Quarenta e nove

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Alana

— Por favor, levanta... Você tem que levantar — beijo sua testa, mas meus lábios tremiam.

Estava sentada no chão com ele, sua cabeça repousava no meu colo e eu tentava falar com ele na esperança de que ele me ouvisse. Nunca pensei que o veria desse jeito, o corte nele era profundo mas ao menos havia parado de sangrar.

— Você tem que levantar, tem que se curar... Por favor. — mesmo sussurrando meu tom era de desespero.

— Ele não vai se curar — o deus sentado na nossa frente responde sem emoção — Não sabe como se curar disso, é uma adaga feita especialmente para nós.

Meus dentes cerram imediatamente ao olhar de volta para ele. Sua semelhança com Killian fazia meu sangue ferver. Rle não parecia sentir nenhum remorso, nem nada. Era um psicopata maligno para dizer o mínimo. Mas mesmo assim havia algo que o parecia incomodar quando olhava pra Killian. Talvez o pensamento de que ele se via ali também, inconsciente e ferido no chão frio. Afinal, eles eram idênticos.

— O que está fazendo com ele? — pergunto.

Tiordan não responde imediatamente, e após alguns segundos ele se levanta da cadeira.

— Esperando ele acordar, é claro. Eu não vou matá-lo agora, é a minha melhor criação por mais teimoso e desobediente que seja. Não vou fazer isso antes dele devolver o que roubou.

— Killian não roubou nada, você deu a ele — rebato com a voz trêmula diante desse maníaco.

— Sim, em troca de lealdade, mas aí você apareceu e estragou tudo... Felizmente pra você eu descobri que te matar talvez não fosse o melhor método. — ele passa por mim e me dá um tapinha nas costas como se fosse algo legal e natural de se dizer.

O deus some dentro da casa e me deixa sozinha com meu companheiro que nem se movia. Me aproximo dele e encosto a cabeça em seu peito para ouvir seu coração, os batimentos incrivelmente lentos, nem parecia que estava batendo, mas até onde eu sabia isso era comum pra ele. Minhas lágrimas tinham molhado o meu rosto e o de Killian, eu o enxugo com as mãos e continuo a falar.

— Você tem que acordar, Killian, temos que sair daqui.

Não sei dizer há quanto tempo estamos aqui, só sei que estava abraçando meu companheiro após a bruxa me soltar e no segundo seguinte eu estava aqui com aquele monstro. Killian surgiu desacordado no chão minutos depois que cheguei. O clima era quente e tropical nessa dimensão maluca, mas isso não ia ajudar seu corte a melhorar. Eu continuo fazendo pressão até que tenho uma ideia e procuro algo para transformar. Vejo uma pedrinha solta no chão de azulejo branco e uso minha magia para modificar o objeto. Consigo fazer alguns cubinhos de gelo e rasgo um pedaço da saia do meu vestido. Enrolo o gelo no tecido fino e coloco sobre o ferimento. Minha magia era patética em comparação com a dele. Quando Killian acordasse ele poderia abrir um portal para nos levar dali. Não sabia quanto tempo isso levaria, mas eu ficaria aqui com ele.

Meu companheiro continuou pálido e imóvel, e eu continuei acariciando seu rosto. Sabia que ele voltaria. Tiordan não o traria aqui pra deixá-lo morrer, ele mesmo havia dito. Mas ao mesmo tempo estou preocupada com o que o deus vai tentar fazer dessa vez. E falando nele, o deus retorna com o semblante relaxado.

— Por que não pode simplesmente nos deixar em paz? — estou com tanto ódio que seria capaz de tentar matá-lo com as próprias mãos se não fossem as circunstâncias — Não fizemos nada pra você, você causou isso tudo sozinho.

O deus me dá um sorriso cínico, como se eu tivesse acabado de dizer algo muito engraçado.

— Sabe Alana, até mesmo os mais selvagens dos crocodilos tem personalidade. Dentre os machos tem duas que se destacam: Aqueles mais pacíficos que evitam conflito a todo custo e os valentões que vivem para desafiar e dominar, e esses são sempre os maiores e mais agressivos. Veja bem, Killian estava dominado sob o meu poder, e mesmo longe em uma dimensão onde eu não poderia alcança-lo ele ainda obedecia meus comandos, portanto meu poder estava a salvo com ele... Isso até você aparecer.

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