cap 11

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Emma Swan
— Olha só quem acordou! O meu príncipe!  Assim que Henry aparece na cozinha eu comemoro.
Ele não esboça nenhuma reação, além da cara amassada e um certo desinteresse em minhas palavras. Senta-se na mesa e olha a comida.
— Sentiu falta da sua mamãe ontem, filho? Pergunto.
— Não. Ele responde com simplicidade.
— A mamãe passou o dia todo fora e você não sentiu a minha falta?  Coloco a mão na cintura e me aproximo para dar uma cheirada no cabelo dele.
— Não percebi. Henry diz com tranquilidade e leva alguns segundos até virar o rosto em minha direção e passa suas mãozinhas de uma forma meio brusca, dando tapinhas em meu rosto.
— Toma carinho. Ele diz e depois passa a mão pelo meu queixo.
— Que carinho gostoso! Encho-o de cócegas, o que só o faz se contorcer e mostrar-se irritado.
— Eu quero um sorrisão hoje, hein! Henry abre um sorriso que lembra o de um dinossauro carnívoro
encarando sua presa.
— Menos que isso, filho. Agora ele sorri feito um rotweiller, pronto para arrancar a perna do invasor da casa.
— Vamos diminuir esse sorriso? Só um pouco mais. Não precisa mostrar os dentinhos. Eu mostro  como se faz. Pouso os cotovelos na mesa e abaixo o rosto na altura dele e com os lábios cerrados, sorrio de canto. Ele tenta imitar, mas ainda parece irritado.
— Está perfeito! Você aprende rápido. Sento-me para tomar café com ele.
— Você sabe que dia é hoje?
— Quarta-feira. Ele diz de forma monótona, um minuto depois de eu perguntar. Estava ocupado demais colocando o mingau no prato.
— Mas você sabe o que vai fazer hoje? Insisto. Henry levanta os olhinhos, quase em súplica. Seu olhar ainda carrega certa indiferença, algo marcante da personalidade dele, mas lá no fundo há um pedido de socorro.
— Não gosto daquelas crianças. Ele resmunga, olhando para o prato.
— Elas não gostam de fomigas. Não confio em quem não gosta de fomigas.
— Você pode apresentá-las às suas formigas, certo? Toda semana temos reunião em uma casa diferente, dessa vez é na nossa. Me refiro a respeito do grupo de crianças autistas e com asperger.
— Não. Ele diz com simplicidade e começa a comer.
— O que fazemos antes de comer? Agradecemos. Feche os olhos.
Mingau, fomigas, mamãe, tomara que Vincent esteja doente e não venha, Regina. Jesus. Amém! Ele diz de boca cheia e assim que termina, coloca mais uma colherada na boca.
 
Regina Mills
Passei o dia entrevistando novas funcionárias para o evento dos Farrah. Eu precisava de gente habilidosa, ágil e que tivesse foco. Consegui cinco entre trinta candidatas, o que pareceu ser muito produtivo. Passei uma lista de coisas que precisaríamos para os almoços, jantares e petiscos que se seguiriam na próxima semana no casamento da noiva, para Zelena, que garantiu que arrumaria todo.
Cheguei em casa, tomei um bom banho e fui ver como o minha vizinha estava. Já achei estranho, de início, ver tantos carros estacionados do lado de fora da mansão de Emma. Será que ela estava ocupado demais para me receber? Bom, não custa nada tentar. Fui em direção à porta e toquei a campainha. Não fui atendida de primeira, então me distraí olhando a paisagem: o jardim bem cuidado, o canteiro para as flores e formigas, o balanço, a pequena bicicleta e a grama verde... aquela mulher era prendada mesmo, tudo dela parecia sempre no ponto certo.
Oi! Falei entusiasmada assim que a porta se abriu. Precisei abaixar o rosto para encontrar o pequeno anfitrião, Henry Swan, com cara de tédio.
— Você não é o Vincent. Ele me olhou, dos saltos até os cabelos amarrados.
— Acho que não. Me agachei para vê-lo.
—Eu moro ali do lado. Você foi lá recentemente, lembra? Eu me chamo Regina.
Graças a Deus. Ele pareceu ignorar tudo o que eu disse, deu meia volta e saiu andando, um tanto feliz. Levantei-me e coloquei a cabeça para dentro da casa e de cara já vi algumas crianças, algumas nos cantos, isoladas. Uma brincava com carrinhos, outro com dinossauros, tinha uma menina com a tabela periódica, e Henry, perto do aquário de areia da sala cheio de formigas, como um guarda-costas. Fechei a porta e fui em sua direção. Ele estava uma gracinha. De jardineira, camisa xadrez e gravata borboleta. O cabelo penteado para o lado e aquela expressão de poucos amigos, transmitido pelos seus grandes olhos marrons.
— Que legal que seus amiguinhos vieram te ver! Falo com ele.
— Não são meus amigos. Henry encara, especialmente, a menina com a tabela periódica. Depois se volta para o aquário e assiste atentamente as formigas fazendo seu trabalho, pelos túneis que são aparentes.
— E onde está o sua mamãe?
— Regina! Ouço a voz forte de Emma atrás de mim e me viro de supetão. Nos cumprimentamos com dois beijos no rosto e ela segura a minha mão.
— Vamos deixar as crianças socializando, vamos para a ala dos adultos. Ela me tira dali o mais rápido possível.  Socializando? Aquelas crianças estão fazendo tudo, menos socializando. Emma me leva para sua biblioteca. Um lugar encantador, com várias estantes altas de madeira nobre, encadernados de couro bem antigos, uma parte generosa sobre livros de finanças, administração e investimentos e
tem até uma prateleira aos fundos, quase escondida, com romances. Também vejo um bar com uma coleção admirável de toda sorte de bebidas, um balde cheio de gelo e um barril, onde deve ter chopp. Essa mulher tem tudo isso dentro de casa? Uau!
— Regina, esses são os pais e as mães das crianças que você viu lá na sala. Ela me apresenta os adultos.
— Pessoal, essa é a Regina... a minha... vizinha. Ela demora de dizer a última parte. Emma me olha de lado, assim bem de perto, a ponto de me fazer sentir sua respiração. “Regina... a minha...” e nesse espaço entre seu silêncio e os batimentos do meu coração, fico até arrepiada ao imaginar o que ela pode falar.
— Oi, Regina. Os pais e mães dizem em coro, parecem super gentis. Depois retornam para suas conversas paralelas e enfim tenho a atenção de Emma só para mim.
— Como foi o seu dia?  Emma pergunta.
— Normal, e o seu? Devolvo.
— Está sendo tranquilo, até então. Como pode ver, a minha casa está cheia de crianças que não conversam umas com as outras e o Henry fica uma bomba relógio em atividades assim, mas a cada reunião dessa, parece que ele fica menos tenso. Até chegar um menininho que o irrita demais...
— Imagino... o meu dia foi normal, entrevistei novas funcionárias para dar conta de servir tanta gente naquela mansão. Farei um trabalho impecável e vou atazanar o desgraçado do noivo. E farei tudo bem feito.
— Tenho certeza disso. Emma fica parada diante de mim, encarando-me. Eu nunca estou preparada para esse momento, o silêncio se torna angustiante.
— Dormiu bem?
— Dormi sim. Ontem foi um grande dia, novamente, obrigada.
— Acordou gripada?
— Na verdade... dormi e acordei muito bem. Melhor do que poderia esperar.
— Eu sei que seus planos vão se realizar e você terá sucesso no que pretende. Ela diz e caminha em direção ao bar, me puxa consigo.
— Você tem garra, corre atrás do que quer. As pessoas fracassam mais por desistência do que por tentativa, e você é essa pessoa. A que tenta. Ela aponta o indicador para mim, sorri com os olhos e me deixa em um silêncio contemplativo. Já conversei com diversos caras. Mas eu sempre tive a impressão de que, eles e eu, fazíamos monólogos. Ou seja, conversávamos, mas não havia real interesse no que estávamos dizendo. Mas essa mulher... ela parece interessada. E eu não sei se estou preparada para isso.
— O que quer beber?
— Pode ser uma soda? Água com limão? Não costumo beber álcool.
— Por quê? Religião?
— Não... eu só... saio um pouco do controle, sabe? E aí se passa um filme em minha cabeça do que é sair do controle. Correr nua no Campus da faculdade; invadir a moradia de um professor para roubar as provas; ficar gritando e acordar a vizinhança; e rir feito uma hiena desengonçada. É sério, de todas essas coisas, a minha risada é a pior. Parece uma motosserra tendo soluço.
E qual o problema de perder o controle?  Emma sussurra em meu ouvido. Ok, eu já decidi, essa mulher é o diabo. E agora está me tentando a libertar a louca que há dentro de mim.
— Não quero te assustar. Levanto a sobrancelha e pego a soda que ela tira de um frigobar.
— Eu já sou grandinha. Não me assusto facilmente. Sinto o dedo indicador dela pelo dorso de minha mão, subindo pelo meu braço. Sinto um calafrio estranho e recolho minha mão e a encaro.
Nós estamos flertando? Murmuro.
Será? Ela devolve, murmura também. É engraçado o jeito que faz, me mostra que é bem esquisito ficar murmurando perto uma do outra assim.
Eu nunca tive sorte com caras, só com um canalha desgraçado. Não sei flertar, eu nunca aprendi. Murmuro e vejo o rosto dela se aproximando, feito um asteroide que vai se chocar com a terra. E essa terra talvez não suporte o impacto; mas o deseja, secretamente. Emma abre a minha soda e se afasta só um pouquinho.
Você é muito bonita.
Qual é, Emma, não precisa fingir. Acho que já conseguimos mostrar que temos química, não precisamos mais fingir uma pra outra, só precisamos fazer isso na frente do meu ex imbecil.
Fingir? Ela me pergunta. Não estamos fingindo? Quero dizer... ela não está fingindo? E por que até nos meus pensamentos eu estou murmurando?
Então estamos flertando? Pra valer? Eu não sei.
Aquele beijo ontem foi um fingimento para você? Ela provoca. Ela murmura bem sedutora, rouca, me arrepia. E eu murmuro igual uma louca que parece que está gritando, mas perdeu a voz.
— Não quero atrapalhar. Uma mulher passa por nós e abre o frigobar, pega uma cerveja e se afasta. — Já que você nos deu a liberdade, vou esvaziar o seu bar.
— Fique à vontade.  Emma sorri, mas é de um jeito diferente. É gentil, cortês, educada. Mas quando vira para mim, me olha no fundo dos olhos e sorri, é diferente. Nem estamos nos tocando, mas sinto como se seus braços estivessem me puxando. Seus lábios se tornam ímã e o meu corpo quer sentir de novo como é ser pressionado pelo dela... debaixo d’água... contra a bancada da cozinha... onde ela quiser.
Acha que vamos conseguir convencer que somos um casal? Tento afastar os meus instintos por um instante, senão farei besteira.
Acha que consegue se convencer realmente de que estamos fingindo? Ela retruca. Desculpe-me, Henry, temos um novo campeão de refutação na cidade. A supermãe, a show de vizinha, ela, o única e inigualável, Emma Swan! Estremeço ao sentir a mão pesada dela em minha cintura e seu corpo
se aproximar do meu, em um abraço apertado, deliciosamente quente e seu cheiro envolvente me deixando desnorteada. Esse cheiro... foi tão bom dormir sentindo ela. E agora, nesse abraço, peço para que o cheiro fique em mim.
Isso é fingimento, para você? Sua mão passa por cima do meu coração. Que parece tambores, batendo freneticamente, numa dança da chuva para trazer o oceano e a vida marinha de volta ao deserto. Essa mulher não cansa de me deixar molhada. Parece que se diverte em me tentar, ainda mais
na frente de tantas pessoas.
Parece fingimento, para você? Ela tira a soda das minhas mãos e as leva para dentro de sua camisa, onde sinto seu abdomen macio, musculoso e seu coração. Isso dura apenas um segundo, para mim, como prendo a respiração e me perco em pensamentos, sinto como se ficássemos nessa posição por
horas. Mordisco os lábios ao descer as mãos por aquele corpo delicioso. E ela está aqui, diante de mim, o rosto tão próximo que me deixa eriçada e constrangida, não solta as minhas mãos e eu quase fujo quando ela as desce um pouco mais, quase para dentro da calça.
Meu Deus! Murmuro, bem alto. Estou falando, estou praticamente gritando, só que sem voz. Todo mundo olha para nós duas.
Você está fingindo, Regina Mills? Esse demônio lambe os lábios e passa pelo meu lado, para fora do bar. Primeiro fico paralisada, tentando entender o que acabou de ocorrer. Depois, vou atrás dela, de volta para o corredor e depois para a sala, onde Emma vai em direção ao filho, que está fazendo um barulho, o mesmo que fez em minha casa. A televisão está ligada e passa um vídeo de música. Todas as crianças parecem irritadas, menos uma. Um garotinho que está sentado, extremamente atento à dança e a música. Emma põe o abafador de ouvidos no pequeno, que imediatamente para o que estava fazendo e olha para o mãe.
— Será que tem abafador para as fomigas? O pequeno pergunta.
— Elas não se incomodam, filho. Mas vou providenciar um abafador gigante para o aquário. A adulta garante. E ao fundo, a sala é embalada pela música que, ao que parece, o tal Vincent, gosta muito e não para de ouvir, novamente, ao que parece, em todas as reuniões dessas crianças, já que todas estão extremamente incomodadas: Baby shark doo-doo-doo-doo-do.

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