You were meant to be here from the beginning

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Miguel estava contente em ter a irmã de volta. Fernanda tinha chegado hoje do Rio de Janeiro e passaria um tempo com ele e sua mãe. A loira o abraçou forte na área de desembarque o aeroporto e Miguel retribuiu. Fernanda era professora do ensino fundamental, mas a escola em que trabalhava a tinha dispensado por corte de gastos. Miguel aproveitou para convidar a irmã para passar um tempo no sul, aproveitar a vida de um outro ângulo. Fernanda aceitou, ainda que relutante por ter que conviver com a mãe novamente.

Tereza não a mais agradável das mulheres, e julgava as escolhas de vida de Fernanda muito mais do que a apoiava. Miguel justificava isso com a morte do pai ainda ser recente, mas para Fernanda, 6 anos era tempo demais.

— Eu senti tanto sua falta. — ele falou com um sorriso enquanto a guiava para fora do aeroporto, puxando a mala dela.

— Eu imagino, convivendo com a dona Tereza não de ser fácil.

Miguel revirou os olhos e riu da birra da irmã com a mãe. Ele tinha ido morar em Monte Castelo depois da morte do pai. Antes vivia em São Paulo, vivendo dos frutos de seu sítio em Mogi. Damião, seu pai, tinha o apoiado na escolha da profissão e Miguel tinha ido para o interior de São Paulo estudar agronomia na mesma faculdade que o pai tinha feito. Depois de formado, Miguel escolheu caminhar com as próprias pernas ao invés de voltar para a fazenda. O sítio em Mogi era o melhor teste para saber se um dia estaria pronto para assumir as terras que vinham de gerações.

Mas Damião se foi muito cedo, e Miguel, aos trancos e barrancos, teve que aprender na marra a lidar com uma grande propriedade e a continuar gerando o mesmo rendimento de antes para oferecer a sua mãe e irmã a boa vida que sempre estiveram acostumadas. Na época, Fernanda tinha acabado de arrumar um emprego como professora auxiliar de uma grande escola no Rio de Janeiro, mesmo com 20 anos e ainda no segundo ano de pedagogia na Universidade Federal, e não pensou em voltar para apoiar a mãe na perda.

Isso gerou uma rachadura na relação delas, que nunca foi muito boa.

Miguel colocou a mala na caçamba da caminhonete prata. Logo estavam na estrada que os levaria de Porto Alegre para o vale dos vinhedos. Ela tinha o vidro aberto, aproveitada o vento batendo no rosto.

— Desse jeito vai pegar um resfriado. — ele falou, preocupado. — Está sol, mas esse tempo engada.

Fernanda riu e se voltou para o irmão.

— Você que sente frio demais. Para quem mora no Rio isso aqui é o paraíso dos climas.

A professora se inclinou para ligar o rádio, e se arrependeu no minuto que a próxima música começou a tocar. Olhou para Miguel rapidamente.

''Ainda que eu falasse a língua do homens...''

O agrônomo trocou de estação sutilmente. Respirou fundo e continuou como se nada tivesse acontecendo. Fernanda o olhou arrependida. Fazia tanto tempo e ele ainda não conseguia superar, não conseguia imaginar como ele vivia todo esse tempo sem nem tocar no assunto. O nome Ana era proibido entre eles, foi um acordo silencioso depois da tragédia.

Acontece que aquela música era uma ferida aberta. Fernanda nem ao menos conseguia entender como ele vivia em uma vila chamada Monte Castelo.

O resto do caminho foi feito em silêncio.

Chegaram na vila quase duas horas depois, Fernanda olhava tudo encantada. Existiam algumas coisas que nunca mudavam, e Monte Castelo era uma delas. A vilinha tinha casas simples e aconchegantes, uma praça central com uma igreja, uma padaria, um bar. As pessoas andavam muito de bicicleta e cavalo. Carros eram poucos, a maior parte dos fazendeiros. Um posto com gasolina e uma agencia bancária. Duas lojas de roupa, um restaurante.

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