A Melhor parte de mim.

Capítulo 28 - Palavras não ditas.

 O dia mal tinha começado quando Ash abriu os olhos, as mãos nervosas indo de um lado pro outro, estalando os dedos em seus anéis de prata enquanto os pensamentos voavam na direção da auto estrada. O cabelo pouco desgrenhado pelo sono, os olhos cinzas atentos varrendo todo o lugar. Ele poucas vezes se sentia verdadeiramente culpado por qualquer coisa, e sinceramente aquela era das piores vezes em que se sentia assim.

Empilhou as cobertas dobradas sob a pequena cama três vezes em ordens diferentes e desistiu de equilibra-las quando caíram pela quarta vez. A forma que aquele quarto ficou quente de repente no meio da madrugada depois de quase sentir o cheiro dela ali, dormindo com ele a poucas semanas atrás sob o mesmo travesseiro. A forma irritantemente necessária que ele precisou usar as mãos nele mesmo só por pensar em Ava. O jeito que ele gozou intensamente só se lembrando de como o rosto dela ficava quando ele a penetrava devagar.
Seu coração não se aquietava no peito com a simples ideia de ver ela hoje, de ver ela agora ou o quanto antes.

O pés batendo repetidamente sobre o descanso da cadeira da cozinha, fazendo a pequena peça tremer contra as investidas. As mãos em punhos contra o queixo e boca, estalando os dedos com os olhos perdidos pelo assoalho.

_Filho, vai furar o chão desse jeito. – Lilian sorria assoprando o vapor suave que saia da caneca que tinha frente ao rosto. As bolsas dos olhos ainda cheias indicando o sono recente. – Você precisa se acalmar, não é a Rainha Elizabeth, é só a Ava.

Ash bufou desmoronando sobre o balcão, caindo dramaticamente com o cabelo se espalhando sobre o mármore claro. Lilian gargalhou se aproximando pra acarinhar sua criança ansiosa, Carlos brotou logo atrás, surgindo pelo corredor ainda sem grande parte das roupas. Lilian de olhos alertas fez sinais rápidos que ele logo entendeu pulando pro bainheiro e saindo do campo de visão, estava mais que claro que eles não estavam acostumados com visitas tão cedo.

_Será que ela já chegou no trabalho? Não seria melhor encontrar ela em casa, antes de sair? E se eu levasse ela-

_Não. Não. Filho, me escuta. – Ela mergulhou os dedos pelos cabelos dele, enquanto Ash ainda deitado no balcão virou o rosto a observando com o cenho franzido em tensão. O rosto colado contra o mármore frio. – Faz como combinamos ontem. Você fica pro café da manhã, come com calma, relaxa e pensa no que vai falar e principalmente no que vai ouvir. Daí vai pra casa, toma um banho e a tarde vai buscar ela no trabalho. Vocês vão ter tempo e privacidade pra conversar depois que ela sair.

Ele engoliu em seco voltando a bater o pé enquanto apertava os olhos sofrendo. Lilian depositou um beijo carinhoso agora quando se voltou pra cozinha e começou a fazer sua magia da manhã. Não levou muito tempo pra que o cheiro de baunilha e mel tomassem conta da ampla área de estar integrada. Ash deve ter comido umas quatro panquecas de uma vez só antes de sair catando a jaqueta e o capacete, perdidos em algum canto da sala. Carlos ainda encarava estarrecido a porta quando ele passou por ela prometendo olhar a caixa de marcha do seu carro quando sumiu na claridade da manhã.

Obviamente ele pilotou pensando nela. Pensando em como agiu e quantas vezes se culpou por aquilo em poucas horas. Ele repensou, se lembrou das frases que soltou sobre ela e mesmo que ainda tivesse as mesmas duvidas e medos e ainda acreditasse que talvez fosse a perdição de Ava, ele ainda tinha que fazer aquilo. Ainda precisava que ela falasse, que ouvisse suas desculpas e principalmente que ela soubesse que sentiu sua falta a cada minuto daqueles dias malditos.

O caminho que deveria ser feito em 5 horas, foi feito em três; Lilian o mataria quando soubesse, mas se ele finalmente tivesse tirado aquele peso das costas e aquele nó na garganta, valeria a pena morrer então. Parou por segundos no acostamento da serra, observando a cidade cintilante no vale a baixo de si e suspirou. Repetiu pra si mesmo como um mantra particular, só pra não esquecer dos passos...