Voltei na casa de Destruição outras três vezes, na última semana. Ele tem "melhorado", mas ainda perde a paciência e quebra os pincéis por contra própria. Sempre ficamos ouvindo música em um toca-discos velho que ele tem, e o ar da casa fica mais sombrio ainda. Barnabas sempre está por perto, abanando o rabo e dando opiniões sobre os quadros que pintamos.
Isso está sendo bom para mim, pois ali, eu posso pintar quadros que vou vender, e ainda receber pelas aulas. Capitalismo.
- Nos vemos segunda? - Eu digo passando pela porta.
- Claro. Vou treinar minhas "pinceladas" com a esponja para aquele efeito. - Ele faz aspas com as mãos. - Até.
- Até.
Eu me viro e encontro o táxi, entro e digo meu endereço. No caminho, não tenho nenhuma surpresa, mas quando estou aproximando de casa o motorista para. Há outro engarrafamento, logo agora! Eu reviro os olhos, pego meus fones de ouvido, e começo a escutar uma nova música eletrônica que achei na internet.
Mas eu me arrepio, e olho para frente, encontrando nada além de um homem correndo para longe. Ele está no telefone gritando: "Uma ambulância".
- O que aconteceu? - Pergunto ao motorista.
- Parece que alguém sofreu um acidente logo a frente. - Ele suspira fundo, entediado. - Logo na sexta-feira da cerveja...
- Olha, já estou perto de casa, acho que vou a pé. - Pego o dinheiro e pago a corrida inteira. - Obrigada.
Saio do carro, começo a passar por todos os carros parados, chego na calçada e mudo de música. Essa é bem calma, e as batidas acompanham meus passos. Quando chego nas proximidades do parque, resolvo atravessa-lo para chegar mais rápido em casa. Vejo a multidão que vai se aglomerando na rua da frente, e escuto uma ambulância chegando, deve ter sido feio.
No parque, as únicas pessoas que não estão prestando atenção no acidente, são duas crianças. Devem ser irmãos, pois se parecem muito, e a menina é mais velha. Passo por eles, vejo o menino acenando para mim e aceno de volta. E quando eu olho para frente novamente, dou de cara com Morpheus.
- Ah mas não é possível. - Digo e o empurro, andando mais rápido.
- Temos que conversar.
- Não, não temos! Você já deixou bem claro que é um idiota e eu deixei claro que não quero mais me meter nisso! - Percebo que algumas pessoas olham para mim por estar falando alto, mas não me importo.
- E se eu quiser pedir desculpas, aí você me daria atenção?
- NÃO!
Começo a andar ainda mais rápido, quase que correndo, e sinto a mão de Morpheus se fechar no meu braço. Eu paro de andar e me viro, pensando em várias formas de humilhar ele. Mas seus olhos não estão em mim, e sim em algo na nossa frente. Sigo o seu olhar, e no meio da multidão que observa o acidente, uma mulher surge.
Seus cabelos escuros enrolados batem nos seus ombros, sua pele preta é tão suave, que não vejo nenhuma cicatriz, ou marcas. Ela se veste com uma calça jeans escura, uma regata preta, e coturnos. Mas usa um colar prata, com um símbolo que não é tão diferente assim para mim. Sinto como se já conhecesse ela...
- Irmã. - Morpheus diz, e sua mão em meu braço desce até que ele segura na minha mão, tentando me puxar para trás. Eu o olho confusa, mas ele parece não estar com nenhuma dúvida. - Ela não.
- Como assim "ela não"? Tá achando que é quem? - Eu me solto dele e ando para frente, tentando chegar no meu apartamento, mas ele me segura novamente. - Eu vou te bater.
- Ela é minha irmã. - Ele diz, depois de revirar os olhos para a minha ameaça. - Morte.
Eu fico calada, me lembrando de tudo que eu sei sobre ela. Uma dos Perpétuos, basicamente a segunda mais poderosa, aparece para buscar almas. E-ela veio me buscar? Não! Eu não morri! Ou será que morri? O acidente, será que foi comigo?
Ela me encara, com certa afinidade. O que eu falo? Droga!
- Sua cor favorita é preto?
- É sério isso? - Morpheus me pergunta bravo.
- Foi a primeira coisa que veio na minha mente! - Eu olho para ela novamente. - Eu morri?
Mas porque eu posso ver ela? Me lembro de ter lido naquele livro sobre a Morte apenas aparecer para mortais quando fosse "a hora" deles. Ela nos encara, e Morpheus dá um passo à frente, ficando entre nós duas.
- Ela não morreu. Fiquei vigiando ela para isso não acontecer.
- Agora você assume que não cumpriu sua palavra, não é? - Ele não vai escapar desse assunto.
- Irmã. - Ele olha para mim, e vejo que seus olhos estão cheios de lágrimas. - Ela não.
Eu não!
- Não é ela quem eu vim buscar. - Morte diz, e se vira andando.
Morpheus pega na minha mão novamente, e eu tento soltar, mas eu percebo que ele quer que eu o acompanhe. Me solto, então continuo a andar ao seu lado. Seu corpo está rígido e o olhar atento, indo de um lado para o outro, e uma hora, seu olhar foca em mim. Como senti falta desse olhar preocupado comigo, eu não sei.
Entramos na multidão, e procuro o acidente. Vejo que um caminhão está tombado, e do lado dele, um carro prateado estraçalhado. Meu corpo estremece só de pensar numa morte assim, mas ele congela quando percebo de quem é esse carro.
Começo a empurrar as pessoas para chegar até lá, escutando Morpheus me chamando, eu não consigo respirar. Ela não, eu penso. Ela não, ela não.
- NALA!
Eu grito empurrando um policial, que cai no chão e se rala, me xingando. Mas eu vejo os cabelos ruivos cheios de cacos de vidro. Um ruivo mais forte, cor de sangue. Eu me aproximo mais, abro a porta do carro, e o corpo dela cai no meu colo. Seu rosto está irreconhecível, todo rasgado por causa dos fragmentos dos vidros quebrados, no lugar do seu olho esquerdo, há um caco enfiado no globo ocular.
Minha mão treme, e eu tiro o caco de seu olho. Ela não tem reação. Não grita de dor. Porque ela está morta. A única pessoa que eu tenho, quem eu mais amo.
- Não.
Eu digo, e uma ventania começa. Mal consigo abrir meus olhos porque meus cabelos se mexem tanto, que tocam meu rosto. Magia das Almas, minha mãe disse, que seja então. Eu aceito Paraíso se isso trouxer Nala de volta.
- Nada pode trazer ela de volta. - Escuto a voz de Morte atrás de mim. - É a ordem das coisas, até para poderosos que nem você.
- Eu posso fazer.
- Não, não pode.
Morpheus toca meu ombro, e eu perco todas as esperanças que já tive. Ela não.
- Posso trocar de lugar com ela?
- Hailey. - Morpheus me alerta.
- Eu posso? - Eu grito me virando para Morte.
- Isso teria consequências. Mas é possível. - Ela olha para minha amiga. - E então Paraíso morreria com você.
De que lado ela está? Se Paraíso morrer, Lucifer ganha. Olho para Morpheus, e vejo que ele não está preocupado com o comentário da irmã, e sim comigo. Ele balança a cabeça negativamente, e eu começo a chorar. Se eu entregar para Lucifer, não teriam meus pais morrido por nada?
- Posso deixar vocês se despedirem. - Morte se agacha como o irmão, e fica do meu lado. - Não se preocupe, ela vai ficar bem.
Eu olho novamente para Nala, pensando em tudo que queria dizer para ela. O quanto ela significa para mim, o quanto eu a amo. Tenho a chance de falar com ela pela última vez, não posso deixar isso escapar.
Encosto minha cabeça no ombro de Morpheus, e ele me envolve com seus braços. Fecho meus olhos, desejando que isso seja um pesadelo.
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PARADISE ༅ Tʜᴇ Sᴀɴᴅᴍᴀɴ
Fanfiction༄ 𝗣𝗔𝗥𝗔𝗜́𝗦𝗢 - 𝗹𝘂𝗴𝗮𝗿 𝗾𝘂𝗲 𝗿𝗲𝗶𝗻𝗮 𝗮 𝗳𝗲𝗹𝗶𝗰𝗶𝗱𝗮𝗱𝗲. 𝙦𝙪𝙖𝙣𝙙𝙤 𝙚𝙧𝙖 𝙖𝙥𝙚𝙣𝙖𝙨 𝙪𝙢𝙖 𝙘𝙧𝙞𝙖𝙣𝙘̧𝙖, 𝙃𝙖𝙞𝙡𝙚𝙮 𝙨𝙤𝙣𝙝𝙤𝙪. 𝙨𝙤𝙣𝙝𝙤𝙪 𝙘𝙤𝙢 𝙪𝙢𝙖 𝙫𝙞𝙙𝙖 𝙙𝙞𝙛𝙚𝙧𝙚𝙣𝙩𝙚, 𝙨𝙤𝙣𝙝𝙤𝙪 𝙘𝙤𝙢 𝙪𝙢 𝙧𝙚𝙛�...