chapter 𓄿 twenty- five

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Hoje é o décimo quarto dia em que eu não sonho, não encontro nada sobrenatural e não vejo Matthew me seguindo. E mesmo assim, a todo segundo eu acho que Morpheus está à espreita. Me sinto vazia, mas ao mesmo tempo tenho consciência de que tomei a decisão certa.

Nos últimos três dias eu procurei emprego, e cheguei a deixar meu currículo em 3 restaurantes. O problema é que eles são do outro lado da cidade, e terei que pegar muitos ônibus para ir. A dor na minha cabeça não melhora, pois estou também, ansiosa para as provas finais do semestre, e não tenho tempo nenhum para minha arte.

- Hailey! - Nala chega em casa batendo a porta com toda a força que pode. - Chegou uma carta para você!

Meu coração dispara. E o primeiro pensamento é Morpheus, mas ele me mandaria uma carta? Talvez sim, já que ele é um idiota, e um idiota com milhares de anos que pode gostar de coisas tradicionais.

- É de um Estúdio de Arte.

Ah. Eu me levanto do sofá e pego a carta. Abro a mesma e começo a ler automaticamente em voz alta:

- "Convidamos você para participar de uma reunião em nossa empresa para uma possível contratação. O Senhor K. Kyle nos confiou seu nome, e mesmo que não formada, temos interesse em te contratar."

- Pelo menos aquele idiota serviu para alguma coisa. - Nala diz e eu abro a boca.

- Nala! Ele era do lado errado mas... ah deixa, ele está morto mesmo.

Pego o endereço do estúdio e vejo que é relativamente perto da faculdade, ou seja, posso ir a pé. O telefone foi escrito por uma caneta azul, e eu ligo no mesmo, confirmando a reunião ainda hoje ao entardecer. Já vi que vou ficar ansiosa o dia inteiro.

...

Sai de casa uma hora antes da reunião porque eu iria a pé, e de jeito nenhum queria me atrasar. O tempo estava nublado, e se chovesse eu teria que pedir um táxi, mas além do dinheiro, eu carregava na mochila meu currículo, meus fones de ouvido, e meu caderno de rascunhos. Talvez eu tivesse a oportunidade de mostrar alguns desenhos para eles...

O prédio consegue ser o mais moderno que eu já vi, quando eu entro na recepção, uma mulher me leva até a sala onde serei entrevistada, e diz para eu esperar ali até ser chamada. Finalmente, uma mulher com a voz parecida com a que conversei no telefone me convida para entrar.

- Hailey Reviere, certo? - Ela diz, se sentando ao lado de um homem. Eu me sento na frente deles. - Esse é o meu irmão, somos os proprietários do Estúdio. Seu currículo é de fato bom, você fez bastantes aulas optativas na faculdade, e três no curso de artes...

Ela começa a ler as poucas coisas que estão escritas lá, e eu observo o lugar. É uma sala parecida com uma sala de balé, pois atrás deles e na parede atrás de mim têm espelhos. A outra parede, a que da para a rua, é tomada completamente por janelas de vidro escuro.

- Então, você se encaixa no que estamos procurando. Alguém jovem, quase formada, que se interessa pelo propósito do Estúdio. - O homem diz. - Mas gostaríamos de conhecer o seu talento que foi... brevemente, falado pelo Sr. Kyle.

- Talento? - Eu fico confusa, o que eles queriam que eu fizesse?

O homem chama um nome, e uma garota da minha idade aparece com uma tela branca e outras coisas. Ela posiciona tudo na minha frente, e eu fico olhando todas aquelas tintas. Isso faz parte da contratação? Espero que sim, porque eu não quero ter que fugir de mais servos de Lucifer.

- Pinte, por favor.

- Ah. - Digo e coço a garganta. - Pinte o que? Seu estúdio? Ou até mesmo... vocês?

- Queremos ver sua arte, senhorita Reviere. Não importa o que pinte, nos convença que quer o emprego... - A mulher diz, assim, eles pegam o celular e começam a conversar entre si sobre negócios. - Você tem meia hora.

Ela diz isso com a maior naturalidade possível, para uma coisa totalmente difícil. Meu tempo já está correndo, e eu não sei o que desenhar. Como aconteceu quando estava com Destruição e Morpheus.

Pare! Pare de pensar nele! Já faz um tempão! Foque no que te deixa feliz, no que você precisa agora: um emprego.

Respiro fundo, aliviada por eles não estarem me observando e julgando como os dois Perpétuos fizeram. De certa forma, eu sinto que vai ser diferente da minha última pintura, a espada que se transformou em uma espada real. Mas o fundo será preto, sei disso porque quero chamar atenção para a coisa principal. Mas o que seria isso? Administração, o que isso significa para a arte?

Então eu me resolvo: não vou criar nada ligado à administração, eles não querem isso. Eles querem "ver a minha arte". Então, que assim seja.

Minhas mãos sempre trabalham rápido, mas devido à noção de que muito tempo já se passou, eu sou mais rápida. Não consigo controlar minhas mãos, e olho no relógio em cima da cabeça dos dois, ele marca 17:37, já se passou 7 minutos. Droga!

Ás 17:43 eu sinto meu braço ficar dolorido, e um pouco de tinta borra todo meu antebraço. Fico brava por ter me sujado, mas mesmo assim continuo.

- Acabou o tempo.

Me afasto do quadro e pego o mesmo, virando para eles. A mulher sorri e murmura "eu te falei", o homem apenas encara fascinado.

O fundo ficou mesmo preto, chamando a atenção para a silhueta de uma mulher com cabelos enrolados. No lugar onde deveria estar seu rosto, há um céu estrelado com a lua cheia. Árvores crescem até onde deveriam ser os olhos, e há uma estrada onde um carro com faróis amarelo está andando. A mesma cena do acidente dos meus pais, mas não sei de onde surgiu a mulher.

- Muito bem, Reviere. Entraremos em contato. - Ela diz se levantando. - Pode levar o quadro.

- Eu... posso ficar com ele?

- Claro, foi você que pintou. - Ele diz.

Eles saem da sala e me deixam à sós. Eu penso que, se eles tivessem realmente gostado, eles não teriam ficado com o quadro? Me senti insuficiente.

Pego o quadro e vejo que a tinta já está quase seca, então, segurando com as duas mãos, eu saio com dificuldade por todo o prédio. Quando chego na recepção, toco novamente na tinta e ela já está seca, saio de lá e torço para não ser roubada até chegar em casa.

...

Tive uma ideia: vou vender esse quadro assim como vendi aquele para "Hering.Ruivo", vai que ele compra novamente minha arte.

Tiro as fotos, anuncio no site e espero por alguns minutos. Perco a paciência, mesmo que esperei pouco tempo, e vou tomar um banho. Chego no chuveiro já nua e ligo na temperatura mais quente que dá. Respiro fundo, sentindo o vapor entrando no meu corpo. Já se passaram dias, eu não consigo parar de pensar nele, e o pior, estou magoada por ele não ter me procurado.

Escuto uma notificação, e saio do banho procurando meu celular no meio das minhas roupas. "Hering.Ruivo comprou sua pintura por 120 dólares". O valor foi mais baixo, mas mesmo assim, valeu a pena.

PARADISE  ༅ Tʜᴇ SᴀɴᴅᴍᴀɴOnde histórias criam vida. Descubra agora