CAPÍTULO 17

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Aldo não tinha recursos...não tinha nada, apenas uma muda de roupas sebentas e uma cadela magra que ele tinha como sua única amiga. Otávio havia permitido que ela viesse junto com ele, apesar de não permitirem animais ali. Havia levado o animalzinho, magro e cheio de feridas pelo corpo, a um veterinário...havia pago um tratamento caríssimo para curar a sua Leishmaniose e ela, agradecida, apenas lhe abanara a calda e havia voltado para as ruas!

_Ela sente o cheiro da morte._dissera Aldo, o dono._Deixe-a ir. Que vá ser o anjo da guarda de outro morador de rua que terá apenas a ela, como eu. Agora, tenho vocês e estou amparado.

Otávio acreditou que pela pulsação tão fraca aqueles eram finalmente os últimos suspiros do homem que acabara de lhe torturar com as suas confissões cruéis de todas as suas irônicas missões sagradas de justiça em nome de Deus, como ele nomeara orgulhoso.

O rosto de Aldo estava tranquilo quando disse as suas últimas palavras:

_Eu acredito que irei para o céu, pois como cervo de Deus, limpei este planeta desta raça ruim que não deveria ter nascido! Agora posso morrer em paz...

Otávio sabia que tinha que dizer algo, mas temia abrir a boca e falar besteira...

Aldo apertou mais uma vez a mão do médico que ainda estava presa entre as suas...depois de um momento foi enfraquecendo até que partiu, deixando Otávio ainda em choque avaliando se teria ele dado abrigo para alguém como Aldo...e se teria Aldo aceitado a sua ajuda se soubesse que ele também era um daqueles gays que ele tanto odiava e desprezava.

Talvez, avaliou Otávio olhando o corpo já sem vida, devesse ter falado algo, ensinado àquele homem em seus últimos momentos, o que era o amor independente de qualquer coisa!

Otávio gradeceu a Deus por ter se contido, pois não iria querer que aquele homem viesse a lhe cuspir no rosto com desprezo, ou mesmo dizer algo que realmente iria desestabilizá-lo a ponto de se recusar a segurar a mão dele...a ponto dele pedir licença e solicitar que outra pessoa, e não aquela que Aldo escolhera, viesse segurar a mão dele no final da vida.

Ele não soube dizer se realmente fora a ética que o havia contido ali naquela situação e o feito suportar aquele fardo até o final sem reagir de forma agressiva, à altura do que estava sendo dito.

Quando Otávio saiu do quarto, tinha o semblante exaurido de todas as suas forças, pois precisara se esforçar muito para não sucumbir a sua indignação como um gay que está diante de um homofóbico confesso!

Dona Zilda havia lhe dito que ninguém retrocedia, apenas estacionava em algum estágio de sua evolução espiritual e ele não conseguiu evitar o julgamento de que Aldo teria muito que resgatar em suas próximas vidas!

Otávio não havia percebido  que a noite havia chegado. As pessoas pareciam sentir, como a cachorrinha de Aldo, o cheiro da morte e estavam silenciosas já se recolhendo em seus quartos, talvez evitando aquele anúncio de mais uma morte naquele lugar onde as pessoas iam justamente para morrer de forma digna.

_Não sofra tanto por este daí..._uma voz amargurada falou chegando atrás de Otávio._Se ele soubesse que o senhor não gosta de mulher, era capaz de vir aprontar aqui dentro, pois tinha ódio de gays!

Otávio levantou a mão fazendo com que o interno não dissesse mais nada.

_Que Deus o receba em seus braços._disse tentando passar para o outro a ideia de que todos são filhos de Deus e merecem o perdão.

Mas Otávio não se sentia bem depois de escutar tanta monstruosidade dita por aquele homem que deveria ter levado com ele aquele segredo horrendo, aqueles crimes hediondos!

A ÚLTIMA CHANCE-Armando Scoth Lee-Romance Espírita GayOnde histórias criam vida. Descubra agora