Brian sentiu-se um intruso quando saiu do carro, depois de cuidar de Jake, e encontrou Rachel deitada sobre a sombra do grande carvalho que os abrigava, num sono profundo. A loira dormia pacificamente, apesar de ainda haver vestígios de lágrimas no seu rosto, que escorreram pelo pescoço empoeirado e ali secaram.
A luz da manhã, que conseguia penetrar nas folhas e iluminar a clareira, concedia um tom dourado à pele rosada pelo esforço de querer libertar a dor apenas através das lágrimas.
O canadiano pousou o estojo de primeiros socorros no chão e estudou a forma protetora como ela se enroscava em si mesma, abraçando-se, tornando-se pequena e frágil com a posição primitiva. Rachel era uma desconhecida para si, assim como todos os outros, no entanto, os últimos três dias de convivência tinham-lhe mostrado que aquela versão da rapariga estava profundamente errada. E de uma forma ou de outra, mesmo não a conhecendo, ele compreendia.
Brian ousou cobrir todo o corpo feminino com o olhar cansado, percebendo que a perna dela precisava de cuidados urgentes, a ferida purgante já a prolongar a infeção que as farpas afiadas tinham trazido. O rapaz tentou virá-la de costas, delicada e vagarosamente, decidindo que cuidaria melhor dela se a mantivesse inconsciente pelo tempo que conseguisse.
No momento em que ele lhe tocou na coxa magoada, apenas para observar mais perto, a loira acordou em sobressalto e ergueu-se com destreza, agarrando instintivamente o que conseguia do intruso. No entanto, num piscar de olhos e de regresso à realidade, a expressão feminina alterou-se e a dor regressou ao olhar azul.
Em silêncio, Rachel afrouxou o aperto sobre o pulso do rapaz e voltou a deitar-se de costas, cobrindo de imediato os olhos irritados com as mãos. O nó na garganta, sempre presente, acabou por distraí-la da dor física e ela desejou que lhe doesse, que ardesse e moesse até ela não ter a capacidade de pensar e sentir. Seria tão mais fácil.
O canadiano cortou os jeans que ela vestia com cuidado, acompanhado pelo silêncio e desapego da loira, como se estivesse sozinho. Tal como Jake, ela não reagia à dor e a apatia era mais desconcertante do que a histeria que se abatera sobre ela quando soubera. Não obstante, ele retirou cuidadosamente os pedaços de madeira incrustados no músculo com uma pinça, limpando a área envolta de terra, mistura de sangue coagulado e poeira.
Quando ele puxou o lenho mais enterrado na carne macerada Rachel arquejou as costas e o seu rosto contraiu-se num esgar de dor e surpresa, finalmente. A respiração dela ficou suspensa durante algum tempo, o suficiente para que pudesse suportar o ardor que lhe queimava o corpo, e as mãos de Brian imitaram-lhe a inércia. Ela molhou os lábios secos com a língua quando uma onda de calor a trespassou e se centrou na coxa, e piscou os olhos que ardiam, para então dizer, ainda não se permitindo respirar livremente:
– Eu tinha sete anos – começou, tentando abstrair-se da dor, mesmo que aos borbotões. – Os meus pais decidiram mudar-se para uma zona mais periférica da cidade e eu lembro-me que o Aidan esteve amuado durante esse verão inteiro. Ele levava a vida social muito a sério para um miúdo de onze anos e chegou a despedir-se dramaticamente dos amigos como se nunca mais os fosse voltar a ver e se fosse mudar para o outro lado do mundo.
A loira esboçou um sorriso triste por entre respiração entrecortada e fechou os olhos quando a força das emoções e da dor na perna lhe pesou nas pálpebras.
– Durou uma semana depois de nos mudarmos. Menos de uma semana e o Aidan já andava pela casa a dizer que a Sra. Brody fazia a melhor Apple Amber de sempre e que o filho dela o convidava para brincarem de tarde. Oh, a Patricia fazia mesmo a melhor Apple Amber de sempre e o Jake queria um amigo da idade dele para brincar nas férias.
VOCÊ ESTÁ LENDO
UPRISING
Science FictionNum futuro não muito distante, uma nova estirpe viral ameaça exterminar a espécie humana da Terra. O estado máximo de alerta pandémico obriga ao êxodo das grandes cidades. Em Los Angeles, um grupo de amigos tenta ignorar o pânico geral da população...