O que está esperando?

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Ela fala comigo me mostrando duas camisas, mas não consigo prestar atenção. É como uma televisão no mudo em que você olha para as imagens, mas sua cabeça está distante demais para entender o que está realmente acontecendo.

— Morgana, estou falando contigo – ela estala os dedos na minha direção, chamando atenção – qual dessas você gostou mais?

— Ah, não sei... – suspiro – da branca?

— Seu guarda-roupa já é monocromático demais – Isolda faz uma careta – vamos na verde então.

Não sei pra que me trouxe pra isso se minha opinião não vale de nada. Nem vou usar esse tanto de roupa mesmo. Se bem que boa parte que tem aí é para ela também.

Eu comentei com ela sobre minha entrevista de amanhã e ela insistiu que eu tinha que ir com algo que passasse firmeza, além de cortar o cabelo, dar a tal da hidratação urgente nele e tênis novos. Pelo menos nisso eu tive a liberdade de escolher qual queria. Pensei que seus delírios de consumo tinham cessado, mas acho que piorou, ainda mais com seu cartão tendo sido liberado mais cedo.

Passado as compras, vamos ao salão que, segundo ela, por indicação de algumas pessoas, era o melhor. A cabelereira, solícita, pede para que eu me sente e eu me encaro no espelho. Não sei, mas não consigo gostar da minha aparência, mesmo eu estando melhor do que da última vez, porém essa cara amanhecida com olheiras evidentes, olhar cansado e a pele pálida pela falta de sol parecem nunca sumir.

— Quer tirar o comprimento ou só dar um corte? – Diz ela passando os dedos por todo seu comprimento.

Olho de soslaio para Isolda, que dá com os ombros.

— O que você acha, maninha?

— Pode cortar até aqui – gesticulo até pouco acima dos ombros.

— Vai ficar ótimo.

Passamos em torno de uma hora e meia ali, comigo encarando a minha imagem enquanto Isolda olha o telefone, fala nele, anda ao redor, olha o que a cabelereira faz, volta a se sentar, toma água, café e volta.

Quando ela o está secando e finalizando, me sinto estranha. Acho que realmente estava precisando disso.

— Você gostou? – diz ela o balançando devagar.

— Muito – volto a olhar pra minha irmã, que pelo menos não está com uma cara desgostosa.

— Ficou ótimo – Isolda me olha pelo espelho. Saímos dali, lanchamos e voltamos para o apartamento com nossas aquisições.

Quando me sento no sofá e encaro a tela do meu telefone, escuto algo se quebrar ao lado.

— Este caralho desta porra que vá pra puta que vos pariu, merda! – a voz carregada diz derrubando as coisas mais uma vez, e vejo Isolda tentando não rir.

— A vizinha hoje tá atacada.

Desde ontem, na verdade. Só a vejo esbravejar e uma barulheira seguido de um silêncio que depois vem de mais xingamento. Eu até bateria na porta, mas o medo de sofrer uma retaliação é maior e ela também deve querer ficar a sós. No momento que os barulhos cessarem, comparecerei.

Volto a olhar meu telefone. Abro a caixa de mensagens, digito, mas logo apago. Devo fazer isso por umas cinco vezes, e mordo meus lábios devagar como uma punição por não conseguir fazer isso.

— O que você tanto olha aí? – Isolda se aproxima com um short em mão, espiando por cima – Pelo amor de Deus, Morgana, nem pra me lembrar pra comprar um telefone que preste pra ti...

— É que... – cerro os olhos, engolindo em seco – eu conheci uma garota e...

Ela se senta do meu lado, com o olhar surpreso.

As incríveis desventuras de MorganaOnde histórias criam vida. Descubra agora