Capítulo Dez: O Cavalariço

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ACORDEI MUITO CEDO NA MANHÃ seguinte, com a luz pálida do sol varando a janela alta, e a razão para isso era uma só: mal tinha pregado os olhos na noite anterior, alternando entre cochilos leves e rápidos e períodos prolongados de insônia. Minhas boas-vindas à Astradh não haviam sido tão receptivas quanto imaginei que seriam.

Espreguicei-me, sentando-me na cama, e, um instante depois, ouvi batidas à porta. Consenti para que entrassem, e Ethien apareceu à soleira com uma expressão radiante:

— Dormiu bem?

Não fazia sentido mentir para ela, então meneei a cabeça em negativa à sua pergunta. Ela sorriu e entrou de vez no meu quarto, fechando a porta suavemente, e se aproximou da minha cama.

— Você vai acabar se readaptando, Nysa — prometeu-me com um tom compassivo.

— Será que vou mesmo, Ethien? — refleti, abaixando o olhar para as minhas mãos entrelaçadas no meu colo.

Ethien mudou de assunto, desfazendo-se da expressão triste pelo meu sentimento de inadequação com outro sorriso radiante.

— As costureiras estarão aqui em pouco tempo. É melhor se aprontar — advertiu-me e obteve de mim apenas um aceno com a cabeça como resposta antes de sair e me deixar sozinha com a minha amargura.

Decidi seguir o conselho dela de todo modo. Levantei-me e lavei o rosto numa bacia de prata. Escovei meu cabelo, desembaraçando todos os nós. Uma serva trouxe meu desjejum um pouco depois: frutas frescas cortadas caprichosamente numa tigela com mel, pães ainda quentes da cozinha incrustados com amêndoas crocantes e algumas fatias de um queijo bastante saboroso e uma taça com leite gelado adoçado com algum tipo de especiaria.

Comi depressa e as costureiras logo chegaram para tirar minhas medidas. Foi rápido, graças às deusas, e elas me cercaram e me manusearam como uma boneca para medir meus membros, resmungando consigo mesmas ao saírem que a Sumo sacerdotisa Mahira também estava de volta e exigira seus serviços.

Suspirei, mas antes que pudesse relaxar no meu quarto ouvi batidas à porta outra vez. Quando a abri, deparei-me com um homem franzino e grisalho, que se apresentou como um sapateiro chamado Beohr e que me informou que estava ali a mando da Mensageira Ethien para medir meus pés para novos sapatos. Agradeci-a mentalmente por isso e deixei o homem fazer seu trabalho.

Antes da hora do almoço, Beohr retornou com alguns pares de sandálias novas em folha. Todas eram muito delicadas, com tiras douradas para amarrar ao redor dos tornozelos. Agradeci-o pelo serviço, e ele partiu para buscar seu pagamento.

Uma vez que tinha sapatos novos, não via mais motivos para permanecer trancada naquela torre com seus velhos fantasmas e ecos de um passado que eu ainda buscava evitar. Saí pela porta e desci as escadas com pressa, sem destino fixo num primeiro momento. Mas depois que inspirei o ar fresco do lado de fora, decidi que faria uma visita aos estábulos. Queria me assegurar de que estavam cuidando bem de Vento Prateado e também queria explorar um pouco do palácio, descobrir o que havia mudado — e se havia mudado — naqueles nove anos em que fiquei ausente.

Como me lembrava do percurso até os estábulos, foi para lá que eu segui, fazendo o máximo possível para ignorar os olhares e os sussurros dos servos e dos soldados que transitavam pelos pátios do palácio naquele fim de manhã pacato.

Desacelerei o passo quando passei por um dos jardins. Pareciam menos suntuosos do que eu me recordava, não havia muitas flores desabrochadas e a grama tinha crescido sem controle em alguns pontos, encobrindo a base de algumas estátuas das deusas e alguns vasos vazios. Heras também tinha se apossado das pilastras que sustentavam o teto abobadado e vazado, contorcendo-se como serpentes ao longo de toda a sua estrutura. Os viveiros dos pássaros que costumavam ressoar com seus cantos estavam quase silenciosos a não ser por um gorjeio amuado ou outro. Engoli em seco, mal suportando tal visão desoladora, e parti.

Nysa - A Mensageira de TorandhurOnde histórias criam vida. Descubra agora