A NOITE ia alta, já se havia passado horas desde a confusão matinal, e ainda assim David não conseguia deixar de pensar no sucedido. Encontrar uma solução para o intruso não tinha sido tarefa fácil. A opção mais sensata e correta seria telefonar para a polícia e relatar o sucedido, o que fizeram, mas sem sucesso algum. Tentaram também o número de emergência e a resposta foi a mesma: nada. Era frustrante não conseguir contactar os serviços básicos de segurança a que tinham direito e a sensação de responsabilidade pela própria justiça era revoltante.
O homem não tinha acordado nas horas seguintes, o que os levou a pensar que Kim o matara involuntariamente, o que não era verdade. Ele ainda tinha batimento cardíaco quando David e Aidan o levaram à família, protegidos com as máscaras e luvas que teimavam em não usar. A família do agressor tinha avisado que ele estava doente e tinha-se mostrado violento e revoltado, sem ouvir ninguém.
Para David, a alegada doença não era uma desculpa plausível. Mesmo que o homem tivesse estado inconsciente dos seus atos, isso não apagaria os hematomas que Jake tinha pelo corpo ou a dor das contrações involuntárias a cada respiração. Ele tinha magoado Jake e podia acontecer de novo. Com alguém inofensivo ou perigoso, desconhecido ou familiar, e isso assustava-o. Ele sabia que Jake ficaria bem em breve e as feridas dele iriam sarar, mas e se acontecesse novamente? Se algo pior acontecesse a Rachel quando ele soubesse que podia voltar para casa, quando tivesse de regressar ao trabalho?
– Hey, não consigo dormir contigo assim – murmurou Rachel com uma voz rouca que o arrepiou e afastou os pensamentos negativos.
– Desculpa.
– Quase que te consigo ouvir pensar. O que se passa? – perguntou a loira, apoiando o queixo no peito dele, tentando olhá-lo na fraca luz de um pequeno candeeiro.
– Estava a pensar em ti – respondeu o rapaz, sem calor. Ela sorriu e deitou a cabeça no ombro dele, como sempre gostava de fazer quando se queria sentir próxima
– Vais achar que sou egoísta, e eu sei que sou muito egoísta e mesquinho, mas não consigo aceitar a ideia de ficares aqui sozinha, e aposto que o teu irmão também não vai achar piada. E é isto. – ele desabafou de uma vez tudo o que o preocupava, num tom de voz que fez Rachel reagir de forma inesperada. Em vez de o acalmar e dizer "Sim, David, tens razão", ou pelo menos ficar ofendida, ela começou a rir. Ela riu e não o levou a sério.
– Mas tu estás aqui comigo. – lembrou a rapariga, passando as mãos pelo peito dele. – Se te lembras, é impossível voltar agora.
David rejeitou os carinhos dela e suspirou profundamente, fechando os olhos.
– Vai deixar de ser e tu vens comigo – disse com determinação, erguendo ligeiramente a cabeça e olhando para ela para deixar claro que falava a sério.
– David... – advertiu Rachel, quebrando o contacto das suas mãos subitamente frias com o seu rosto. A atitude possessiva dele a irritava, e se havia algo que a deixava realmente chateada era ele tentar controlá-la, quando ela não fazia o mesmo.
– Não comeces, Rachel – pediu ele. –Hoje um vizinho aparentemente inofensivo agrediu o Jake, e tu viste como ele ficou. Amanhã, isso pode acontecer contigo, se não for algo pior.
– São coisas que acontecem – retorquiu ela, desviando o olhar dele.
– Não contigo.
– Há a Kim agora – argumentou num tom pouco comum.
– A Kim não é da tua responsabilidade e sabes disso! – bramiu o rapaz, sentando-se também.
– Prometi-lhe um teto e não a vou deixar agora por medos insignificantes teus.
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UPRISING
Science FictionNum futuro não muito distante, uma nova estirpe viral ameaça exterminar a espécie humana da Terra. O estado máximo de alerta pandémico obriga ao êxodo das grandes cidades. Em Los Angeles, um grupo de amigos tenta ignorar o pânico geral da população...