chapter 𓄿 thirty- five

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Me levanto. Meu estômago revira, sinto um frio infernal, tremo. Minha cabeça gira, minha mente grita e minha garganta fica seca.

- O-o que? - Murmuro baixo, quase não conseguindo falar.

- Hailey. Gosto de você. Mas aconteceu.

- Não. Não. Eu to viva. - Rio. - Olha, eu to... sentindo minha mão. - Mostro a palma da mesma para ela.

- Quando você pulou, sendo uma mortal, o rio levou sua alma. - Ela se levanta, ficando em minha frente, com um olhar preocupado. - Eu sinto muito, mas sua hora chegou.

- Minha hora?

Olho para os lados e não vejo Morpheus em nenhum lugar. Preciso dele. Preciso abraça-lo e chorar em seu peito. Penso nas coisas que coloquei na lista e não pude realiza-las, penso também, naquilo que não coloquei ali. Nunca mais poderei fazer nada disso, não sou mais mortal.

- Isso não é justo. - Lágrimas surgem de meus olhos, que ardem como nunca. - Não é! Se eu soubesse o que aconteceria...

Morte segura a minha mão, como uma amiga. Vejo que seus olhos também estão cheios de lágrimas, mas ela sorri, simpatizamos minha dor. Não me aguento, e a puxo para um abraço. Não sei o que vai acontecer de agora em diante mas eu sei que tenho uma amiga.

Quando nos separamos, o silêncio se quebra. Escuto algo se mexendo entre as folhas, e crio a esperança de ver Morpheus. Mas nada aparece, e eu olho confusa para Morte.

- É o sinal. Está na hora. Venha.

Seguro sua mão, e ela me guia para fora dali. Passamos por várias árvores, subindo uma colina, e chegamos na beirada de um penhasco. O dia estava amanhecendo, as nuvens estavam sendo pintadas com as cores alaranjadas, e uma brisa gelada tocava minhas bochechas.

Havia uma grande pedra cinza quase caindo do penhasco, e dela surgiu um vislumbre prateado. Me aproximo e percebo que é uma escada, quase transparente, mas eu a toco, sentido que é real. Ela leva ainda mais para cima, e eu penso em...

- Paraíso. - Digo baixo.

- Sim. A escada a leva para lá. - Morte se aproxima e coloca suas mãos em meus ombros, me virando para frente do meu destino. - Há muitas pessoas esperando lá, almas boas.

- Não sei como eu vou cuidar de todas elas, eu já tive um coelho e ele fugiu dois dias depois de eu comprá-lo.

- Pessoas são mais fáceis de lidar do que coelhos. - Ela ri. - Use sua imaginação e vai conseguir. - Não entendo o que ela fala, então, ela se explica. - Sua arte projeta o que você quiser, use isso para ajudar as almas.

- É, moleza.

Quando dou meu primeiro passo, a escada se acende em um dourado brilhante, que ofusca meus olhos e os fazem lacrimejar. Olho para Morte, que cruza as mãos, ansiosa.

- Espere, Hailey. - Ela me alerta. - Eu não deveria dizer isso, mas... tem certeza que quer Paraíso?

- Eu já me tornei isso, não tem como fugir.

- Eu sei, mas...

- Tenho certeza. Espero te encontrar novamente, Morte, talvez possamos jogar mais xadrez.

Ela olha para o chão, então eu me viro, começo a subir as malditas escadas, e por minutos eu não paro. Não consigo mais ver nada lá em baixo, e os degraus não parecem acabar. Mas meus passos vão ficando mais leves, mais rápidos, meu corpo começa a se mexer com mais agilidade.

E então a escadaria para, e eu piso em um gramado verde claro e infinito. Olho para os lados e não vejo nada, nem ninguém. O céu começa a escurecer, e uma tempestade está à caminho. Começo a andar, e no fundo, sei quem eu estou procurando: um homem alto de cabelos negros, olhos azuis, boca avermelhada e um irritante senso de humor.

- Hailey?

Uma voz feminina fala atrás de mim, e quando vejo Nala, corro para abraça-la. Seus cabelos ruivos tampam toda a minha visão, e seu perfume muito forte quase me faz espirrar.

- O que tá fazendo aqui? - Ela me empurra levemente. - Não deveria estar aqui.

- E-eu morri, Nala. Vim para cá para me tornar Paraíso.

- Não! Não estava na hora! Você ainda tinha muita coisa para fazer! Isso não é é justo!

- Eu sei que não é, mas não tenho outra opção senão aceitar. Você aceitou sua hora, e eu a minha. - Eu enxugo minhas lágrimas.

- Hailey. Presta atenção. - Ela segura minhas mãos. - Não estava na sua hora, eu sei disso. Morte me disse que demoraria muito para nos reencontrarmos, não deveria ter sido tão... rápido assim!

Também sinto que tem algo de errado, é como se um alerta piscasse no meu interior, como um frio na barriga quando se está com medo. Olho ao redor, e percebo que o lugar não é nada fantástico como imaginei, e sim muito mais... normal. E quando penso que não há ninguém além de mim e Nala aqui, eu tremo.

- Nala, onde estão as outras almas? - Pergunto.

- Eu não sei, sempre fiquei sozinha aqui... - Ela olha ao redor. - Fiquei caminhando, depois de subir as escadas, não sei por quanto tempo...

Ela parece perdida em seus pensamentos, e refaço o meu raciocínio. Se Morte disse à ela que nós demoraríamos a nos encontrar, e Nala ficou andando por um tempo indeterminado por aqui, significa que não estamos onde deveríamos estar.

- Não encontrou ninguém por aqui? - Eu pergunto e ela diz que não.

Paraíso não seria assim, na teoria. Não um lugar vazio, escuro e...

- Nala, temos que achar as escadas novamente. Rápido.

- Ok, mas por que? - Ela começa a andar para o rumo de onde eu vim, eu a sigo tentando respirar.

- Porque acho que não estamos no Paraíso.

Começamos a correr, e muito. A tempestade começa a se aproximar, raios caem, gotículas de chuva estralam quando entram em contato com minha pele.

Chegamos no lugar que deveria estar a escada, e me surpreendo quando a encontro ali. Olho para Nala, e começo a descer primeiro. Na metade do caminho, sinto os degraus tremerem, me seguro no corrimão, gritando de susto.

- Eu acho que essas escadas foram feitas só para subir... - Nala diz.

- Então estamos presas.

- HAILEY! OLHA!

Nala aponta para o começo da ponte, que surge entre as nuvens. Vejo coisas sumindo no meio das cores escuras e raciocínio rápido: a escada está desmoronando.

- CORRE!

Eu me viro e começo a correr, sentindo cada vez mais tudo tremer, e a tempestade lá de cima começa a descer para cá. Não vai dar tempo, meus pés não obedecem meu cérebro, a água deixa tudo escorregadio, não vai dar tempo.

Quando Nala estica a sua mão para o último degrau, visando segurar ali e se salvar, os degraus que estavam apoiando seus pés desabaram. Eu, já estou caindo faz tempo, meus braços parecem bambos por causa do vento forte que os balançam. Meus cabelos parecem chicotear minha pele, mas eu não grito. Tenho que enfrentar o que vier.

PARADISE  ༅ Tʜᴇ SᴀɴᴅᴍᴀɴOnde histórias criam vida. Descubra agora