reagimos? Por vezes não são as corretas, é certo, mas o que devemos fazer para as controlar se são incontroláveis?

Já a caminho de casa de Ariel, Faith pousou a mão na minha coxa. Sentia-a ainda a tremer. Retiro a minha mão da manete de velocidades e sobreponho-a sobre a de Faith. Gostaria de descansa-la, porém não o consigo fazer.

- O que é que ela te disse? - Pensei que ao puxar conversa e ao ela desabafar, iria ser melhor.

- Simplesmente nada. Apenas que o Luke ficava melhor sem ela.

Na rua ao virar da esquina ficava a casa de Ariel. Faltava relativamente pouco para lá chegarmos. Sei que o pequeno coração da minha Faith vai palpitar ainda mais depressa e que ela vai ofegar e talvez chorar quando se abraçar a Ariel, porque ela está com medo. Com medo não só pela nossa amiga, mas por todos. Creio que ela põe até em questão a nossa relação.

Faith

A vontade de chorar de aflição no meio do tudo e do nada é tão grande. Sinto-me tão fraca de cada vez que o faço, mas a Ariel deixou-me aflita. Saber que ela está a sofrer, por algum assunto relativo a Luke, deixa-me agoniada. É disto que eu falo quando me refiro ao medo das relações. É disto que eu falo quando digo que não quero estragar a relação de amizade com Calum. Porém a cada dia que passa o sentimento aumenta. É inevitável. É tão forte que, embora o receio aumente, não me importaria de ser magoada por ele. Metaforicamente.

Calum estaciona o carro em frente à casa de Ariel. A entrada era iluminada por uma pequena lâmpada de exterior.Consigo ver um vulto à porta dela.

- É o Luke. - Observa Calum como se me tivesse lido a mente.

O loiro andava de um lado para o outro em volta da porta.

- É melhor irmos ter com ele antes que ele tente entrar dentro da casa! - Calum diz confuso, saindo apressado do carro e correndo rapidamente em alcance de Luke. - Isto não pode estar a acontecer. - Suspira.

PAPER SOULS • CALUM HOODOnde histórias criam vida. Descubra agora