56. Gráim thú

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Os tons quentes do crepúsculo manchavam o horizonte, anunciando o final de mais uma tarde de fim de Verão. O gradiente entre o azul brilhante do dia e o breu da noite não era visível do bosque, onde as enormes árvores guardavam a luz acima das grandes copas. Não tardaria para que a escuridão e os sons noturnos adensassem o ambiente das clareiras da floresta, e Kim ainda não queria ir.

Horas antes, a morena insistiu em explorar o local e Jake assentiu, sabendo que não havia mais nada que pudesse querer fazer durante a tarde angustiante do que estar com ela. Ver o mundo através dos olhos de Kim forçava-o a dar valor às coisas, a apreciar pequenos gestos e formas de vida que sempre fizeram parte do seu ambiente e que nunca notara.

Ela praticamente arrastou-o pelo trilho de pedras que indicava o caminho pedestre até à ponte suspensa do Parque, depois de perceber pelas imagens promocionais ao turismo ambiental que a floresta escondia uma cascata.

Kim quase perdeu o sorriso quando atravessaram a ponte suspensa sobre o pequeno riacho e finalmente percebeu que o pequeno córrego de água que descia pelos trilhos suntuosos da montanha não era o que ela esperava. Apesar da quase desilusão, o sorriso não escorregou nem por um segundo do rosto bonito, principalmente quando leu novas indicações para uma piscina natural a alguns metros.

Jake gostou da ideia e acompanhou-a até à margem do ribeiro, que convergia em poços naturais de águas límpidas e cristalinas, travadas pelas grandes pedras arredondadas ao longo de séculos de erosão. A pequena praia fluvial na clareira rodeada de arvoredo assemelhava-se a um oásis no pesadelo, e ele deixou-se descontrair durante algum tempo, como se não existisse mais nada para além do limite protetor da floresta.

Ele não sabia há quanto tempo estava sentado sobre um amontoado de rochas grandes e polidas, aproveitando ainda o calor retido nelas pelo sol incidente durante o dia. Talvez tivesse adormecido brevemente enquanto a rapariga explorava a piscina pouco profunda, depois de a ter acompanhado por tempo suficiente até um súbito cansaço se apoderar de si.

O descanso reparador acabou por terminar quando um baque seco de pedras a rolar perto de si o despertou. Quase no mesmo instante, um corpo gelado saltou sobre o seu colo e Jake soltou todo o ar que os seus pulmões armazenaram quando uma guinada rápida de dor subiu da sua pélvis desprotegida até à nuca.

— Tu estás gelada! — gritou ele quando a rapariga o abraçou com força e rapidamente esqueceu o latejar dentro dos seus boxers. — Será que não consegues aproximar-te de água sem te atirares a ela? — indagou, tentando soar sério apesar de um meio sorriso nos lábios o denunciar. Ele não conseguia impor-se quando ela escondia o rosto molhado no seu pescoço e o enlaçava com carinho, apesar de as mãos serem gélidas como pedra contra a sua pele.

— Eu t-tentei — ela tentou justificar, num sussurro trémulo, e tudo o que conseguiu foi o arrepio involuntário de Jake, pelo contraste dos lábios frios com a pele abrasiva — Mas a água é tão t-transparente e limpinha e eu consigo m-meter os pés no chão sem me afogar e consigo v-vê-los — tartamudeou a rapariga, apoiando novamente todo o peso do seu corpo sobre o colo dele para mexer os dedos dos pés descalços. O movimento escureceu os olhos de Jake por breves segundos, e ele deixou de ouvir o entusiasmo das descrições da rapariga para se focar finalmente na verdadeira aparência dela.

Kim fizera exatamente o que ele tentara evitar. Ao contrário do mergulho imprudente em Hollywood, onde ela tirara as roupas por instinto e se mostrara sem vergonha, desta vez a rapariga decidira molhar o único vestido que tinha.

Ela não mergulhara, como ele lhe pedira, e provavelmente molhara a roupa por mera distração mas o tecido, que agora se colava às coxas dela, ficara ensopado e pesado sobre si mesmo. Pequenas gotículas de água brilhavam sobre a pele sedosa, ainda escoriada e ferida pelo ataque de Alana, de repente pálida e arroxeada como se todo o sangue que o coração dela bombeava não fosse suficiente para lhe aquecer o corpo. Os lábios mantinham um sorriso enquanto falava e Jake focou-se neles, apenas para notar o ligeiro tremor sempre que ela os movia para articular as palavras.

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