Capítulo 5

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pov: Yunho 

Pensei que fosse um sonho. Como eu poderia saber? Ninguém avisa: “Ei, só para você saber, você morreu”. 

O dia começou como outro qualquer. A família completa e feliz sentada à mesa da cozinha, tomando café da manhã. Eu nem estava comendo de verdade. Jihoon também não: ocupado demais ao celular. Nem Krystal: ocupada demais servindo o café — meus pais adoram quando os chamo pelo nome. Wooyoung era o único que realmente estava comendo. 

Eu não queria ir à escola, mas minha mãe não me ouviu. Disse que era o primeiro dia e que eu não tinha escolha. A escola me faria bem, ela disse. Ela me viu dormindo o verão inteiro, e estava louca para me tirar de casa. 

Mas, sério, de que adiantava ir para a escola? Eles nunca sabiam o que fazer comigo. Se você não se encaixa em um dos grupos deles, é deixado de lado. Eu poderia aprender muito mais em casa. Lendo meus livros e assistindo Harry Potter. Pelo menos, quando estava na escola Hanover, podia citar Nietzsche sem que os professores ficassem me encarando sem saber do que eu estava falando. 

Infelizmente, todo o experimento de escola particular foi um fracasso. Ao que parece, engolir um Adderall para sobreviver aos exames finais — ou ao dia — é completamente aceitável, mas um pouquinho de erva no armário é imperdoável. Hipócritas. Talvez agora eles vejam como são retrógrados. 

Ei, gênios, ninguém morre por fumar maconha. Mas comprimidos? Pois é, acertaram em cheio. 

Então Krystal tentou fazer Jihoon se envolver. Chega a ser engraçado. “Você vai para a escola, Yunho” foi tudo que ele disse. Minha mãe sempre fica irritada porque meu pai não se importa. Eles discutiram sobre isso por um tempo, como se eu não estivesse no mesmo cômodo. Bem-vindo à família Jung. Se seu nome for Wooyoung, aperte os cintos. Se for Yunho, bom... é melhor se anestesiar direitinho. 

Acabei indo para a escola. Certas batalhas não valem a pena. Peguei uma carona com Wooyoung. Outra vantagem de ser eu. Seu irmão mais novo leva você de carro. Tudo porque o Hyundai que Jung Jihoon deu para você como um tratado de paz está em uma pilha de reciclagem em algum lugar. 

Não tinha nenhum cervo na estrada naquela noite. Agora posso mandar a real: bati naquela árvore porque quis. Minhas piores decisões sempre foram assim, tomadas em uma fração de segundo. Nove das dez vezes saí com ferimentos leves. Até que, na décima… 

Acontece que eu estava certo em querer faltar. Levei bronca na primeira aula — mesmo não sendo o único no celular. Mexeram comigo no refeitório, e mexeram comigo de novo no laboratório de informática. Porra, eu só estou tentando cuidar da minha vida. Nem isso me deixam fazer? 

E esse foi só o primeiro dia. Como vai ser o resto do ano? Faltam duzentos e setenta e tantos dias. Como vou conseguir passar por isso? 

Não consegui. 

Matei as duas últimas aulas. Saí andando do prédio. Não conseguia deixar para trás a sensação de queda livre. Como se não tivesse onde me segurar. Fui atrás da única pessoa que pensei que poderia me ajudar. E então, como isso não deu certo… 

Acordei no hospital. Minha família estava lá. Todos eles, olhando para o chão, para o celular, para o nada — para qualquer lugar menos um para o outro ou para mim. Eu sabia o que estava por vir. Já passei por isso antes, eu sei. Me poupe. Saí da cama antes que pudessem dizer uma palavra. Simplesmente saí do quarto, e ninguém veio atrás de mim. 

Tinha duas enfermeiras na recepção. Uma delas disse: “Quarto 124. Tão triste. Tem a idade do San”. 

“Pois é”, a outra enfermeira concordou, suspirando. 

A primeira fez uma ligação, deixou uma mensagem: “Oi, filho, só queria saber como você está. Como foi o resto do dia. Conseguiu alguma assinatura legal no gesso? Você provavelmente vai estar dormindo quando eu chegar, mas vejo você de manhã. Te amo muito. Só queria que você soubesse disso”. 

Ela guardou o celular, pousando as mãos na testa e massageando as têmporas. Mal consegui acreditar em quem era essa mulher. 

“Acho que conheço seu filho”, eu disse. “Assinei o gesso dele hoje.” Ela não me respondeu, só saiu andando. Outra das minhas fãs, pelo visto. Vai ver San já contou para ela o que aconteceu entre nós. Deve ter contado de um jeito que o fez parecer inocente. Parado ali, feito um santo, atacado pelo malvado Jung Yunho. Mas foi ele quem me provocou. 

Não queria empurrá-lo. Mais uma daquelas decisões de fração de segundo. Para ser sincero, são mais reações por reflexo. Ou algo mais profundo, parte da minha natureza. É o que faço: estrago as coisas, sempre, querendo ou não. O que estou estragando pode ser a melhor coisa da minha vida. E eu vou saber disso. E ainda assim não vou conseguir evitar — talvez por medo. 

Voltei para o corredor, prometendo ser mais paciente com a minha família. Cheguei ao meu quarto. Quarto 124. Olhei para dentro, e foi então que vi. O menino na cama... era eu. Me debrucei sobre ele — o outro eu. A pele cinza. A boca aberta. 

Consegui o que queria, acho. 

Agora estou livre. Ninguém no meu caminho. Ninguém esperando na esquina, preparando uma armadilha. Ninguém para ver se meus olhos estão vermelhos. Perguntando onde passei a noite, ou fazendo promessas. 

Passei o dia no hospital. Estão todos machucados e destruídos, assim como eu. Até os funcionários. Eles só escondem melhor do que os pacientes. 

Especialmente aquela enfermeira. A mãe do San. Ela é meio atrapalhada, sempre com pressa nos corredores. Mas parece uma boa pessoa. Hoje, no intervalo, mal encostou no sanduíche. Ficou pesquisando coisas de universidade para San. Não consigo imaginar Krystal fazendo o mesmo, embora eu seja a obra da vida dela. 

Minha mãe preferia delegar. Ela me tratava como um de seus projetos de reforma: contratar ajuda, chamar especialistas. Os melhores da área. Vamos dar um jeito nele, então faça o que tiver de fazer. Leve-o para passar uma noite ou semanas inteiras. Encha o garoto de remédios. Sessões particulares, ou sessões em grupo, ou os dois. Temos dinheiro, o quanto for preciso. Não poupe esforços. Só dá um jeito nesse nosso probleminha. E rápido. Meu marido está ficando impaciente. Perdendo a confiança, perguntando: “Por que gastar tanto dinheiro no que não presta?”. Não funcionou até agora, depois de todos esses anos. 

Talvez seja melhor abandonar o projeto, interromper o trabalho... pelo menos por enquanto. Vamos esperar um tempo, para ver o que acontece. 

E aqui estamos nós.

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Sincerely, Me.Onde histórias criam vida. Descubra agora