FUI LEVADA ATÉ SARGHAN POR UMA DAS SERVAS e por dois guardas que eram responsáveis por manter a minha segurança no palácio. Não que eles tivessem muito trabalho para cumprir a função atribuída, afinal, passei os últimos dias trancafiada no quarto e não havia dado um passo para fora desde que fui acomodada ali.
Tochas eram acesas nas arandelas pelos corredores por onde passávamos e soldados assumiam seus lugares, guardando cada parte do palácio. Vi copeiras moverem-se atarantadas pelos corredores, carregando bandejas com os jantares para figuras importantes e ilustres. Pensei em Penalyp e Syllane trabalhando nas cozinhas, e senti saudades.
Imaginei se jantaríamos sozinhos ou se teríamos companhia. Tremi de horror ao me imaginar tendo que dividir a mesa com ele e Thalyssa. Não tinha certeza se suportaria ou aguentaria vê-los juntos outra vez. O meu coração não havia se recuperado do último golpe que levou quando Sarghan a acudiu no Jardim da Rainha. Eu estava sendo egoísta e mesquinha, mas percebi que evitar sentir aquelas emoções o tempo todo era ainda mais desgastante. Então, era mais fácil apenas deixar-me nutri-las e pedir perdão às deusas mais tarde.
Finalmente, chegamos a um salão comprido de teto abobadado. As cores acentuadas do crepúsculo transpareciam nas janelas altas que ocupavam completamente as duas longas paredes laterais. Velas bruxuleavam nos castiçais de bronze e a única mobília era uma mesa grande com mais de trinta assentos que consistiam em cadeiras de espaldar com estofados em vermelho. Um espaço apropriado para banquetes formais ou jantares mais íntimos, a depender do que pedia a ocasião.
Então avistei Sarghan e não consegui prestar atenção em mais nada. Ele estava em pé, ao lado da ponta mais distante da mesa. Galante e atraente no seu gibão cinza-escuro com calças escuras e botas de couro macio. Não usava a coroa com rubis naquela noite, contudo. Mas a ausência do adorno nada mudava a respeito da sua aparência e da sua postura. Sarghan jamais conseguiria se passar por um homem comum mesmo que se esforçasse para isso. Havia algo de imponente no modo como o seu corpo se portava mesmo na imobilidade. Era praticamente uma aura, irradiando realeza e magnificência dele.
Os guardas que me conduziam ficaram para trás, guardando as portas que se cerraram assim que passamos. A serva que me acompanhava fez uma mesura para o rei e em seguida se retirou, deixando-me sozinha com ele. Engoli em seco, enterrando todos os sentimentos que ameaçavam entrar em ebulição dentro de mim, e me aproximei de Sarghan, passo por passo.
Sabia que ele me contemplava, que escrutinava a minha aparência e o meu rosto engessado numa máscara de frágil indiferença. Mas eram os meus olhos que eu temia que me entregassem. Não as palavras que eu sufocava na garganta nem tampouco as mãos que comichavam para tocá-lo. Eram os meus olhos que deviam gritar tudo o que eu — ainda — sentia por ele.
Quando estaquei a uma distância respeitosa de Sarghan, a sua boca curvou-se depressa em um sorriso que testou a minha resistência. Que as deusas me ajudassem a sobreviver até o fim daquela noite.
— Você está bonita — ele me elogiou, correndo os olhos cinzentos pelo meu vestido impecável e pelo meu cabelo arrumado. — Mas me parece um pouco... desconfortável.
— Não esperava pelo convite para jantar, Majestade — admiti.
— Eu avisei que conversaríamos mais vezes. Assim que encontrasse algum tempo disponível. Achei a nossa última conversa bastante esclarecedora e produtiva, e gostaria de repeti-la. Esta é uma noite bastante perfeita para isso, não acha?
Como das outras vezes, não consegui intuir se Sarghan desdenhava de mim ou não. Ante o meu silêncio, ele puxou a cadeira mais próxima do assento da ponta, à direita dele, e indicou para que eu me sentasse. Assim que o fiz, ele tratou de ocupar seu lugar à ponta: o assento do rei.
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Nysa - A Mensageira de Torandhur
FantasySequência de Nysa - A Campeã de Asther SPOILERS DO PRIMEIRO LIVRO Nysa sobreviveu às sangrentas arenas da cidade de Théocras e triunfou como a sua campeã. Graças a isso, atingiu o objetivo pelo qual lutou durante anos e conseguiu libertar a sua mãe...