Cap 29

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Regina Mills
A noite passada foi um pesadelo. Acho que cheguei a ter um ataque de pânico após aquela visita absurda do Robin . Zel não saiu do meu lado após ter me defendido e ficou comigo até que eu consegui dormir. De manhã cedo, antes de sair para o trabalho, Belle e Zel passaram em meu quarto para conferir se eu estava bem, acordei brevemente e depois voltei a dormir. Eu estou cansada. Preciso ser sincera comigo mesma, preciso assumir que eu não aguento mais. Tudo isso é muito pesado para suportar sozinha e eu não sou capaz, pelo menos hoje, de ir na mansão dos Farrah. Ainda bem que Belle e Zel me confortaram dizendo que iam ficar em meu lugar, dando força, apoio moral e ajuda no que puderem – porque cozinhar mesmo, elas não sabem...
Faço a minha higiene matinal, já deve passar das dez da manhã. Desço sem pressa e vejo a cozinha toda revirada. Zelena ontem, na adrenalina, derrubou uma porção de coisas, está tudo sujo, e é claro, eu que vou limpar isso.
Meu Deus! — levo a mão ao peito e dou um pulo quando ouço batidas na porta, seguidas de alguém tentando mexer na fechadura. Levo a mão ao peito e dou um pulo quando ouço batidas na porta, seguidas de alguém  tentando mexer na fechadura. À luz do dia? Não é possível! Será que esse babaca não vai me deixar em paz mesmo? Após pegar a panela de pressão e empunhá-la como se fosse uma arma, vou na ponta dos pés até a porta e encosto o rosto no olho mágico. Não vejo ninguém.
Céus! Solto um grito quando vejo a maçaneta se mexendo de novo.
Quem será? Acabo sendo vencida pela curiosidade e abro a porta, só uma frestinha. Depois deixo o pequeno Henry empurrar a porta até que ele consiga entrar. Esse traquina um dia vai me matar do coração! Alguém precisa parar esse menino antes que ele se aliste em algum movimento sem-terra, porque não é possível, ele gosta mesmo de entrar aqui. O pequeno usa algo incomum. É como o meu pijama de porquinho, só que bem mais enfeitado. Um pijama todo marrom, patinhas de formiga nas laterais que balançam enquanto ele anda, olhos bem grandes na touca que cobre sua cabeça e na traseira uma bunda gigante que sacode para lá e para cá e até o desequilibra enquanto anda. Henry levanta a lupa e coloca entre nossos rostos.
Bom dia, Henry! Aceno para ele.
Fomigas. Ele diz e sai quase que saltitando pela casa, seguindo o rastro. Meu Deus! Eu não tinha visto!
— Zel deve ter derrubado o pote de açúcar! Praguejo e acompanho Henry até a cozinha para impedi-lo de se cortar.
— Você está sempre muito atento às suas formigas fugindo do jardim, não é, Henry? O pequeno vira o rostinho para mim, coça a testa com o dorso da mãozinha e depois continua a me fitar, sua expressão é neutra e eu aguardo pacientemente a sua resposta. Mas ela não vem. Ele se abaixa, senta no chão e acompanha o movimento das suas amigas com a lupa.
— Voltem para casa! Ele ordena e faz um bico que dá vontade de apertar suas bochechas, mas não quero ser muito invasiva.
— Parece que elas gostam daqui. Penso alto.
Você quer ficar com elas?  Henry segura em minha perna e me puxa para baixo.
— Você quer que eu sente aí? Tá... tudo bem... ótimo jeito de começar o dia, não é? Assistindo as formigas carregando açúcar. Sento ao lado dele. Henry continua a me fitar, dessa vez um pouco irritado.
— Sua mãe não fica preocupada quando você sai assim, de repente?
Foi isso o que te perguntei? Embora soe rude, não há maldade no tom que ele usa. O que foi que ele me perguntou? Já até me perdi aqui, vejamos...
— Parece que suas formigas gostam muito daqui de casa. Acho até que elas acabam encontrando as que moram por aqui.
Fomigas se ajudam. Ele assiste as pequenas marchando em uma longa procissão.
— É mesmo, você me contou isso. Henry coloca as mãozinhas no chão e fico apreensiva ao acompanhar seus movimentos, para que ele não se corte com os cacos de vidro. Ele empurra o corpo em minha direção e coloca as duas mãos em minha coxa, deita a cabeça em cima delas e me dá a lupa.
— Aquelas são minhas. Ele mostra com o indicador.
— Você consegue reconhecer quais são as suas e quais não? Uau! Você deve conhecer todas as suas formigas! Penso se é uma boa ideia fazer um cafuné nele, mas como ele já está praticamente deitado em meu colo, acho que não é má ideia. Henry fica quietinho enquanto eu afago seus cabelos, seus dedinhos tocam bem de leve em cima da minha coxa.
— E você avisou a sua mãe que vinha aqui, Henry?
— Não.
— E isso não vai deixá-la preocupada com você?
— Sim.
— Então por que você veio?
Fomigas. Ah... prioridades, não é mesmo? Cada um tem a sua. Matar a mãe do coração? Quem se importa! Ele quer saber das formiguinhas. Não importa quantos aquários ele tenha em casa, ou até mesmo as que ficam no jardim. Ele se preocupa com cada uma delas.
— Tudo bem. Eu vou te ajudar a levá-las para casa. Pego ele no colo e me levanto. Nesse pequeno gesto, ficamos de frente para a janela. Do outro lado, na mansão, Henry e eu conseguimos ver Emma, que parece que viu um fantasma. Henry dá tchau e a mãe desaparece de onde está. Alguns segundos depois, Emma está diante de mim, os braços cruzados e encarando Henry com seriedade.
— O que eu te disse sobre sair de casa sem avisar, Henry? Ela o repreende, mas tem uma doçura em sua voz.
Não pode?  Henry coloca o dedo na boca e olha para mim.
— Não, não pode. Eu sussurro para ele.
— Você disse que precisava fazer algo importante e aí desapareceu. Emma se aproxima dele.
— Sim.
— E o que era tão importante assim?
Isso!  Henry abre os braços, não sei exatamente o que ele quer indicar, mas na cabeça dele parece fazer sentido.
— Tivemos um problema ontem à noite. Sento Henry na bancada da cozinha e fico em frente a ele para impedi-lo de fazer movimentos bruscos.
— Zel saiu derrubando tudo: potes, panelas, utensílios domésticos... e como pode ver, o pote de açúcar. As amigas do Henry vieram e ele veio buscá-las, ao que parece. Tento explicar para Emma.
Ela acena de forma positiva.
Fomigas se ajudam.  Henry comenta de forma aleatória e seus grandes olhos verde não param quietos, assim como sua cabeça, ele começa a olhar de um lado para o outro. No fim acaba subindo em meu colo de novo e tenta descer.
— Prontinho, no chão. Deixo ele seguro abaixo de mim e o assisto sair correndo pela casa balançando a bunda gigante de formiga. Não contenho a risada.
— Gostei do pijama dele. Aponto.
— É. Inspirado no seu.  Emma se aproxima, passa por mim e pega a vassoura e a pá para começar a recolher tudo.
— Ele está obcecado, não quer tirar nem para tomar banho!
— Ficou ótimo nele. Me escoro no balcão e a assisto recolher os cacos de vidro.
— Ficou sim. Emma termina de recolher e começa a juntar o açúcar em uma vasilha grande, depois a deixa no chão na espera das formigas entrarem todas nela.
— E então, que furacão passou por aqui ontem? Ela olha ao redor. Tapo o rosto com a mão e me viro de costas para ela.
— Não sei se quero falar sobre isso.
— Você também me mandou uma mensagem ontem, de madrugada, dizendo que não precisava que eu fosse com você para a mansão Farrah. Nem hoje, nem nunca mais.  Emma passa a língua pelos lábios e vigia Henry com o olhar.
— Eu não sei se posso te ajudar se não souber o que está acontecendo, Regina.
Você quer me ajudar? Levanto a sobrancelha.
— Eu quero. Aceitei a sua proposta justamente para isso. Para ajudá-la.
Será? Emma suspira e vem em minha direção, para quando estamos de frente uma para a outra, bem próximas.
— Por que você está na defensiva, Regina?
— Me desculpe, Emma, mas não acho que exista outra forma de estar, nesse momento. Eu tenho muita coisa na cabeça agora e... a única coisa que consigo é manter essa postura.
Por quê? É a minha vez de suspirar. Pensei que essa cena seria diferente. Eu queria estardalhaço,
câmeras, a Oprah gritando e correndo para todos os lados e a plateia indo ao delírio. Mas a vida real não é um programa de televisão. E eu preciso me contentar com essa conversa sóbria com Emma.
— Robin  veio aqui ontem, de madrugada. Emma fica imediatamente apreensiva. Olha para o antigo caos que estava na cozinha e volta a me fitar. Estende suas mãos em minha direção e analisa o meu rosto, o meu pescoço e meus braços.
— Você está bem?
— Eu estou. Afasto as mãos dela.
— Você poderia ter me chamado.
— Eu sei me virar. A Zel estava aqui.
— O que ele fez com você? Emma tapa o rosto.
— Eu não devia ter te deixado aqui sozinha...
— Eu não estava sozinha. As minhas amigas estavam aqui e a Zelena me socorreu no momento exato.
— Ele encostou em você?  Emma avança de novo, procurando qualquer indício de machucado.
— Eu vou matar aquele desgraçado. Uma parte de mim se sente confortada em perceber que de alguma forma Emma se importa. A outra parte de mim só consegue se perguntar se tudo isso não é pura encenação.
— Emma... eu sei quem você é. Emma descruza os braços e pisca os olhos com calma. Toca o indicador no nariz e vigia mais uma vez Henry para ter certeza de que ele ainda está por ali.
Pela milésima vez: eu não sou o Christian Grey. Ela revira os olhos.
— Eu sei que não, Emma. Eu sei que você é... Prendo até a respiração ao ter de dizer isso.
Emma Farrah. Eu não disse? Isso teria muito mais impacto se eu estivesse jogando as coisas no chão e a Oprah levantando a plateia. Mas eu estou exausta. Chega de drama, chega de dor e mentiras. Só chega. A reação de Emma é no mínimo inusitada. Ela não se altera, em nada. Continua do mesmo jeito que está, parece que congelou na pose.
Você não vai dizer nada? “Eu posso explicar” ou algo do tipo?
— Eu não sou Emma Farrah. Ela limpa os lábios e depois passa as mãos pela calça jeans surrada.
— Ah, corta essa! Aliso a bancada e dou as costas a ela.
— Eu não sou Emma Farrah. Ela repete.
— Emma, chega de mentiras! Eu já descobri, pessoas que te conhecem me disseram isso, eu pesquisei na internet, agora eu sei todo o seu passado! Sinto que meu espaço pessoal é invadido quando ela toca em meu ombro e me vira devagar. E ao perceber que eu fiquei tensa, ela caminha até ficar em meu campo visual. Eu só quero chorar. Eu não aguento mais. Como cheguei nesse ponto? Coloquei tantas coisas nas costas para carregar e só agora percebi que não suporto mais... Henry vem correndo e abraça minha perna. Acho que escuto algo como:
Toma carinho. Acho que é o que ele diz, enquanto suas mãos passam pela minha perna.
— Eu não quero que ele me veja assim. Leve-o para casa. Peço. Emma pega Henry no colo e se afasta. Quando penso que eles foram embora, vejo que Emma senta Henry no sofá e conversa bem séria com ele para que ele não saia dali. Quando ela volta para perto de mim, eu me sinto um lixo. Não queria que ela me visse assim...
— Eu estou cansada, Emma. Não aguento mais... Ela fica bem próxima de mim e abre os braços. Eu não deveria, eu sei que não deveria, mas eu vou para seu aperto, mesmo que seja, de alguma forma, encenação.
Eu não sou Emma Farrah. Ela murmura, quando estou levemente mais calma.
— Você é a irmã da noiva. É o meu argumento.
— Sim, eu sou irmã da Elsa. Então como que ela não é uma Farrah?
— Emma Farrah é o que eu era, no passado, Regina. Eu não sou mais aquele passado. Eu não sou mais aquela mulher. Eu fui deserdada, eu não posso usar o sobrenome, não tenho mais as regalias da família. O meu pai me tirou tudo o que podia. Se como mulher pública eu aparecer por aí e disser que sou Emma Farrah, ele pode me processar. Porque é assim que ele é. Emma Farrah é uma criação dele. E eu não tenho direito a nada, desde que eu fugi. Solto-me de seus braços para poder olhá-la. O que ele está dizendo?
— Sim, eu sou a irmã da noiva. E sim, desde o início eu sei que você quer destruir o casamento da minha irmã.
Então porque você...?
Eu também quero. Regina, ela não está feliz. Ela estava bem, mas não para de emagrecer e ficar doente... também quero pôr um fim nisso...
— Você podia ter me contado, Emma.
Que diferença faria?
— Toda a diferença, Emma!
— Regina. Emma sorri de nervoso e segura em minhas mãos.
—Era o seu momento. Era o seu plano, a sua raiva, a sua hora de brilhar! Você estava exausta de ser a coadjuvante de sua própria história e no desespero decidiu que queria ser a protagonista! Engulo em seco. Por mais que eu esteja irritada, preciso admitir... Emma está certa.
— Não era o meu momento de brilhar, Regina. Eu tive o meu momento. Agora é o seu momento. E eu sou a coadjuvante da sua história. E quer saber? Eu não me importo de ser coadjuvante nela, contanto que você seja a protagonista. É só isso o que eu quero. Um longo filme se passou pela minha cabeça. Desde as nossas primeiras conversas até esse momento. Principalmente a parte da piscina, em que Emma me instigou a pensar: de que valeria à pena viver aquela vida de luxo se ela não pudesse
tomar todas as escolhas que quisesse? E viver como quisesse?
— Por que você está me ajudando, Emma? Quais são seus interesses ocultos?
— Eu já estive em seu lugar, Regina. Eu já vivi um relacionamento abusivo e no fim dele tudo me foi tirado. Eu só tinha o Henry. E eu... Emma respira fundo.
— Só queria que alguém tivesse feito por mim, o que eu fiz por você. Abaixo a cabeça.
— Mas eu não posso mudar o passado. Só o presente. E é por isso que estou fazendo por você algo que espero que um dia você faça para outra pessoa também.
Mentir? Sinto as lágrimas voltarem aos olhos.
— Notar que quando você, uma formiguinha. Ele toca na ponta do meu nariz
— não consegue suportar o peso... está na hora de receber ajuda. Quem eu sou não importa. O que importa, Regina, é que você não está sozinha. Eu não vou te deixar sozinha. Se for pesado demais, eu vou dividir o peso contigo. E nós vamos juntos carregar isso até o fim. Com casamento ou sem casamento. Mesmo com tanta dor e uma profunda sensação ruim, sinto que encontrei as respostas que me atormentaram. Não estou em paz nesse momento, mas irei me recuperar.
— Eu não menti para você em nenhum instante. Eu ofereci o meu verdadeiro eu a cada momento. Ela chega bem perto. Consigo ver seus olhos brilhando e uma lágrima descendo.
— E mesmo que você não entenda ou não acredite em mim e achar que isso for motivo... quando você não estiver mais aqui por mim, Regina, você não precisa duvidar... Meus lábios já começam a tremer desde já.
— Eu vou estar aqui por você.

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