Capítulo Trinta e Quatro: A Serva

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EU ME APRESENTEI NO PALÁCIO REAL dois dias depois de minha visita a Uhri e Lenna. Em uma manhã quente e ensolarada em Théocras, como eu voltara a me habituar.

A ideia do que estava prestes a fazer tinha me deixado nervosa o bastante para não permitir que eu pregasse os olhos na noite passada. Mesmo o meu estômago estava enjoado e recusara qualquer comida que eu tivesse tentado ingerir no desjejum, de modo que havia me contentado apenas com meio copo d'água antes de partir do Senhora Sorridente.

Uhri e Lenna haviam me convidado para morar na casa deles nesse meio tempo, mas eu recusei a oferta e continuei a me hospedar na estalagem de Vyna. Não queria envolvê-los na minha história mais do que já tinha envolvido. Nunca me perdoaria se terminasse por arrastá-los para a confusão que eu mesma causara. A minha única razão para ter retornado à Théocras era aquela missão. Só o que me restava era colocar o meu plano para me infiltrar no palácio em prática. O que implicava encarar todos os meus medos de frente, sem recuar.

E chegar perto do grande palácio real de Théocras outra vez me enchia de inquietação. A construção grande e magnifíca era a joia da capital, erigido por uma dinastia de reis que fizera o reino prosperar.

Era erguido todo em pedra branca na parte mais elevada da cidade; com domos de vidro cristalino, torres esguias e janelas altas com vitrais. Tudo isso era cercado por muralhas praticamente impenetráveis. Tão belo quanto intimidante, era o símbolo do poder máximo do rei de Asther. E eu precisaria superar aquela hesitação se pretendesse mesmo levar meu plano perigoso adiante.

Seguindo as instruções de Lenna, aproximei-me dos portões abertos — porém sempre vigiados — do palácio e abordei com um sorriso simpático um dos guardas que cumpria seu turno, portando espada, escudo e lança:

— Com licença? — chamei-o. — Procuro por uma mulher chamada Sylanne, a copeira-chefe das cozinhas do palácio. Fui indicada para uma vaga de trabalho por uma prima.

O guarda olhou-me de cima a baixo primeiro antes de decidir tomar as minhas palavras e intenções como verdadeiras. Ele suava embaixo do meio elmo que usava e apostava que todo aquele calor deixava-o de muito mau humor. Portanto, tratei de ampliar o meu sorriso a fim de amenizar a situação.

— Quem te indicou e qual é o seu nome?

Animada, retirei o pedaço de papel que Lenna escrevera para mim há dois dias de dentro da bolsa e o mostrei a ele. O guarda pegou a carta e a inspecionou apenas superficialmente.

— Foi Lenna quem me indicou, a que trabalhava como copeira. E o meu nome é Aylla — acrescentei para ajudá-lo a convencê-lo. Por via das dúvidas, mantive a mesma identidade de quando subi a bordo do Ventos Fortuitos e desembarquei no porto de Théocras.

Nem um minuto depois o guarda aparentemente convencido de minha franqueza — e que descobri mais tarde se chamar Jaric — dispôs-se a me acompanhar enquanto íamos ao encontro de Sylanne, a mulher responsável por gerir todas as copeiras do palácio. Enquanto atravessávamos o pavilhão principal fui assaltada por lembranças, de todas as vezes em que o cruzei na companhia de Gorah para os banquetes do torneio Trissolar.

Tudo continuava exatamente igual, e ao mesmo tempo tudo estava tão diferente aos meus olhos. Não pude apreciar as torres alvas ou os jardins exuberantes por muito tempo, pois Jaric me levou até a entrada dos fundos da cozinha do palácio e ordenou a uma jovem serva que buscasse Sylanne.

Mais tarde, a serva retornou e não retornou sozinha; havia uma mulher mais velha e de rosto severo com ela. Com uma coroa de cabelo preto trançado ao redor da cabeça e ágeis olhos cor de mel. Sylanne entrou na cozinha tumultuada e os ruídos à nossa volta imediatamente cessaram. As cozinheiras ainda se moviam pelo recinto, apressadas e atarefadas, mas a chegada de Sylanne pareceu deixá-las mais alertas e conscientes de que não poderiam cometer nenhum erro às vistas daquela mulher.

Nysa - A Mensageira de TorandhurOnde histórias criam vida. Descubra agora