VOZES. Ela conseguia ouvi-las de novo. Sem perceber porquê, o medo instalou-se. Continuar de olhos fechados, num estado ainda entorpecido, enquanto ouvia vozes à sua volta, era apavorante. Ela não sabia porquê, mas simplesmente não conseguia permanecer naquele estado por muito tempo.
Abriu os olhos repentinamente, mesmo sem conseguir ver de imediato. Piscou-os diversas vezes e quase no mesmo instante o seu campo de visão foi preenchido por uma expressão preocupada, aliviada e simultaneamente distante e quase impenetrável. O rapaz olhava para ela como se tivesse acabado de descobrir a cura para uma doença grave e não quisesse compartilhá-la com ninguém.
Ela não demorou muito a perceber que algo estava errado. Foram apenas necessários meros segundos para conseguir regressar à noite anterior, quando vagueara pelas ruas desconhecidas e encontrara uma mulher a pedir ajuda. No entanto, a mulher que encontrara não era tão robusta nem aparentava ter dois metros de altura.
Os seus olhos arregalaram-se e ela ergueu-se do sofá a uma velocidade impressionante, quase imediatamente começando a respirar com dificuldade, como se entrasse em pânico. A reação surpreendeu os desconhecidos na sala.
Jake ignorou a reação exagerada e agachou-se novamente à sua frente, ansiando acalmá-la, mas ao mesmo tempo temendo que ela quisesse atacar e demonstrar a sua loucura agora que estava acordada.
– Sentes-te melhor?
Assim que a pergunta saiu dos lábios de Jake, ela encolheu-se o mais que conseguiu no sofá, como um animal assustado.
David, que até então se mantivera em silêncio, aproximou-se, agachando-se perto do irmão e aguardou por uma resposta:
– Lembras-te do que aconteceu?
Ela suspirou fundo e tentou acalmar o coração que batia desenfreado. Não tinha de sentir sempre medo de cada vez que conhecesse uma pessoa nova. Não podia assustar-se sempre que alguém lhe estendesse uma mão amável ou mesmo uma que fosse para a ferir. O rapaz de olhos azuis penetrantes parecia querer estender uma mão amável, por isso ela tentou acalmar-se e responder:
– Sim. Só não sei... Ai! – gemeu de dor quando franziu os sobrolhos. Levou a mão à cabeça e percebeu que um penso lhe cobria grande parte da testa dolorida. – O que é isto?
– Caíste e magoaste-te. Deves ter perdido muito sangue, estavas inconsciente há horas... – informou-a David, com um sorriso simpático. – Rachel, ela acordou! – David chamou a namorada do andar de cima.
– Já não te vai sair o cérebro por aí – interveio Aidan, divertido, sentando-se no lugar vago ao lado da rapariga. – Deste-nos um valente susto, eles ainda têm medo que tu voltes a morrer no sofá, mas pareces anormalmente saudável, não fosse o efeito múmia dessas ligaduras.
Jake lançou-lhe o olhar mais mortífero que possuía e levou a mão à testa, sentindo-se idiota pela idiotice do amigo.
– Talvez fosse importante dizer-nos como te chamas, para começar – pediu Aidan, tentando redimir-se perante os olhares reprovadores.
Ela não respondeu de imediato. Não podia. A verdade é que não sabia o seu nome e, pior, nunca tinha pensado nisso.
– Eu... – começou, reticente, afagando o pulso distraída.
Ah, é isso.
Olhou o pulso tatuado e, acariciando o desenho com o polegar, tentou decifrar mais uma vez aqueles dígitos, sob o olhar atento dos desconhecidos.
– K... – murmurou, confusa. – Eu sou...
– Kim... É isso, Kim? [1]
Ela mostrou-se confusa e estava prestes a negar, mas o rapaz de cabelos castanhos e sorriso reconfortante não lhe dava alternativa senão concordar com ele.
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UPRISING
Science FictionNum futuro não muito distante, uma nova estirpe viral ameaça exterminar a espécie humana da Terra. O estado máximo de alerta pandémico obriga ao êxodo das grandes cidades. Em Los Angeles, um grupo de amigos tenta ignorar o pânico geral da população...