Emma Swan
Esperei o tempo de Regina para que ela pudesse se recompor. Chorar e desabafar pareceram ter feito muito bem a ela, não a vi com o semblante tão sereno assim desde ontem de manhã.
— Você não vai à mansão Farrah hoje?
— Não, Emma. Preciso de um tempo para me recuperar. Ela passa os dedos pelo rosto, termina de limpar as lágrimas e começa a ajeitar as coisas na cozinha.
— Ótimo. Se arrume e esteja pronta em vinte minutos. Avalio o relógio, pego Henry no colo, mas ele se debate para descer.
— Me arrumar para quê? Ouço Regina perguntar atrás de mim.
— Fomigas. Henry estende os bracinhos e começa a balançá-los sem parar, conforme vamos saindo da casa de Regina.
— Vamos levar as formigas para casa, filho. Todas elas.
Regina Mills
Eu não pude acreditar. De verdade. Eu já havia entendido que para Emma tudo era mais fácil. Afinal de contas, por ter dinheiro, contatos e influência, ela conseguia tudo o que queria, na hora que queria.
Não foi diferente com o jatinho que nos trouxe para Nova York. Eu nem acreditei! Quando estávamos sobrevoando o espaço aéreo da minha terra natal, meu coração já bateu diferente. Claro que Miami possuía um clima mais agradável e limpo que Nova York, mas ali eu sentia que tinha um refúgio impenetrável. Um lugar só meu e que eu poderia descansar a cabeça. O primeiro momento foi de negação total. Eu não queria vir, não conseguia entender como passar algumas horas aqui poderiam me ajudar...
— Regina?! Minha mãe abriu a porta, afoita e se jogou em meus braços quando me viu. Antes de chegarmos em minha casa, avisei a Emma que minha mãe, avó e irmãos, moravam em um lugar modesto no Brooklyn. Um lugar bem diferente dos que ela deve ter frequentado durante a vida. Não havia nada chique, caro e requintado por ali. Mas haviam quadros cheios de fotos postos na parede, vasos baratos com plantas comuns e janelas que permitiam a entrada de luz, poeira e fumaça da bela e inconfundível Nova York.
— Mamãe! Vem ver quem veio nos visitar! Minha mãe grita para o corredor.
— Aqui eles gritam bastante. Preciso pontuar para Emma. Ela acena e imediatamente coloca os abafadores de ouvidos no filho, que ainda estava vestido de formiga.
— Não estou vendo as fomigas. Henry reclama para a mãe.
— Elas devem estar aí, em algum lugar. Emma se abaixa e começa a explicar ao pequeno alguma coisa. A minha avó aperta os óculos gigantes contra o rosto e me abraça. Fico sufocada no meio das duas mulheres, Cora, minha mãe, já não me solta. Está grudada em mim desde o momento em que me viu. E a minha avó Helena, agora, acrescenta o peso para me deixar sem ar. E quer saber? Não há sensação melhor! Demoramos incontáveis minutos nesse abraço, choramos juntas e limpamos nossas próprias lágrimas. Emma e Henry assistem a tudo aquilo, quietinhos.
— Como estão as coisas em Miami, filha?
— Estão bem... dentro do possível... tudo vai ficar bem... eu espero...
— Vamos, entre! Me conte tudo sobre Miami, as praias, a sua loja e a doida da Zelena! Minha avó sai sacudindo os braços quando entra, toda festiva.
— Quem são eles, Regina Maria? Minha mãe fita Emma e Henry. Mais Emma do que Henry, é claro.
Emma é o tipo de mulher que quando se põe os olhos nela, não dá mais vontade de tirar. Ela é alta, charmosa, se veste bem, é cheirosa, e acima de tudo e mais importante: tem um coração de ouro. É um show de vizinha.
— Mãe, esse é a Emma, minha vizinha. Eu os apresento. Emma estende a mão e a minha mãe a aperta. E demora para soltar. Só consegue ficar balançando, meio hipnotizada.
— E esse aqui é o pequeno Henry, ele não gosta que estranhos toquem nele. Advirto logo, já que ela estendeu a mão e o pequeno só encostou o nariz para cheirar.
— Henry... bem... como vou explicar...
— O meu filho é autista. Emma sorri de um jeito gentil.
— Ele não é de fazer bagunça, mas ele vive no próprio mundo dele. Nós só viemos trazer a sua filha em segurança e voltaremos para buscá-la em breve. Aproveitem o tempo juntas!
— Mas vocês acabaram de chegar! Minha mãe fica ofendida.
— Como assim já vão embora? Não vão sequer entrar para tomar café?
— Café não. Henry mexe o indicador em sinal negativo.
— Tem fomigas?
— Formigas? Minha mãe se vira para mim, os olhos arregalados.
— Só digamos que o Henry tem certo fascínio por formigas, mãe. Ele gosta de observá-las.
— Entendo. Ela analisa o figurino dele.
— Na verdade, Henry, têm formigas por toda parte, nessa casa! E cupins! Meu Deus do céu, tomara que o teto não caia em cima de nossas cabeças! Acabamos os três rindo e Henry muito sério, a testa franzida. Ele dá um passo à frente.
— Eu quero ver fomigas. Ele cruza os braços.
— Ah! Tenho certeza que posso te mostrar, vem ver! Ela o chama com a mão e ele instantaneamente vai, segura na mão dela e entra, como se fossem velhos conhecidos. Fico parada assistindo os dois entrarem e Emma se posiciona ao meu lado.
— Ele se sente em casa sempre que tem formigas no lugar, é? Reflito.
— Todos nós nos sentimos em casa quando tem algo que amamos por lá. Emma dá a resposta perfeita.
— Obrigada por me trazer. Sei que fui muito firme no início e você praticamente precisou me arrancar do chão para que eu entrasse no carro e fôssemos pegar o jatinho... Sinto suas mãos em meu ombro, subindo cuidadosamente até chegar em meu pescoço, onde ela acaricia devagar.
— Regina, eu quero o seu bem. E eu sei que não há lugar melhor para se recuperar do que com a sua família.
— Novamente, muito obrigada.
— Não me agradeça. Só aproveite cada segundo perto deles, pois voltaremos para Miami de madrugada. Sei que não parece muito tempo, mas... nunca é, Regina. Nunca é. Assinto e entro dentro de casa. Ao menos, eu tento. Sou impedida pela mão dela e rapidamente sinto seu corpo avançar até mim. Emma me beija com tanta ternura que não importa mais se estou em Miami ou Nova York. Sinto que há algo especial em seus braços, há algo que me aquece e me deixa confortável em seu beijo. Nossos lábios, quando se tocam, acendem uma paixão avassaladora em mim. Sinto-me, enfim, no lugar certo, na hora certa, com a pessoa certa. E no abraço que somos embaladas uma a outra e na troca de olhares que se seguem quando nos afastamos cuidadosamente, eu sinto meu coração desmanchar até que o corpo fique tenso e suave ao mesmo tempo.
— Regina Maria! A minha avó grita de lá de dentro.
— Já vou! Grito de volta. Aliso o peito de Emma e ela vai me soltando aos poucos, parece que não consegue me deixar ir de uma vez. Sua mão vai ficando leve no aperto até que eu sinto que posso simplesmente escorregar e ir. Entro correndo, praticamente desesperada, e ainda tenho tempo de observar Emma entrando devagar. Ela fecha a porta e começa a fitar as inúmeras fotografias na parede. Henry está muito ocupado vendo as formigas em uma rachadura no chão e a minha avó agora não para de perguntar onde conheci essa gostosona. Sinto que já estou bem melhor.
Emma Swan
Regina parecia outra pessoa agora. Nem de longe seu choro ao reencontrar sua família lembrava o choro de frustração, ódio e rancor que vi em sua casa. Não importava o quanto eu tentasse explicar que ela precisava desse momento. Algumas coisas na vida, mesmo quando entendidas, não fazem
sentido algum. É preciso sentir. É preciso deixar a pele, o perfume, as lembranças e o afago falarem por si. E eu me emocionei, do meu jeito mais fechado, ao observar tudo aquilo.
— Há quanto tempo vocês não se viam? Pergunto para Cora, a mãe de Regina.
— Desde que ela foi para Miami. Ela não precisa pensar muito.
— Dois anos?! Ela assente.
— Acho que você vai me entender quando digo que: não consigo me imaginar dois anos longe do Henry. Não nesse momento.
— É completamente compreensível, Emma. E sinto em te dizer que... para mim, como mãe, ela sempre vai ser o meu bebê. Não importa o quanto ela cresça, amadureça, crie sua própria vida... eu ainda me preocupo. Ainda me pergunto se ela teve um bom dia, se está comendo corretamente e se está feliz e satisfeita.
— Isso não passa? Encosto os cotovelos nos joelhos e apoio o queixo nos punhos fechados. Cora ri e mostra que não, com a cabeça.
— Voltamos! Regina, a avó e Henry retornam da cozinha.
— O que vocês duas estão conversando? Se juntaram para falar mal de mim, é?
— Bastante! Cora gargalha.
— Você conhece Nova York, Emma?
— Sim, na verdade morei aqui por um tempo, com o Henry. A minha família mora aqui.
— Sua família não mora em Miami? Regina se senta ao lado da avó.
— A família que eu escolhi para mim, mora aqui. Explico.
— A família que me aceita, me ama e me apoia.
— Para que serve exatamente a família, senão para isso? Cora franze o cenho e me analisa.
— Penso o mesmo. Temos mais em comum do que imaginei. Aponto para ela.
— Vocês nunca foram à Miami? Não conhecem as praias?
— Meu filho, eu não conheço nem Nova York direito! A avó de Regina se contorce na cadeira.
— A vida é assim, você passa metade dela ralando sem parar, trabalhando para gente que faz coisa importante, sem saber o que fazem, exatamente... e em outro momento você só quer ficar em casa descansando, por cada dia, semana e mês que trabalhou.
— Umas férias não cairiam bem? Pergunto.
— Férias? Deitar na minha cama é o que chamo de férias!
— Nós não tivemos muitas oportunidades de viajar... Cora explica.
— Após a minha separação, principalmente, o meu marido levou tudo. E precisei reconstruir tudo do zero, com três crianças para criar. Digamos que agora a vida entrou nos eixos, mas... não posso simplesmente pensar “vou para Miami”. Preciso planejar muito para conseguir tal feito.
— É? Fico com a coluna ereta e estendo a mão.
— Me dá o seu celular. Cora acha o pedido inusitado, mas tira o celular do bolso e me entrega.
— Esse é o meu número. Coloco o contato na agenda e ligo para mim, através do aparelho, para salvá-lo também.
— E esse é o número de um homem chamado David Booth, ele é o meu tio. E esse é da minha tia,
Ella Booth. Sempre que precisar de algo você pode ligar e dizer que é da família, pode citar o meu nome e vai ter o que quiser.
— Como assim?
— Quer conhecer Miami? Sou curta e direta.
— Bem... eu...
— Quer ver as praias, senhora Mills? Me dirijo a Helena, a avó de Regina.
— Essa moça faz as minhas pernas tremerem. Ela sussurra para Regina.
— As minhas também, vó, as minhas também. Regina retruca.
— Podem voltar conosco. Vão conhecer a Sweet Show, as melhores praias, poder passar mais tempo com sua filha... As mulheres se entreolham, curiosas com a proposta. E eu entendo perfeitamente que se sintam um tanto assustadas com a facilidade que é a minha vida. Mas se o meu dinheiro não serve para isso, para que servirá? Eu o tenho para que em momentos assim eu possa ajudar quem eu realmente me importo.
— Está falando sério? Cora ainda não acredita.
— A casa da Regina é um tanto quanto pequena para recebê-las, mas eu garanto que se hospedarão em um lugar grande e confortável.
— Eu sempre quis ir à praia, Cora. Helena a cutuca.
— Ela só está sendo gentil... Cora me dá um sorriso fraco. Levanto-me e peço que elas se levantem também.
— Documentos, senhoras. Documentos, roupas leves e o que mais quiserem levar. Anuncio.
— Ela está falando sério? Helena volta a se contorcer na cadeira e puxa Regina pela roupa.
— É sério?
— Vocês querem ir? Sei que chegamos há pouco, mas...
— Não me insultem! Helena se levanta e arranca a filha do sofá.
— Eu nasci em Nova York! E vou morrer nova-iorquina! Se uma aventura me chama, eu vou! Não importa a idade, o peso ou as dores nas costas... Ela sai andando para dentro da casa.
— Você não existe. Regina me reprova com a cabeça. Mas sei que o seu coração me aprova e é só isso o que eu quero.
— E os meus filhos? Eles... Cora vem até mim, apreensiva.
— Esperamos eles chegarem. Digo com simplicidade.
— Vamos buscá-los, onde estiverem. Não se apressem! Temos até a meia noite... Helena, a avó de Regina, reaparece na sala, a cabeça já passou pelo vestido, mas não consegue passar o braço. Então ela se contorce toda e grita para que a acudam.
— Eu sou de Nova York, garota! Ela brada.
— Aqui não tem outro tempo, senão o agora. Mais tarde não me interessa! Cora, eu vou ver a praia! Meu Deus! Obrigada, já posso morrer em paz!
— Pelo amor de Deus, vó! Regina dá uns tapas nela. Deixo as três irem se arrumar e me sento no chão, perto de Henry, que está com uma vasilha transparente cheia de doces e formigas.
— Olha só! Você fez novas amigas, filho!
— Fomigas.
— Aonde quer que você vá, você pode fazer novas amigas. Sempre.
— Qualquer lugar? Ele afasta os abafadores de ouvido e me entrega a vasilha.
— Em qualquer lugar. O mundo é muito grande. E tem muitas formigas, nele. Em cada lugar.
— Eu posso conhecer o mundo?
— Você pode, filho.
— Tá! Ele acompanha uma formiguinha subindo pelo braço dele com a lupa.
— Como você está, filho? Treino mais uma vez essa pergunta.
— Sentado! Ele responde com simplicidade.
— Muito bem, sentado. Concordo com ele.
— Mas e aqui dentro? Encosto o indicador na direção do peito dele. Henry coloca a lupa no chão, fecha a mão e estica os indicadores. Leva-os para o lado dos lábios e quando os dedos estão na pele, ele sobe, formando um sorriso.
— Assim.
— Ah, você gostou de vir para Nova York conhecer a mamãe e a vovó da Regina? Henry pisca os olhos e se distrai, volta a pegar a lupa e retorna a acompanhar a formiguinha. Droga. Frase longa demais. Preciso ser mais direto com ele.
— Você gostou daqui? Pergunto. Imediatamente ele coloca os dedinhos e sobe os lábios.
— Contento.
— Contente. O corrijo.
— Isso, nós dois. Ele se levanta, vem até mim, coloca os dedos indicadores do lado dos meus lábios e sobe, me forçando um sorriso.

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Show de vizinha
HumorRegina Mills sempre corre atrás do que quer. Ela batalhou muito para ter a sua pequena agência de eventos em Miami e um relacionamento de dez anos com Robin Hood, coisas das quais ela se orgulha muito. Até que após um incrível final de semana com se...