58. Duvida quando te parecer óbvio

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Dia 88

Kim sentia a adrenalina pulsar, forçando o corpo franzino a despertar da preguiça e cansaço que a madrugada trouxera, enquanto vestia as roupas que Rachel encontrara nos pertences roubados das gémeas, optando por umas calças elásticas que não lhe comprometessem os movimentos e um top apertado. A morena franzira o nariz com a roupa desconfortável mas aceitara-a de imediato quando a amiga lhe explicara o propósito das peças justas.

Ela ainda podia sentir o velho medo abrandar-lhe a determinação e a vontade de encarar o que o grupo que a acompanhava planeara como uma missão, o que era patente na forma como as mãos trémulas e transpiradas agarravam o tecido e o puxavam contra a pele coberta por uma fina camada de suor gelado. Eles não tinham que fazê-lo, ela ainda não queria que eles o fizessem, e ali estavam eles preparados para o pior, por sua causa.

Por isso, Kim travou o medo e decidiu que não o iria deixar tomar conta da sua vontade. Jake acabara por aconselhá-la a ficar junto de Rachel no carro, que não seria seguro, quando percebera o pavor na sua expressão. Mais ninguém lhe percebera o pânico exceto ele, no entanto, ela insistira em acompanhá-los, sabendo que se sentiria pior se tivesse que esperar longe dele. Kim também sabia que não possuía a força ou destreza física e mental do rapaz, mas tinha vontade pelos dois. O medo não iria impedi-la de saber a sua origem.

Eles já haviam deixado o parque de merendas há algum tempo. Aproveitando os trilhos na montanha de acesso a ciclistas e passeios pedestres, Brian conduzira o carro manualmente pela floresta, até estacioná-lo a apenas alguns metros do recinto da propriedade. Camuflados pela vegetação, os rapazes decidiram que evitariam a entrada principal do complexo de filtração de águas, perto da estrada principal. As traseiras do recinto, rodeadas por floresta densa, conferia-lhes a proteção necessária enquanto não soubessem o que esperar daquele local. Até o saberem, eles apenas iriam observar.

Brian estudou minuciosamente a planta antiga do edifício e debruçou-se sobre os hologramas que projetavam toda a área industrial para perceber o que havia mudado. Jake franziu o cenho quando notou o abandono nas infraestruturas. Ele observou os dois pequenos lagos que quase se difundiam na floresta e que abriram pequenos sulcos no solo, por onde a água corria até às antigas piscinas de tratamento, que se prolongavam por longas dezenas de metros.

As estradas que permitiam o acesso a todos os armazéns do complexo tinham sido transformadas em cemitérios de viaturas antigas, o asfalto erodido coberto de folhagem e sobras de materiais industriais. A passagem para os grandes silos, que um dia abrigaram milhares de litros de água, estava impedida pelo emaranhado de mato infestante que crescera livremente nos últimos anos de abandono.

A falta de iluminação não o deixava observar mais, contudo ele não conseguia deixar de pensar no quão errado era a falta de sinais humanos no local. Não havia sinais de atividade recente e, apesar de tudo, ele sentia-se observado. A sensação enviava-lhe arrepios até à nuca, que se misturavam com as dores e as adormeciam, colocando o corpo alerta.

Jake demorou-se nos edifícios principais do outro lado do recinto, que refletiam o luar e lhe permitia uma visão mais clara do seu estado. Ele estreitou as pálpebras até a cabeça doer, em protesto pelo esforço de tentar ver qualquer vestígio de atividade no interior dos antigos escritórios. O moreno não soube quanto tempo se demorou no prédio envidraçado, esmiuçando cada vidro partido, contabilizando os andares e apreendendo todos os pormenores da estrutura entre pisos até finalmente ver.

Uma luz ténue, que pulsava em curtos espaços de tempo compassados, refletia-se contra os vidros altos e o clarão da lua revelava o resto.

            – Parem – sussurrou o irlandês, quando o martelar incessante na cabeça o fez piscar e fechar os olhos.

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