Tensão no cemitério

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Meu avô se chamava Joseph. Ele era um velho ranzinza, chato e que dava bronca em todo mundo. Lembro-me da época em que ele ia para Duskwood de camionete e quando voltava, sempre me trazia um pacote cheio de doces e ele dizia: “ Esconde isso do seu irmão, Agatha. Ele vai te tomar tudo, aquele moleque frouxo! ”. Minha mãe dizia que enquanto o meu irmão cuidada de mim, os três trabalhavam muito na fazenda. Mas no final da tarde, meu avô voltada para a sede e preparava a minha última mamadeira de leite do dia. Ele me entregava e fazia questão de me levar pra cama.

Eu não me lembro desse fato, pois era muito pequena. O que eu me lembro era dos doces, do rosto envelhecido dele, dos cabelos brancos e dos nossos passeios no final de semana. Uma vez ele me levou para conhecer aquela figueira enorme que tem na fazenda, lá do alto dava para ver toda a propriedade e ele me disse:

- Um dia tudo isso vai ser seu. Quero que cuide dela pra mim e saiba que cada pedacinho desse chão me representa. Quando eu não estiver aqui mais, me veja em cada canto dessa fazenda.

Na época eu não entendi o que ele quis dizer, eu só tinha sete anos de idade. Um mês depois o meu avô teve um ataque cardíaco e faleceu. Foi uma dor imensa para a família, principalmente para o meu pai. Ele era o seu único herói, mesmo sendo um anti herói. Eu me odeio por não ter tantas lembranças dele, queria me lembrar de mais detalhes, mas não consigo. No dia do seu velório eu me lembro de chegar perto do seu caixão, ver sua pele velha e pálida, seus braços cruzados ao peito e um sorriso leve estampado em seu rosto. Na minha mente eu soube que ele estava feliz, que morreu realizado, então não chorei. Daquele dia em diante não tirei essa cena da minha cabeça, toda vez que subo até a figueira sinto que ele está ali comigo.

Fiquei olhando para a lápide do meu avô e me lembrando de várias coisas. Percebi que na minha infância eu fui tão sozinha, o pouco de tempo que eu tinha com a família passava com ele. Mas quando ele morreu, só sobrou o Alef. Não me leve a mal, eu tentei me aproximar do meu irmão. Como criança, eu não tinha maldade, mas ele sempre me dizia palavras do tipo: “ Você é um fardo! Não vejo a hora de você crescer logo! Você só me traz problemas, Agatha! O papai brigou comigo por sua causa! Eu odeio você! Sai do meu pé, pirralha! Me deixa em paz!”. Ele me fez coisas do tipo, me bater quando estava com amigas na rua, me envergonhar na frente das minha amigas, ficar me vigiando nas festinhas que eu ia e acabou com o meu primeiro namoro. Ele foi tão invasivo que fez o meu ex se afastar de mim, pois não aguentava mais o Alef o tempo todo na nossa cola. Não podíamos ir ao cinema sem ele, muito menos passear, ele sempre ia junto e se intrometida em nossas conversas. Controlava o tipo de roupa que eu usava e até com quem eu podia ou não ter amizade. Até que um dia eu fui ao seu quarto a noite, para pedir emprestado um estojo de lápis de cor. Na época, ele tinha 17 e eu 14 anos. Peguei ele se esfregando em um “coleguinha” de classe. Foi ai que o tive em minhas mãos e tudo começou a mudar. Como boa irmã, usei isso contra ele e o Alef começou a me odiar mais ainda. Porém, ele não tem tanta coragem de me deter como antes ou me manipular da forma que bem lhe entendia. Só tive paz quando ele se mudou para Nova York e seguiu sua vida.

Por isso não consigo imaginar que coisas boas venham de dentro dele. Eu sentia que o meu pai não devia ter dado essa responsabilidade pra ele, pois a fazenda nunca foi algo que ele se preocupou. Mas eu não ia permitir que ele destrua tudo o que meu avô e meus pais construíram. Estava escuro e eu estava sozinha naquele cemitério, havia apenas algumas corujas cantando noite a dentro. Era por volta das 19:00 horas. A iluminação era apenas a lanterna do meu celular e eu não senti nem um pouco de medo. Até que meu celular vibrou e me assustou pela primeira vez ali. Vi que era uma mensagem do Dan:

Dan: Ei, Boo. Diga exatamente como eu estou : *Dan mandou uma foto vestido com uma camiseta branca, calça preta e avental preto.

Duskwood - AuroraOnde histórias criam vida. Descubra agora