26. A vez em que um jovem lobo conheceu seus ancestrais

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Sob a mira dos rifles, eu e Benjamin retornamos à nossa forma humana e nos vestimos. Em seguida, os dois funcionários do parque algemaram nossas mãos atrás das nossas costas e nos empurraram em direção a uma picape de cabine dupla, que estava parada um pouco mais adiante, do lado de fora da caverna.

— Pra onde vocês estão levando a gente? — Benjamin perguntou, apreensivo.

— Estamos voltando para a entrada do parque — o guia respondeu. — Precisamos estar protegidos quando a nevasca chegar.

— Vocês não têm nenhum pingo de juízo nessa cabeça oca de vocês? — foi a vez do motorista do ônibus dizer, com um pouco menos de paciência. — Que ideia absurda foi essa de montar acampamento dentro de uma caverna, quando vocês foram avisados sobre a nevasca???

— Nós tínhamos uma fogueira pra nos manter aquecidos... — tentei justificar.

— Vocês não conhecem a neve — o guia resmungou. — Aposto que é a primeira vez que visitam um lugar tão frio. Aquela fogueira não ia servir de nada. Os dois iam acabar morrendo de hipotermia durante a madrugada. Ainda bem que encontramos vocês a tempo!

Depois daquela reprimenda, achei melhor ficar de boca fechada enquanto fazíamos o trajeto de volta até a entrada do parque. Assim que chegamos lá, fomos conduzidos para um chalé de madeira, que muito provavelmente deveria servir como alojamento para os funcionários do parque.

— Vocês não podem nos manter presos aqui — Benjamin disse, tentando manter a calma. — Somos dois turistas brasileiros, só estávamos explorando a região...

— Pode cortar esse papo furado, filho — interrompeu o motorista do ônibus. — Nós vimos vocês transformados. E sabemos muito bem que dois lobos adultos não apareceriam aqui por acaso. Não precisam agir como se nós não tivéssemos ideia do que vocês vieram fazer no parque.

— E, sendo vocês turistas ou não, nada muda o fato de que desrespeitaram as regras do parque e invadiram locais onde a entrada dos dois não foi autorizada — emendou o guia, ríspido. — Isso é o suficiente pra deportar vocês de volta para o Brasil.

— Não, por favor, não façam isso! — eu apelei, apavorado com aquela possibilidade. — Vocês não fazem ideia de tudo o que a gente passou pra chegar até aqui... Não mande a gente embora! Nós prometemos tomar cuidado se vocês nos deixarem ficar!

— Isso está fora de cogitação — resmungou o motorista. — Amanhã cedo, assim que for seguro sairmos, vou colocar os dois naquele ônibus e vamos dar o fora daqui, com destino ao aeroporto mais próximo. Vocês não darão mais um passo sequer dentro deste parque.

— Sinto muito, mas a gente vai entrar no parque sim — Benjamin respondeu, em um tom tão sério que me causou arrepios. — A menos que vocês enfiem uma bala no meio das nossas testas, nós não vamos desistir enquanto não encontrarmos a pessoa que estamos procurando.

— Não há ninguém nessas terras esperando por vocês, rapazes — rebateu o guia. — Desistam de uma vez.

— Agora são vocês que estão menosprezando a nossa inteligência — Ben replicou, sarcástico. — Nós sabemos que esse parque é a morada dos Lobos Anciãos. E não vamos embora enquanto não falarmos com um deles.

— Isso não vai acontecer, já disse! — o motorista insistiu. — Amanhã cedo vocês vão embora, está decidido!

— Vocês não têm o direito de fazer isso! — eu protestei. — Ele é nosso avô, sangue do nosso sangue! Nós precisamos falar com ele!

Aquela informação nova pareceu abalar um pouco da confiança que a dupla vinha demonstrando até então. Os dois homens se entreolharam, numa troca silenciosa, até que o motorista tentou desconversar, mais uma vez.

O Clube da Lua e a Noite Sem Fim (Livro 3 - em andamento)Onde histórias criam vida. Descubra agora