Selvático

Trinta e sete

Alana

— Alana... Filha.

Me viro devagar e contra a minha vontade. Eu e meu pai não havíamos trocado uma palavra durante todo o caminho. Os solavancos no carro me deixaram com dor de cabeça, e apesar de cansada não consegui dormir, estava preocupada demais.

— Sim? — pergunto estranhando seu tom de voz.

— Preciso te contar uma coisa.

Francamente. Tento não revirar os olhos mas duvido que consegui. Não estava com paciência para qualquer tipo de ladainha que ele queira me dizer agora. Que outro comentário fantástico será que ele tinha a fazer sobre mim ou meu companheiro?

— Pode esperar? Estou cansada.

— Acho melhor não, quando contei a Azriel ele saiu imediatamente daqui e voltou direto pro clã — ele responde.

Puts. O que você fez? Será que meu """"noivo"""" me rejeitou e ele tinha me prometido em casamento a outra pessoa? Seja lá o que for deve ser sério.

— Okay. Pode falar — digo incerta.

— É sobre sua mãe — ele começa de cabeça baixa — Depois que você nasceu ela ficou diferente, mal falava comigo. Podíamos não ter sido companheiros mas eu a amava.

Ele hesita em continuar, como se estivesse reunindo coragem para continuar. Ele nunca tinha falado da minha mãe. Sempre ignorou todas as minhas perguntas. O pouco que eu sei sobre ela veio de empregados da casa, que apenas disseram o quão gentil ela era. O pensamento me deixa tonta. Minha dor de cabeça parece piorar. Aonde ele queria chegar com esse assunto?

— Na época sua mãe me contou que vinha tendo sonhos, o que é proíbido. Um dia eu encontrei uma carta de despedida dela, dizendo que havia encontrado o companheiro por meio de um sonho. Ela saiu do clã, nos abandonou. Achei que ela tivesse ido embora pra sempre, mas ela voltou no dia seguinte. Achei que fosse estar arrependida mas ela voltou apenas pra buscar você.

Me sinto incrivelmente desconfortável com aquela revelação, mas o pior parecia estar por vir.

— Eu a denunciei para o conselho do clã, eles cortaram suas asas e a expulsaram. Sei que foi errado, mas eu fiz o que era melhor pra você. Esta dimensão é perigosa demais, ela não tinha a menor condição de achar o companheiro e ainda mais cuidar de você sozinha.

Ainda não consigo dizer nada. Um misto de raiva e confusão me invade. Eu não sabia ao certo como me sentir. Demora alguns segundos até que sou consumida pela dúvida. Por que agora depois de tantos anos? Será que a culpa finalmente pesou em sua consciência?

— Por que nunca me falou disso? — pergunto.

— Pra te proteger, você não ia gostar de saber que ela te deixou pra ficar com outra pessoa, foi mais fácil te contar que ela morreu.

— Mas ela voltou por mim, não foi? — minha voz estava chorosa, mas meus olhos estavam secos. Não tinha forças pra isso agora.

— Vocês não durariam um dia aqui fora, eu não ia ficar de braços cruzados e deixar ela te levar — meu pai se defende — Quando o clã quis te expulsar eu entrei em pânico, achei que fossem fazer o mesmo com você mas decidiram te dar uma segunda chance. Por favor, filha, não desperdice essa chance com alguém que você mal conhece.