O Clube da Lua e a Noite Sem Fim (Livro 3 - em andamento)

24. A vez em que um jovem lobo atravessou céus estrangeiros

[Nota do autor: Para quem estiver curioso para conhecer os músicos que inspiraram a criação dos personagens vampiros Tatianna e seus três filhos, veja o clipe acima; seguem as referências (os nomes são esses mesmos): Tatiana no vocal, Roman na guitarra (cabelo curto, franja), Eugene no baixo (cabelo comprido preso) e Vlad na bateria]

A pista de pouso ficava num lugar mais afastado da área urbana de Buenos Aires e, certamente, já devia ter visto dias melhores em seu passado. Agora, estava em um estado decadente, e o olhar que Benjamin me lançou tão logo chegamos ali me fez refletir se, de fato, havia sido mesmo uma boa ideia fazer negócios com um dos funcionários daquele local.

Assim que estacionamos, um homem moreno, magro e de aparência frágil veio ao nosso encontro, acenando. Aquele era Javier, o piloto que tinha se oferecido para nos levar até o Chile em troca do jipe de Davi.

— Buenas! — ele nos cumprimentou, tão logo descemos do carro. — Prontos pra decolar?

Javier tinha alguns amigos brasileiros, conforme ele mesmo me contara da primeira vez em que nos falamos, então conseguíamos nos comunicar relativamente bem usando nosso "portunhol" improvisado.

— Acredito que sim... — Benjamin enfim respondeu, ressabiado. — Meu irmão me disse que você pode nos levar até Puerto Natales, isso é mesmo verdade?

— Claro que sim, hermano! — Javier confirmou, com um sorriso largo, exibindo um canino de ouro no lado direito da sua boca. — Em troca de uma belezura como essa que vocês dirigem, yo seria capaz de ir até mais longe que o Chile!

— E o seu avião, ele está em dia? — meu irmão continuou interrogando, ainda sem se dar por convencido. — É uma longa distância daqui de Buenos Aires até Puerto Natales, ele dá conta de chegar lá sem problemas?

— Minha gaivota já é um pouco velhinha e não tem a mesma autonomia de quando era nova, mas ela dá conta do recado sim, pode ficar tranquilo — Javier explicou, orgulhoso. — Vamos precisar fazer uma pausa pra abastecer no meio do caminho, ela só consegue voar quatro horas sem interrupção. Mas não vamos levar mais do que um dia pra chegar até o destino de vocês, isso yo garanto!

— A gente pode primeiro dar uma olhada no avião, por favor? — eu pedi, receoso.

— Claro, claro, venham por aqui! — ele instruiu, dando as costas para nós e seguindo rumo a um dos galpões que existiam no local. No caminho até lá, não pude deixar de reparar em alguns homens muito mal encarados que estavam espalhados pela pista de pouso, papeando e fumando cigarros de palha. Benjamin também percebeu, e a expressão dele, ao notar aquilo, não era das melhores.

— Vocês trabalham exatamente com o quê por aqui? — indagou Ben, enquanto inspecionava o local atentamente com o olhar.

— No passado, esse lugar foi um aeroclube — Javier explicou. — As pessoas vinham até aqui para aprender mais sobre aviões e fazer aulas de pilotagem. Mas o antigo dono faleceu e deixou pra trás um monte de dívidas... Então a pista acabou falindo e fechando. A pessoa que comprou o lugar deixou que a gente continuasse utilizando os galpões e os equipamentos e, em troca, nós trabalhamos transportando carga pra esse novo proprietário.

— E que tipo de carga vocês carregam, exatamente? — eu quis saber, curioso.

— Sua mamacita nunca te ensinou que é feio bisbilhotar nos assuntos dos adultos, hermanito? — Javier respondeu, em tom bem-humorado, mas que deixava escapar um fundo de seriedade. — Tem certas coisas que é melhor não ficar sabendo, para o seu próprio bem, entiende? — ele me disse, dando uma piscadela. — Mas, só pra vocês não ficarem nervosos e desistirem do negócio, vou ser sincero e dizer que eu e os outros rapazes ajudamos a transportar algumas substâncias que trazem... hum, alegria a quem está disposto a pagar por elas... Acho que isso é o bastante, não é?