Não Queremos O Seu Dinheiro

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Sem correção

Quando Cindy deitou a cabeça no travesseiro naquela noite, se sentia tão perdida e desorientada que teve que fazer um verdadeiro esforço para dormir. Tinha passado o dia todo lutando contra um desejo de se liberar de tudo, na verdade de tudo o que a afligia há tempos. Era um desejo de dar liberdade ao seu pranto. O dia tinha sido demais para os seus nervos já fragilizados.
Seu coração doía e a cada batida, a garganta se enchia de lágrimas. Soluçou baixinho para não acordar o filho. Chorava por muitos motivos: pelo abandono de William naquela madrugada na hospedaria, pela traição dos pais, por ter sido reduzida a uma sem teto, grávida, a espera de uma cama num abrigo municipal, pela quantidade de vezes que fora humilhada dentro daquela casa, por ter reencontrado o homem que amava naquelas condições e também porque desejava tanto que ele a visse como antes.
Ele não pode me dar o que eu quero.- sussurrou debilmente, entre lágrimas.- O seu amor é de Elisabeth.

Na manhã seguinte, com o clima de luto, a casa amanheceu deserta. Apenas ela e Anne formavam o corpo de empregados do lugar. Todos os outros foram dispensados, para comparecerem ao funeral. Os olhos inchados não passaram despercebidos pela colega.

__ Andou chorando? Não me diga que foi pelo Sr.George?!

Cindy negou com a cabeça.
__ Para ser sincera, falei apenas uma vez com ele e foi na manhã de ontem, um pouco antes dele ter infartado. É que o ocorrido me fez voltar ao passado. - mentiu.
Como falar do seu choro sem envolver o pai do filho dela?__Minha avó também morreu do coração. Ela era a pessoa mais sensacional que já conheci. Infelizmente, pelas convenções manteve-se casada, sufocando todos os seus sonhos. Ela era escritora, sabia?

__ Nossa, então é daí que vem a sua paixão pelos livros?

__ Sim, é.- sorriu nostálgica.__ Tenho muitas memórias escritas dela guardadas. Tinha um enorme talento para pôr as emoções no papel e dar vida aos personagens. Escrevia escondida do meu avô. Um dia, se pudesse, gostaria de publicar. Seria uma forma de homenagear quem sempre pensou em mim. Não estaria trabalhando feito uma condenada, se meus pais não tivessem gastado todo o dinheiro que ela deixou para custear meus estudos.

__ Mas você estava grávida, como ia estudar.

__ Era uma pequena fortuna e daria para, inclusive, para criar também Noah até me formar.

__ Nossa Cindy, eu sinto muito, acho você tão culta! Quando Noah crescer, tenho certeza que ele saberá recompensar todo o seu esforço. Aquele menininho vai longe na vida!

Cindy sorriu com uma certa tristeza e continuou seus afazeres.

Na noite de domingo, após se despedir de Anne que aceitara o convite de Peter para ir ao cinema, Cindy lavou os pratos, que ela e Noah fizeram a refeição, secou-os e guardou tudo nos seus devidos lugares.
A casa tinha passado o dia todo num silêncio só. À tarde, após o enterro, Elisabeth e a Sra Hilary se recolheram aos seus aposentos depois de uma boa dose de calmantes. A governanta dera apenas uma passadela na cozinha e também sumira escadaria acima. Contudo, William não havia voltado do funeral junto com as três.
Ao deixar o quarto dele na outra noite, muitas coisas ficaram indefinidas a respeito do que ele pretendia fazer com a descoberta do filho.

Depois de tudo arrumado, ela foi com Noah até a biblioteca para procurar um livro e cumprir a promessa de ler para ele.
Com a revelação a William, de que ele era pai, Cindy esquecera por completo o pedido do menino e o encontrara já dormindo no sofá, em frente a televisão na edícula sob a supervisão de Anne quando voltara na noite anterior.

De mãos dadas os dois atravessaram o vestíbulo central, as salas e pegaram o longo corredor, encontrando aberta a porta do refúgio do recém sepultado Sr.George. O recinto estava às escuras e as cortinas fechadas evitavam que entrasse a claridade das lâmpadas ao redor da mansão.
Cindy acionou o interruptor das luzes perto da estante grande, que ficava do lado oposto da lareira. As lombadas dos livros apareceram majestosas a frente deles. Ela sorriu para Noah, deliciada pelo simples prazer de sentir o cheiro de papel.
Havia muitos livros. E numa olhada por cima, todas as peças de Shakespeare. Ela ainda não lera "O Rei Lear". Era o único livro que faltava na coleção que a avó lhe deixara e que guardava com muito carinho. Um dia, quando não estivesse tão ocupada o leria. Ajoelhou-se. Noah a imitou. Acariciou as obras literárias que se encontravam na parte inferior da estante e deparou com novas tentações. Homer, Hobbes, Norton, Milton e um bom número de autores cujo nome ela não reconheceu.
Tirou um exemplar verde escrito por Hans Andersen, escritor dinamarquês. Noah a acompanhou com os olhos curiosos.
__ Esse é legal, mamãe?- indagou baixinho.

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