Território do Clã Huxley
Quinn
O barulho do osso se partindo foi a primeira coisa que ouvi, quando meu corpo se chocou contra o chão e minhas mãos se fecharam ao redor do pescoço da corça. Encarei o céu azul, por entre a copa das árvores, antes de soltar a respiração e livrar o pescoço inerte da criatura do meu aperto.
—Foi mal amiguinho. —Me ajoelhei no chão, ainda sentindo a pulsação do sangue dele nas veias.
Mesmo faminta, depois de horas na floresta, não ousei morder a pobre criatura e me deliciar com seu sangue. Como parte do grupo de caçadores do clã, eu deveria levar toda criatura que conseguisse para a caverna, mantendo assim o estoque de sangue fresco para todos os vampiros.
Fiquei de pé e o coloquei sobre o ombro, sentindo-o muito leve, apesar do tamanho. Caminhei pelo meio das árvores, sentindo o ar bater contra mim, enquanto as variedades de cheiros na floresta invadiam meu olfato. Eu amava a floresta. Viver em uma caverna, com o tempo, se torna entediante e você costuma sentir falta do sol e da brisa fresca que vem do mar.
Levei poucos minutos para chegar até o grupo de cavalos, fazendo uma contagem de cada criatura que estava sobre as costas dos animais de pelagem marrom. Coloquei a corça sobre as costas do meu cavalo, o juntando com outros dois cervos que eu havia pegado algumas horas antes.
—Parece que alguém teve sorte hoje. —Olhei por cima do ombro, vendo Dane se aproximando, arrastando um cervo pelo chão, segurando-o pela longa galhada que se erguia na cabeça. —Nosso lorde ficará orgulhoso da favorita dele.
Revirei meus olhos, ignorando o vampiro de pele dourada e de cabelos castanhos, quase negros, como a noite. Havia um ar de desdém na voz dele que me fazia desejar matar ele e todos os babacas do clã, que se acham no direito de me me rebaixar a favorita do lorde, como se isso significasse alguma coisa.
Mas eu estava muito longe de ser a favorita dele. Ainda mais depois do que meu pai fez. Confabular com o clã inimigo nunca é uma boa escolha, se você quiser manter sua cabeça grudada no corpo. Infelizmente, para o meu pai, ele não fez a escolha certa.
Peguei as rédeas do cavalo, puxando ele pelo caminho da floresta, enquanto os outros vampiros voltavam com sua caça. Eu tentava evitar ao máximo ficar em grupo com eles. Primeiro porque a maioria tinha a personalidade de uma porta. Segundo que parte deles me olhava torto, por culpa do meu pai.
O caminho de volta ao clã foi lento, já que o cavalo não tinha a mesma velocidade de um vampiro. A entrada do Clã Huxley ficava na praia, entre as rochas que davam início as montanhas. Mas haviam entradas escondidas pela floresta, que só os vampiros do clã conheciam. Foi pra uma delas que eu levei o cavalo.
Escondida por folhas e flores trepadeiras, como uma cortina, a entrada da caverna dava para os túneis secundários do clã, onde eu poderia passar com o cavalo, sem me preocupar em encontrar ninguém que quisesse arrumar uma boa confusão, pelas três criaturas que estavam nas costas dele.
Sempre havia alguém tentando quebrar as regras. Sempre havia alguém arrumando confusão. Mas eu tentava ficar longe delas.
[...]
Parei em frente a porta, observando as luzes das tochas clareando o aviso pregado ali. Fiz uma careta e o arranquei, abrindo a porta e a chutando com o pé para fechar, assim que já estava dentro da minha pequena caverna. Minha casa. Uma sala, dois quartos, rodeados por paredes rochosas.
A sala era composta por um par de sofás de tom vermelho negro, algumas estantes repletas de livros, além de uma mesa de centro, onde duas taças de sangue, vazias, ainda se encontravam. No teto rochoso, o lustre prateado estava repleto de cristais que se assemelhavam a gostas de sangue e que refletiam as luzes das chamas das tochas pelas paredes.
—Jason? —Chamei, parando em frente a mesinha, onde meus vasos de tulipas negras estavam florindo. Peguei um pouco de água e molhei a terra, que parecia um pouco seca de mais, antes de ver meu irmão aparecer no final da escada em caracol, que dava para o segundo andar.
Seus ombros estavam encolhidos e os olhos claros estavam apagados e sonolentos, deixando claro que ele havia acabado de acordar. Além de ter os cabelos escuros, um pouco longos demais, já que os mesmos caiam sobre seus olhos, bagunçados em várias posições diferentes, de uma forma engraçada.
—Você demorou! —Exclamou, atravessando a sala em um piscar de olhos, até grudar o corpo pequeno em mim, enquanto me abraçava pela cintura.
Jason era meu irmão mais novo. Com apenas 10 anos, ele ainda tinha a eternidade toda pela frente e muita coisa pra aprender sobre o mundo e nosso clã. Mas eu também não era muito velha pra um vampiro, estava apenas a dois anos de completar o primeiro século, o que era pouca coisa, perto da maioria dos vampiros que viviam ali.
—Sinto muito. A floresta estava silenciosa e quieta hoje. —Afirmei, o abraçando de volta, enquanto tentava colocar no lugar seus cabelos rebeldes. —Mas e você, nenhum problema por aqui?
—Não. Fiquei a manhã toda observando os recém transformados treinando. E depois eu voltei pra cá, quando fiquei faminto. —Comentou, erguendo a cabeça e me encarando com os olhos fixos. —O que você pegou?
—Uma corça e dois cervos. Por que? —Indaguei, deixando que ele se afastasse de mim, ao mesmo tempo que esfregava os olhos.
—Prefiro sangue de coelhos.
—Eles são pequenos demais, Jason. —Afirmei, pressionado os lábios para não sorrir. —Mas posso trazer um pra você da próxima vez.
—Eu gosto da ideia. —Comentou, enquanto cutucava minhas flores.
—Sim, é claro que gosta. —Murmurei, observando ele abrir um sorriso e erguer os olhos até mim, como se eu fosse a coisa mais preciosa da sua vida. Não tinha certeza quanto a isso. Mas tinha certeza que Jason era a coisa mais preciosa da minha eternidade.
Continua...
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Laços de Sangue e Poder / Vol. 2
FantasíaEm uma terra de humanos e vampiros, o príncipe Will deveria ser aquele que subiria ao trono do reino mortal, para governar os humanos. Mas só tinha um único problema, por conta de uma maldição envolvendo sua mãe, a rainha, ele é um vampiro. O segred...