ainda se eu falasse a lingua dos anjos

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— É incrível como você consegue ser irritante até no dia do meu casamento. — ela implicou com Berenice enquanto a mulher arrumava seu cabelo.

— É lógico, você está me dizendo que quer trabalhar! — Berenice exclamou irritada, se sentando, a barriga despontando no vestido verde que usava.

— Não é trabalhar. — ela enfatizou. — É uma reunião rápida para acertar um negócio importante.

— Querida, eu concordo com Berenice. — Zenaide falou com um sorriso preocupado. — Você tem que estar na igreja às três da tarde, agora são uma e meia e você nem colocou o vestido ainda.

Angélica se levantou rápido, ajeitando o roupão mais firme em seu corpo. Olhou para a amiga que a reprovava só um olhar apenar. Eita mãe firme. Caio quando crescesse teria um grande problema com a dona Berenice.

— É super rápido, quanto mais vocês reclamarem, mais eu vou enrolar no escritório.

— Vai, criatura. — Berenice exclamou. — Vai logo.

Angélica desceu as escadas apressada, viu Pedro na sala, que não entendeu nada, e se trancou logo em seu escritório. Respirou fundo. Essa reunião definiria muitas coisas daqui para frente. Caminhou até sua mesa, abrindo a última gaveta e tirando uma pilha de exames, queria avaliar todos juntos com a doutora.

Abriu a página da reunião, esperando nervosa sua médica entrar. Logo ela apareceu na tela e ficou surpresa ao ver Angélica toda arrumada.

— Meu Deus, mulher, seu casamento. — ela exclamou rindo.

— Eu preciso saber... antes de casar eu preciso ter certeza.

Andrea balançou a cabeça rindo.

— Angélica, eu recebi seus exames de Porto Alegre e eles estão ótimos! — a mulher loira exclamou. — Não há nenhuma contraindicação para gravidez, como eu já suspeitava.

Angélica abaixou a cabeça e riu, um peso enorme saindo de seus ombros. Nos últimos dois meses, Miguel vira e mexe falava sobre filhos e como não via a hora de Angélica estar pronta para começar uma família. A ruiva tentava disfarçar, mas era inevitável não ficar insegura. E se não pudesse ter filhos? E se sempre abortasse? As vezes seu corpo simplesmente não era feito para isso.

Mas as palavras da médica fizeram lágrimas brotarem em seus olhos. A ruiva teve que controlar para não borrar a maquiagem ou Maria Antônia a mataria.

— Quando aquele evento aconteceu em Maio eu te expliquei que era normal um abordo na primeira gestação, algumas mulheres abortam achando que é uma simples menstruação.

Angélica ria de felicidade, ouvindo atenta as palavras da médica.

— Você pode parar de tomar o anticoncepcional, seu corpo vai demorar uns dois ciclos para entender e logo depois já pode esperar o resultado positivo para gravidez.

— Você não sabe o peso que tirou dos meus ombros. — Angélica falou sorrindo.

— Eu imagino, agora vai... vai casar logo e encher essa casa de filhos.

Angélica subiu as escadas anestesiada, um sorriso de orelha a orelha. Nem as brincadeiras de Berenice seriam o suficiente para lhe irritar novamente.

— Deu certo o seu negócio? — Zenaide perguntou.

— Muito certo, tia... — ela falou rindo. — Muito.

— Certo, que bom! Agora se senta porque você precisa casar.

Miguel desceu o vestido devagar. Estavam em um hotel de luxo em Gramado, o quarto repleto de velas, o cheiro de rosas enchendo o ambiente. Angélica se virou para ele, agora apenas de lingerie branca. Desabotoou a camisa do marido devagar, revelando o peito para as luzes das velas. Devagar ela foi beijando o peito dele, caminhando em um trilha para baixo até estar de joelhos na frente dele.

Ela sorria como se o tocasse pela primeira vez.

— Você está radiante hoje. — ele disse enquanto ela desfazia o botão da calça antes de desceu e se colocar de pé na frente dele novamente.

— Como eu não estaria? — ela disse, envolvendo os braços ao redor de seu pescoço

Miguel caminhou devagar, os deitando na cama. Angélica suspirou ao sentir o corpo dele. Era como se fosse a primeira vez.

— Eu disse 'sim' ao amor da minha vida hoje. — ela sussurrou antes de puxá-lo para um beijo quente.

Andrea estava certa. Durante dois ciclos, o corpo de Angélica se adaptou, e em dezembro, no dia do aniversário de seu marido, a ruiva caminhou devagar até a sala. Ela tinha uma mão nas costas, segurando uma surpresa. Tinham escolhido ficar em casa – agora a fazenda Viana era sua casa, enquanto a fazenda Aguiar tinha ficado com Tereza. Naquele dia, comemoram entre eles com um jantar mais íntimo.

Miguel viu a meia taça nas mãos da esposa e sorriu.

— Ocasião especial? — ele perguntou enquanto segurava a taça, esperando ela se sentar ao seu lado.

— Não é? — ela perguntou. — É seu aniversário.

— Pode ser... — ele falou, rindo um pouco, nada convencido.

Angélica revirou os olhos e sorriu.

— Que tal essa ocasião aqui? — ela falou enquanto mostrava os sapatinhos que estava na outra mão.

Miguel demorou para raciocinar o que aquilo significava, mas quando ele entendeu, não demorou muito para se colocar de joelhos na frente dela, enchendo seu ventre de beijos. Ele tinha os olhos cheios d'água quando olhou para cima e a viu o encarando com um sorriso lindo.

— Você jura? — ele sussurrou.

Angélica balançou a cabeça que sim.

— Estou grávida, Miguel.

No primeiro ultrassom, Miguel chorou como uma criança. No segundo, Angélica só faltou inundar o consultório médico quando ele disse que era uma menina. No dia que compraram os móveis, Angélica o puxou para o escritório para reviver uma noite há tempos atrás, sobre a mesa. Naquela noite, ela chorou ao dizer o nome que queria ver na filha deles.

Hoje era aniversário de casamento deles, mas Angélica estava exausta demais para comemorem com um jantar romântico. Sua filha tirava toda a energia dos dois, a garotinha não tinha nem um mês, mas já chegou agitando a vida daquela família. Miguel abriu os olhos devagar ao escutar um choro vindo do fim do corredor.

Tratou de acalmar Angélica, que já começava a se levantar.

— Eu cuido dela de noite, amor. — ele disse, beijando seu rosto.

Angélica voltou a dormir logo e Miguel sorriu.

Entrou no quarto em tons pasteis de azul, com móveis de madeira. Uma coisa bem pouco poluída. Foi uma briga, mas a arquiteta venceu no final das contas. Se aproximou do berço e sorriu. Ana era um bebê grande e chorava manhosa. Miguel a pegou nos braços e caminhou até a poltrona que ficava perto da janela, aproveitando a vista para o vinhedo e o luar.

Angélica tinha escolhido o nome e quando ela lhe contou que pensava em Ana, Miguel chorou. Isso ia além de fazer as pazes com seu passado. Era construir um futuro completamente diferente. Aquela última carta, as últimas palavras, sempre martelavam em sua cabeça quando olhava para sua filha. ''Eu quero que se cuide, porque eu sempre vou estar cuidando de você.''

Ele começou a se balançar devagar para ninar, vendo a menina fechar os olhos novamente. Ana era seu anjo na terra agora. Devagar ele começou a cantar.

Seu anjo tinha cabelos ruivos como os da mãe, olhos verdes como os dele e gostava de Monte Castelo.

— Ainda... que eu falasse a língua dos anjos... e falasse a língua dos homens... sem amor... eu nada seria...

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