34. Faz-me esquecer, por favor

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Kim empurrou Jake para não ter que enfrentar o seu olhar novamente e correu para fora da divisão. Apressada, saiu da suíte, ignorando os chamamentos de Rachel. Tinha apenas que se concentrar naquilo que ia fazer, naquilo que sentia.

Antes de pensar sequer em desistir, bateu à porta do quarto ao fundo do corredor. Parte de si queria que ninguém a abrisse, que pudesse voltar à casa de banho, que pudesse sair daquela pensão, da vida deles. A outra parte manteve-a firme, à espera. David abriu a porta e ela estacou por completo. Então, ignorando o olhar preocupado do moreno, avançou para ele. Quase empurrou David para conseguir passar e, apesar de sentir o pânico invadi-la, aproximou-se o suficiente de Aidan para o fitar nos olhos.

– Mudaste de ideias?

O murmúrio do loiro em tom jocoso fê-la voltar a sentir as mãos dele sobre o seu corpo, os lábios, a língua... Ele provocou-a de novo, levantando-se da cama e avançado lentamente para a rapariga, que não recuou um único passo. David preparou-se para mandar o amigo se calar, mas Kim agiu primeiro. Assim que a malícia regressou ao rosto do rapaz ainda bêbedo, ela não pode evitar e desferiu um estalo na face afogueada dele. O som seco da bofetada ecoou na divisão, chocando os presentes. Chocando-a. Não obstante, assegurou num tom demasiado sério:

– Tu nunca mais me voltas a tocar sem eu querer. E acredita que eu não vou querer. Nunca mais ninguém o vai fazer e és o primeiro a ficar avisado. Nunca mais. – Sentiu a voz tremer e o instinto disse-lhe para sair daquele quarto imediatamente, esconder-se até se livrar daquele medo quase doentio. Ainda assim, a expressão atónita do rapaz, com a mão sobre a face magoada, fê-la continuar. – Sou uma pessoa, caso ninguém tenha reparado. Vocês chamam-me burra, infantil e deficiente, e sei que é o que toda a gente deve pensar de mim, mas eu sou uma pessoa e estou farta de ser magoada e de ter medo. Nunca mais me toques, Aidan.

Aidan não esperara uma reação daquelas. Na verdade, os seus pensamentos ainda iam e vinham de forma extremamente lenta, não se apercebera do que realmente fizera à rapariga até ela o confrontar daquela maneira. Jake esmurrara-o e ameaçara-o, David massacrara-o quase até à exaustão nos últimos minutos, mas nada surtira o efeito do gesto inesperado de Kim. Ainda atordoado, balbuciou, sem jeito:

– Eu pensei que tu quisesses...

– Eu implorei para que parasses! – interrompeu a rapariga lutando contra os tremores que a envolviam. – Eu só queria que parasses...

As memórias do homem sobre ela atingiram-na da pior maneira. A imagem de Aidan misturava-se com aquelas recordações dolorosas e ela não se conseguiria conter por muito mais tempo. Quisera o respeito dele, recobrar a sua dignidade e provar que era suficientemente capaz de se defender a si mesma. Mas não era.

Porque não conhecia o orgulho ou a arrogância, saiu do quarto tão rapidamente como entrou.

Ela soube que Jake a seguia mesmo sem ter que se virar para trás. Surpreendeu-a por fazê-lo sem dizer nada, sem a acusar, sem a confortar. Ela só teve a certeza da sua presença quando ele lhe abriu a porta do quarto que partilharia com Rachel. Kim entrou e trancou a porta imediatamente, encostando-se a ela e fechando os olhos. Apesar de tudo, destruíra uma enorme barreira ao confrontar Aidan. Sentira confiança em si mesma pela primeira vez, mesmo que por míseros segundos.

– Estás bem? – perguntou Jake, seguido de um silêncio cortante. Ele queria perguntar inúmeras coisas, mas não o podia fazer. Não já.

– Não – respondeu a morena, ganhando coragem para o fitar. No silêncio esmagador da divisão, sob o olhar intenso do rapaz, ela não se conseguiu conter. Desencostou-se da porta e avançou para ele com o ímpeto de uma criança assustada. Abraçou-o com força, como se não o visse há anos, como se se tratasse de uma despedida calorosa e não a busca de simples conforto. Jake recuou com a força do impacto e teriam caído se por instinto não a agarrasse.

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