Acordei atrasado. E pela primeira vez, não me importei. Meu corpo parecia pesar uma tonelada, metade exaustão, metade culpa.
Eu não fazia ideia do que precisava; talvez café, talvez eu precisasse abrir a janela para que o ar das sete, oito ou talvez nove da manhã entre no quarto para me reavivar. Ou talvez a melhor opção para mim seria apenas ficar deitado e remoendo o que aconteceu ontem. Não só a parte em que Vinci me tocou e eu pensei que fosse derreter da cintura para baixo e pegar fogo da cintura para cima. Parecia impossível que ele me fizesse sentir essas coisas, era tão especifico, o calor, a pressão. Meus pensamentos. A mão dele. eu não conseguia parar de pensar que depois disso eu descobri que ele é gay e que um dia, não sei quando pela foto, já teve orgulho de mostrar isso. A minha culpa se resume naquela foto. Agora me parece estritamente errado o que fiz, mesmo que eu repita: É apenas um perfil, pare com isso. Aliás, está liberado para todo mundo ver!
Mas do que isso adiantava? A culpa sumia por cinco minutos e depois voltava com cinco vezes mais força e abalava algo dentro de mim. Eu poderia perguntar a ele, mas não sei como chegar a este assunto, direta ou indiretamente. Talvez eu esteja desejando saber sobre ele para saber um pouco sobre mim.
Há um caminho até à conversa com Vinci e eu queria acesso.
Mas era um acesso perigoso. Algo me diz para seguir em frente — aquelas exatas palavras de culpa — mas algo ainda maior me dizia para parar agora mesmo porque eu não teria coragem — e esse lado tinha a voz do meu pai.
É difícil não saber o que quero e mesmo assim, saber.
Eu sou tão complicado que em alguns dias — como hoje — só quero me isolar para que todos não precisem ver minha confusão em forma de palavras, ações e ideias. Eu era confuso em tudo, se ainda pessoas ao meu lado, eu agradecia a elas o quanto quisessem por isso.
As horas se passaram e consegui tirar mais um cochilo tranquilo. Não me importei se até Linda notasse minha ausência nas aulas, ou se os professores fossem relatar isso a ela até a hora do jantar. Só coloquei a cabeça no travesseiro, fechei os olhos e desejei acordar com uma resposta.
Só que, quando despertei, foi com uma batida na porta. Leve, quase pensei que estivesse ouvindo coisas. E meu coração disparou ao pensar que a situação se repetiu: Será que Vinci havia esquecido o cartão dele de novo? Abri a porta e percebi que não era Vinci ali. Era Fênix, ele segurava um carregador de celular preto.
— Sua encomenda.
— Obrigado — grasnei.
Ele pareceu feliz por alguma coisa.
— Precisa de alguma coisa? — Havia uma sugestão explicita na sua voz.
Algo que parecia sujo, grande e mesmo assim, nada complicado para ele.
O olhei com interesse.
— O que quer dizer?
— Precisa de algo para se manter acordado? Ou melhorar nas aulas?
Isso já estava passando dos limites.
— Não. Só o carregador mesmo.
Fênix deu de ombros e foi um movimento nojento, porque ouvi alguma coisa nele estalar. Ele não parecia ser uma pessoa vertebrada, parecia feito de borracha e sua pele era oleosa.
— Sabe que não pode contar a ninguém, não é?
— Sei. Valeu — fechei a porta e fiquei sozinho, finalmente.
Eu não queria ser ignorante com Fênix, mas eu podia, afinal, eu paguei por isso e não queria que ele ficasse batendo na minha porta para falar das coisinhas que vende. Definitivamente, não.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Entrelinhas (Romance Gay)
RomanceAtlas tem esse nome por causa do seu pai. Aliás, seu pai está comandando tudo em sua vida, até mesmo em seus estudos. Atlas foi parar, de um dia para o outro, na Katharine, uma escola de elite que se mostra tão perigosa quanto mesquinha. Há segredos...