23. A vez em que um jovem lobo travou uma batalha na areia

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A mulher misteriosa, que eu descobrira se chamar Enoe, nos encarava fixamente, sem demonstrar nenhuma emoção. Aquele silêncio estava me matando de ansiedade, por isso falei a primeira coisa que me veio à cabeça, apenas preocupado em diminuir a tensão crescente entre nós.

— Eu e meu irmão estávamos voltando pro nosso carro — arrisquei, — mas eu imagino que você não vai deixar a gente sair daqui tão facilmente, não é mesmo?

— Você está correto, lobinho — ela finalmente falou, sem demonstrar preocupação. — Até que você não é tão estúpido quanto parece. Mas enfim, vamos terminar logo com isso? Tô seguindo vocês desde o território brasileiro e já me cansei desse jogo de gato e rato.

— Como você conseguiu rastrear a gente? — perguntei, confuso. — Não tinha nenhum outro carro nos seguindo, nós fizemos questão de vigiar a estrada atrás da gente o tempo todo!

— Uma mulher nunca revela seus segredos — ela comentou, sorrindo. — Mas, como prova da minha boa vontade, vou saciar um pouco da sua curiosidade e dizer que tive ajuda da minha relíquia de poder pra passar despercebida durante todo esse tempo.

— Então você também tá fazendo uso desses artefatos? — Benjamin indagou, interessado.

— Nosso rei Navalha presenteou cada um dos membros do Conselho dos Sete com uma das relíquias mais poderosas que ele conseguiu reunir — revelou Enoe. — E eu tenho feito muito bom uso da minha, é só o que posso dizer.

— Você realmente não se preocupa com a chance de acabar sofrendo algum efeito colateral se continuar usando essa outra fonte de poder? Isso não é algo natural para os lobos e pode ser muito perigoso... — advertiu meu irmão.

— Chega de conversa fiada, Benjamin. Não vou ficar discutindo esse assunto com dois criminosos fugitivos — ela retrucou, finalmente demonstrando um pouco de irritação. — Vocês sabem muito bem o que eu vim fazer aqui. Esse passeio acaba agora. Vocês podem se render e deixar eu executar os dois de uma maneira indolor ou podem escolher fazer isso do jeito difícil. Apenas aviso que se optarem pela segunda opção, precisam estar preparados pra arcar com todas as consequências. E aí, como vai ser?

Olhei de canto de olho para meu irmão e ele fez um sinal com a sobrancelha que eu conhecia muito bem: aquele gesto significava bater em retirada.

— Desculpa, moça, a gente acabou de se conhecer, mas eu vou precisar recusar essa sua oferta generosa — eu disse, procurando distraí-la. — Não tô muito a fim de morrer hoje. Fica pra próxima, tá bom?

Antes que ela pudesse esboçar qualquer reação à minha resposta, não perdi tempo e iniciei minha transformação em lobo, ignorando o fato de que eu ainda trajava roupas humanas. Minhas vestimentas se rasgaram no processo, mas, tirando isso, consegui me transformar sem grandes dificuldades, o que indicava que estava tudo certo com a minha forma animal, para o meu alívio.

Benjamin também não ficou parado e logo completou sua própria metamorfose. Após ambos nos transformarmos, nos separamos e corremos com todas as nossas forças, com a intenção de chegar até o jipe de Davi. O melhor que podíamos fazer naquele momento era entrar no carro e fugir dali o mais rápido possível; um embate direto com um membro do Conselho dos Sete certamente não terminaria bem, então, por ora, o mais acertado seria tentar ganhar algum tempo.

— Por que vocês precisam me dar tanto trabalho?? — ouvi Enoe perguntar, frustrada, às nossas costas. Imediatamente após aquelas palavras serem ditas, a tempestade de areia recomeçou com força total e, dessa vez, eu tive certeza de que aquela loba era a responsável por tal alteração climática, muito provavelmente graças aos poderes da sua relíquia.

O Clube da Lua e a Noite Sem Fim (Livro 3 - em andamento)Onde histórias criam vida. Descubra agora