39. Irmã

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Finalmente aquele dia trágico tinha chegado ao fim. Kim tinha a certeza que seria a primeira noite em que dormiria profundamente, apesar de tudo o que acontecera. Ela simplesmente não aguentava o ambiente de perda que os envolvia a todos, porque ela não sentia o mesmo. Percebeu que Aidan morrera antes de Jake ter de o explicar a David e Rachel, e apesar de o loiro a ter forçado e tocado de uma forma que ela não queria lembrar, não conseguia ignorar a sua morte. Não o odiava, porque ela não conhecia o sentimento, mas Aidan era bom. Não obstante, não era justo que o rapaz tivesse partido quando era evidente que não o merecia e que deixara três pessoas destroçadas.

Ela encaminhou-se para o quarto que iria partilhar com Rachel sem saber se o deveria fazer. Simplesmente não sabia lidar com os sentimentos da loira, com a dor que a atravessava naquele momento. Bateu à porta e, sem receber resposta, entrou na divisão.

- Estás a dormir? – perguntou timidamente ao observar Rachel deitada sob as cobertas.

- Não, – a voz saiu fraca - podes entrar.

- Desculpa. É só porque tenho sono.

- Está à vontade. Eu vou só à casa de banho e vou dormir também. – Rachel limpou os olhos rasos de lágrimas que ameaçavam cair e levantou-se da cama.

– Rachel – Kim chamou-a e pela primeira vez ousou tocar-lhe no braço. Era a primeira pessoa que tocava conscientemente sem ser Jake e isso refletia o que sentia por ela. Rachel não ia perceber apenas tocando-a, por isso teve necessidade de lho dizer: - Eu sei que não há ninguém que vá substituir o Aidan, mas eu posso ser a tua nova irmã a fingir se tu quiseres. – Kim fez uma pausa para abrir um sorriso doce - Porque eu não sei se tenho alguma, mas se tiver, quero que seja exatamente como tu. E porque não gosto mesmo de te ver chorar.

Rachel também sorriu e então as lágrimas que lhe toldavam a visão fluíram finalmente.

– Oh Kim – a loira reprimiu um soluço e abraçou-a, paralisando-a por momentos. – Se tu ao menos te visses como nós te vimos. – Kim sentiu o coração acelerado martelar-lhe o peito, recordou o homem que a violentara, recordou Aidan que a tocara à força, e percebeu que aquele abraço carinhoso não tinha qualquer comparação. Que as pessoas tinham o poder para lhe fazer todo o mal do mundo, mas podiam escolher o bem e fazê-la sentir-se querida. Querida por alguém. - Adoro-te. – Rachel estreitou-a o máximo que pôde e fungou. - Obrigada. Depois do que o Aidan te fez, obrigada. – Kim piscou diversas vezes e finalmente retribuiu o abraço, conseguindo desfrutá-lo sem medo. Finalmente sem medo.

- Apesar de tudo, eu não queria que ele morresse – balbuciou Kim, contra o ombro da rapariga. - Não queria mesmo.

- Eu também não. – Rachel fechou os olhos e pensou no irmão. Pensou também na irmã que a abraçava com carinho e na bondade que lhe ia no coração. – Eu também não.

Kim não sabia o tempo que permaneceram abraçadas antes de Rachel decidir ir à casa de banho e voltar a deitar-se. Ela só sabia que acabou por adormecer segundos depois de se deitar, vencida pelo cansaço. E só acordou quando percebeu não estar preparada para a violência do pesadelo que lhe assaltou o inconsciente.

Dia 37

Ela não sabia há quanto tempo vagueava por aquela estrada sob o sol intenso de Verão. Desde que conseguira escapar daquela cave assustadora que correra até as pernas doerem, até deixar de conseguir respirar ou abrandar o ritmo do seu coração. Agora caminhava cambaleante sobre o eixo da via, embrenhada em suor e sangue, despida de quaisquer roupas ou dignidade, sem destino. Sentia-se ligeiramente adormecida e forçara a sua cabeça a trancar tudo o que acontecera naquele dia. Não queria lembrar. Não acontecera, fora um sonho. Um sonho mau e só isso. Ela já nem sabia se fora naquele dia, se há uma semana, se querer tinha acontecido. Não tinha.

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