SUBI AO CONVÉS NO SÉTIMO DIA de viagem a bordo do Ventos Fortuitos. A aurora de um novo dia recebeu-me assim que eu passei pela escotilha. O céu tinha uma tonalidade bonita de azul pálido que estava mesclada a nesgas de rosa a laranja do sol que despontava no leste. Uma neblina tépida cobria o oceano, limitando o campo de visão do capitão e, portanto, a embarcação prosseguia com cuidado. Muito cuidado.
— Seremos capazes de ver a costa de Asther assim que essa neblina baixar — o imediato me disse, colocando-se ao meu lado na amurada da galé; era um homem gentil de meia idade chamado Daan. — E, com sorte, já será possível ver a cidade de Théocras ao meio-dia.
O meu coração disparou ao ouvi-lo dizer aquilo. Era mais do que eu conseguia suportar no momento, e a expectativa de voltar a ver os contornos de Théocras no horizonte me deixava com os nervos à flor da pele. Tinha rezado às deusas nas últimas noites por um vislumbre dela nos meus sonhos. Por um sinal de que ainda estava a salvo da ambição perversa de Mahira.
Felizmente, as deusas não haviam me presenteado com mais visões turbulentas de Théocras sendo saqueada e incendiada pelo exército mercenário de Mahira. Mas tampouco haviam me contemplado com os sinais pelos quais eu tanto ansiava.
— Aportaremos em Théocras ainda hoje, ao que tudo indica — Daan meneou a cabeça para mim, retomando o assunto.
Tínhamos tido bom tempo desde que partimos de Astradh. Mesmo o capitão Braduk, habituado às tempestades violentas em alto mar, mostrara-se otimista quanto a alcançarmos nosso destino antes do previsto. Eu sabia que isso se devia ao poder das deusas. Bashir e Meriath protegiam a minha jornada. E asseguravam-se de que eu chegaria sã e salva a Asther para cumprir o meu dever.
Uma brisa suave e muito tímida inflava as velas da galé, mas eram as fortes correntes marítimas que nos empurravam em direção à costa. O capitão Braduk estava ao leme, observando o horizonte nebuloso com um olhar circunspecto naquela manhã.
— Que assuntos uma moça tão jovem como você teria em Théocras? — A voz simpática de Daan trouxe-me de volta à conversa — ou melhor, ao monólogo — que tínhamos; eu estava mais introspectiva do que o comum naquela manhã e ele deve ter notado isso.
Abri o meu sorriso mais simpático e amável para o homem grisalho, verdadeiramente apreciando a sua tentativa de puxar conversa comigo para melhorar o meu humor.
— Estou voltando para casa — admiti, e o sentimento de alegria no meu peito era incontestavelmente genuíno. — Vou reencontrar os meus entes queridos em Théocras — acrescentei uma mentirinha inocente para encorpar ainda mais a história que vinha contando a toda tripulação do Ventos Fortuitos.
— Oh, boa sorte então! — Daan sorriu de volta.
— Obrigada.
Todos os marujos haviam sido extremamente gentis e solícitos para comigo. Mesmo o capitão Braduk, ranzinza como era, passara a me tratar com mais amabilidade depois dos primeiros dias de viagem. A tintura preta no meu cabelo ocultava a minha verdade identidade daqueles homens, e aquilo era para o bem de todos.
Pelo pouco que todos os tripulantes sabiam, Aylla era apenas mais uma jovem mulher buscando por novas oportunidades em uma cidade tão grande e populosa quanto Théocras, no reino mais poderoso de Nova Eghau. Eles mal desconfiavam que, na verdade, eu ia ao encontro do meu destino — ou da minha ruína; tudo dependeria da proteção das minhas deusas.
No silêncio da minha cabine, eu me pegava frequentemente pensando em como estariam Otiah, Ethien e Samier em Astradh. Como Mahira teria lidado com a minha fuga quando soube dela — provavelmente com um rompante de fúria por ter os seus planos de me casar com o rei de Ibarhis frustrados. Mas precisava confessar que na maior parte do tempo eu me pegava pensando em Théocras. Em Gorah e sua família. Em Dashaira. E em Sarghan. Eu temia e ansiava por reencontrá-los ao mesmo tempo.
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Nysa - A Mensageira de Torandhur
FantasySequência de Nysa - A Campeã de Asther SPOILERS DO PRIMEIRO LIVRO Nysa sobreviveu às sangrentas arenas da cidade de Théocras e triunfou como a sua campeã. Graças a isso, atingiu o objetivo pelo qual lutou durante anos e conseguiu libertar a sua mãe...