O outro lado do amor

Capítulo 38 ☘

Eu saí do quarto e me dirigi até o meu. Sentei-me na cama desnorteado, sem entender as minhas próprias atitudes. Eu deveria ter falado para ela, não? E não fugido como um covarde. Mas do que adiantaria se ela me vê de uma forma monstruosa, e com razão, óbvio! Depois de tê-la tirado daquele lugar, eu comecei a dirigir e até pensei em levá-la para a casa de Ricardo, mas preferi trazê-la para a minha. Eu sabia que ela não iria gostar assim que acordasse, mas era o mínimo que eu poderia fazer por ela. Subi os degraus e a depositei na cama no quarto de hóspedes que nunca recebeu ou recebia hóspedes. Ela já tinha adormecido e o efeito da droga ainda estava forte, então só a deixei dormindo e fiquei velando o seu sono a noite inteira. Ela respirava calmamente e dormia fazendo biquinho, até que bastante fofo. Em um momento da noite eu acariciei sua face de uma forma carinhosa, mas me afastei rapidamente. Eu esperava sim que ela ficasse com raiva ao me ver, mas não que pensasse determinadas coisas ao meu respeito. Principalmente que eu me aproveitaria da situação. Tudo bem que ela não se lembrava de nada, mas me acusar de ser um abusador foi o ápice. E o pior é que por mais esclarecido que tenha sido o assunto, suas palavras não saíam da minha cabeça. Foi nítido o ódio que ainda nutria por mim e foi mais nítido ainda o quanto eu não tenho nenhuma chance com ela. Ela sentia desprezo por mim e eu me senti mal com suas palavras. Pois me recordei das inumeras vezes em que ela deve ter se sentido assim. Eu fiz muito mal à ela, e lhe falei muitas merdas e com certeza ela se lembra de tudo, sempre se lembrará. Não importa o que eu faça, ou o tanto que eu tente, ela nunca verá mudança em mim. Sacudi a cabeça e afastei esses pensamentos. Era como se eu tivesse a opção de desistir, mas eu não tenho. Principalmente depois de olhar em seu rosto agora a pouco e enxergar algo diferente, jamais ainda visto.

_Eu não vou desistir tão fácil, menina! - Me levantei e peguei o meu celular para fazer uma ligação

O telefone tocou até cair na caixa postal, então eu tentei novamente e revirei os olhos pela demora e também por saber a situação que ele deveria se encontrar.

_Que saco, o que você quer Cristopher? - Atendeu de mal humor e eu sorri

_Bom dia, senhor Alencar. O atrapalho em algo? - Usei o seu tom sarcástico de quando essa situação era o contrário

_Não é hora para o seu sarcasmo! - É, não era mesmo

_Eu só estou te ligando para informar que a sua protegida está aqui em casa! - Ouvi Ricardo dar um grito histérico

_Daqui a pouco estou aí! - Desligou e eu fui vê-la em seu quarto

Ela estava dormindo, então a deixei quietinha ali para descansar, pois ela precisava. Desci e ouvi a campanhia tocar, realmente ele foi rápido mesmo.
Abri a porta e ele já entrou revistando a casa e me ameaçando.

_Aonde ela está? O que fez com ela? - Se aproximou tentando me intimidar - Fale!

_Ela está no quarto de hóspedes. - Ele fez menção de ir lá mas o interrompi - Espere, você precisa saber de algumas coisas antes...

Seu olhar se infureceu e ele veio para cima de mim com extrema rapidez. Mas afinal, porque as pessoas sempre pensam esse tipo de coisa nessa situação?

_Se você teve a coragem de... - Revirei os olhos e saí de sua frente

_A situação é muito pior, Ricardo. - Me virei e ele me olhava desconfiado

Contei tudo da noite anterior à ele e seu semblante mudou radicalmente. Agora ele estava mais para decepcionado e culpado para enfurecido. Ele manusiva a cabeça diversas vezes e eu sabia o que ele estava sentindo. Ela se culpava por não tê-la protegido e se o pior acontecesse, ele jamais se perdoaria. Por mais que não fôssemos mais amigos, eu me senti na obrigação de o amparar naquele momento.

_Você não teve culpa, e está tudo bem agora. - Coloquei a mão em seus ombros

_Eu deveria protegê-la... - Seus olhos começaram a se formar lágrimas

_Não se preocupe. O pior foi evitado. - Suspirei e ele tornou a me olhar

_Nunca terei palavras suficientes para te agradecer por isso. - Ele limpou a lágrima solitária

_Já fui recompensado, acredite.

_Espero que algum dia ela te perdoe. É nítido o quanto você está tentando.

_Espero que algum dia eu também consiga me perdoar. - Dei de ombros e ele deu um riso fraco

_Posso vê-la? - Acenei com a cabeça e ele subiu

Fui a cozinha comer algo, pois já estava com fome. Eu apenas fui a padaria comprar algo para ele e esqueci até de mim. Resultado de uma noite em claro. Comi um sanduíche e subi para o meu quarto, mas parei ao ouvir suas vozes baixinho. Olhei pela fresta da porta e eles conversavam. Ricardo estava sentado na cama e segurava as suas mãos. E ela sorria alegre a sua visita. Sorriso que nunca foi direcionado à mim, por sinal. Me entristeci e saí dali, não quis se intrometido ouvindo a conversa deles. Me deitei e fechei os olhos. A imagem deles juntos me veio a mente, e eu comecei a me questionar. Será que ela gosta dele? Isso é algo bem provável, ele sempre foi bom para ela. E talvez ele merecesse ficar com ela, merecesse todo o amor que ela transparece sentir por ele e para mim sobraria apenas sua indiferença. Senti meu peito doer ao pensar nisso e, porra, como é ruim ser rejeitado. Abri os olhos e sacudi a cabeça, mas os pensamentos insistiam em estar ali. Eu não pensei que essa dor fosse tão real, pensava que era só invenção das pessoas, mas me enganei. Esse desprezo incomoda, dói de uma forma que eu já me sentia sufocado. E eu só soube agora o quanto era ruim. O quanto as minhas palavras machuraram, as minhas atitudes feriram e a minha estupidez a afastou de mim. Mas eu merecia. Mereço seu ódio, e também nunca merecerei tê-la. Talvez fosse melhor deixá-la em paz e parar de insistir. Ela encontraria alguém melhor, alguém digno dela. Talvez fosse Ricardo ou até outro, mas eu, com toda certeza, não sou esse homem. Suspurei e fechei os olhos em uma tentativa de ser pego pelo sono e desacelerar os pensamentos. Acordo e percebo que consegui descansar um pouco, mas sou tomado por gritos e me levanto rapidamente desesperado e vou ao seu quarto. Quando entro me deparo com uma cena impactante. Só consegui ficar paralisado, sem saber o que fazer. O meu corpo e cérebro não me obedeciam e eu fiz uma tremenda força para abrir a boca e me pronunciar

_O que está acontecendo aqui?

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