Capítulo 24 - Não sentir.

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_Cacete. Quantos milhões de watts tem essa lâmpada? – Ash resmungou afundando ainda mais no canto direito do sofá, a caneca agora quase vazia.

Ava suspirou pesado e levantou se arrastando ainda com a cara fechada até o interruptor, desligou ele fazendo o garoto relaxar quase que instantaneamente em resposta. Ligou a luz distante da cozinha, deixando a sala em uma leve penumbra agradável. Voltou pro sofá, se encolhendo no canto esquerdo. Os olhos fuzilando o menino que gradualmente ia ganhando novamente uma cor humana.

_Noss... parece que o mundo todo tá socando a minha cabeça. – ele se apoiou nos joelhos, apertando as têmporas. – Ainda tô sentindo o gosto na boca, e eu nem lembro tudo que bebi. Minha língua ainda está dormente. Tem um analgésico?

_Não vai adiantar. – ela disse sem tirar os olhos dele, a mesma expressão vazia. O encarando ainda. – O álcool que ainda está no seu corpo vai fazer o remédio evaporar.

Ash se contraiu coçando o nariz agora. Se ajeitou no sofá e respirou fundo. Olhou em volta ainda piscando pesado. Olhou ela por segundos e desviou de volta pra tv desligada. O silêncio esmagador começando a fazer ele pensar demais, e isso era perigoso, ainda mais com ela por perto.

_belo soco, quatro-olh-

_O que você está fazendo? – a voz dela interrompeu o que quer que ele fosse ensaiar dizer. – O que aconteceu? Porque diabos você sumiu?

Ash ensaiou balbucios, engoliu em seco e voltou a coçar o nariz. Se recostou no sofá, os olhos na maldita tv desligada. Não pensar, não pensar...

_Chama-se festa, quatro-olhos. Essas coisas acontecem quando se festeja. – ele riu estridente coçando o queixo agora. Riu sozinho, até o riso fazer cada vez menos sentido, até os olhos dela quase perfurem suas bochechas. Ava abraçou mais forte as próprias pernas.

_Eu fiz alguma coisa de errado? Eu machuquei você? – os olhos dela perdidos, claramente buscando nas semanas passadas possíveis ações ou palavras que pudessem ter causado aquele turbilhão entre eles. – Porque você sumiu de mim?

Ash sentiu o peito protestar, ele empurrou.
Outra vez, só mais uma vez.
Empurrou pra baixo os sentimentos.

_Ava, não pira. Não tem nada de errado. – sacodir a cabeça doeu, mas serviu pra parar de pensar. – Você não fez nada.

_ Ah, não me vem com essa. Você some de tudo, fica praticamente impossível te achar e ai quer que eu acredite que não tem nada de errado? – ela inclina o rosto, ele evitou olhar pra ela agora porque normalmente aquele julgamento já era demais pra ele, nem queria saber o que sentiria agora, com aquela "anomalia" no coração. – Eu... Meu Deus. Eu procurei respeitar seu tempo, o seu espaço. Eu poderia ter simplesmente ido até sua casa e ter exigido que você falasse qual era a droga do problema pra resolvermos juntos. Mas eu respeitei, respeitei seu limite. Eu esperei. E pra que? Pra você quase se matar com bebidas, sexo e sabe-se lá o que mais você usou.

_Ava, só me deixa em paz, falô? Tá tudo de boa. – Ele cambaleou pra levantar mas recuou um pouco piscando mais, ainda mais tonto agora.

_Não. Não vou te deixar porque claramente paz é a ultima coisa que você está tendo. Seus olhos estão vermelhos. Há quanto tempo você não dorme ou come alguma coisa descente?

_Eu tô chapado, caralho. Queria que tivesse flores nos meus olhos? – ele se levantou num rompante, a caneca caindo no tapete. Ava se levantou junto, sustentado alguns passos tortos de Ash que assim que se firmou nos pé se afastou, passando a mão no rosto e jogando o cabelo revolto pra trás com os dedos.

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