18- Vento que fala e lágrimas.

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     Quando Max se levantou na manhã seguinte a chuva não caía mais do lado de forá como na noite anterior, agora se formava como pequeno chuvisco, trazendo um clima mais leve e aconchegante.
     Ele tivera uma ótima noite de sono, ou devo dizer madrugada? Quase não foi capaz de lembrar que uma hora ou outra receberiam uma punição, ou que poderia ocorrer um possível fim do mundo a qualquer momento. Por hora, ele estava feliz.
     Ele se questionava se séria uma boa idéia contar a Zack sobre o beijo, ele era seu melhor amigo e o amava, embora talvez pelo fato de não ir muito com a cara de Uriel, não reagisse de uma forma tão positiva.
        Todos já estavam no refeitório quando ele adentrou o local, alguns mais bem dispostos do garoto sentando-se ao lado do amigo.

— bom não é bem uma definição — Lyla resmungou deixando a pizza cair da mão de volta no prato.

     Zack não respondeu. Ao invés disso enfiou mais pedaço de panqueca na boca.
Talvez ainda estivesse digerindo os acontecimentos da noite passada, essa era o único motivo que se passou pela mente de Max. Ele não via outro motivo para Zack estar chateado ou com raiva.

— dormiu bem? — Uriel perguntou com um sorriso amigável.

— Sim e você?  — Zack encarou os dois com as sobrancelhas arqueadas.— Como estão os cortes?

— bem melhores — ele disse levantando uma das mangas do moletom, mostrando-o os machucados.
    
— Idiota — o garoto de óculos deixou escapar amargo, não tão baixo quanto gostaria.

   Zack se levantando mesa. Os deixando para trás.

— o que deu nele? — Uriel perguntou com uma expressão preocupada.

— acho melhor ver o que está acontecendo — Max disse indo atrás do amigo..

    Ele seguiu pelos corredores atrás do melhor amigo. Pegou o elevador até o andar dos quartos, questionava-se como um garoto que tinha tamanha aversão a esportes, poderia ser tão rápido quando agora. Ele deu duas batidinhas, abrindo a porto do quarto. Nem sinal de vida, apenas uma cama arrumada e um quarto anormalmente organizado.
  Max deu meia volta respirando profundamente. onde ele poderia estar? Onde ele poderia estar?

     O garoto passou a mão pelos cabelos mordendo o canto do lábio inferior.

— merda — Balbuciou para o corredor vazio.

Uma brisa fria fez sua nuca arrepiar. O que era muito estranho pois estava dentro de um prédio fechado com janelas lacradas.
      Ele encarou a escada de emergência, o vento gélido o invadindo de novo. Não era um vento comum. Ele sussurrava.

— No terraço?

  Ele correu até a o elevador, apertando repetidamente o botão para o último andar.
A perna chacoalhava impaciente até que a porta se abriu. Max encarou amontoado de espaço vazio e aparelhos de ar-condicionado espalhados, até encontrar uma figura tênue sentada no beiral do prédio, balançando os pés no ar.

— Zack? — Max chamou.

     Com forme se aproximou pode perceber que ele chorava. Um choro baixo e dolorido. Seu rosto enfiado entre os braços formando um abraço, o óculos jogados em um canto ao seu lado. A pior cena que Max poderia estar presenciando. E que ele sentia ser culpado de causar. Medo o invadiu.

— Zack por favor... — sentiu a voz falhar engolindo o seco.— conversa comigo.

   Ele levantou o rosto molhado como se contemplasse o horizonte, deixando o ar escapar. Mas não olhou para Max, não tinha essa coragem, não agora, não naquele estado.

— eu só posso saber o que você tá sentindo se me contar, okay?

   Zack abriu e fechou a boca algumas vezes, as lágrimas não pararam de cair, pelo o contrário elas só insistiam mais e mais. Ele e Max já eram amigos a anos mas eles nunca tinha visto Zack chorar daquela forma. Max sentou-se ao seu lado no pequeno murinho de segurança. Ficaram em silêncio por alguns segundos encarando uma cidade acalmada por um dia de chuva.

— E-eu... — Zack engoliu o orgulho e reuniu o resto de coragem que tinha. — Quando você decidiu que ficaria lá com ele... E me mandou ir embora, eu senti que iria te perder. me senti inútil e descartável. Não tinha serventia para vocês, na verdade eu entendo que só iria atrapalhar. Já venho me sentindo assim a um tempo, todos acham que eu sou um fardo. E o pior de tudo é que eu também acho.

Ele virou o rosto para o melhor amigo, os olhos de Max ardiam enquanto ele falava.

— Eu não acho que você é um fardo.

  — eu vim pra cá por você... porque você é minha única família e não me perdoaria se algo acontecesse com você, e não tivesse feito nada. Mas eu já não pude fazer nada, em um momento que você precisava de ajuda — Zack limpou as lágrimas com as costas das mãos. — mas ele pode. Parece que agora vocês tem um lance ou sei lá, ele tá lá por você, ele pode te proteger. Mas onde eu fico? Onde é o meu lugar? Eu não sei.

— seu lugar é aqui comigo!, não me protegendo, porquê não preciso que ninguém me proteja. Mas preciso do seu apoio. Um pelo outro lembra? — Max disse
Soturno. — lamento que tenha se sentido assim. Você sempre vai ter um lugar na minha vida. Mesmo que não tenhamos o mesmo sangue, o que é melhor pra você, vai por mim. Eu te amo cara e isso é que importa. É o que sempre importou para mim e ninguém vai te tirar isso.

    Eles se abraçaram, os dois cedendo ao sentimento.
     As vezes olhamos apenas para o próprio umbigo e nos preocupamos tanto com nós mesmo que esquecemos que as pessoas a nossa volta, podem estar passando por um momento tão difícil quanto o nosso. Eu fui negligente com meu melhor amigo, mas agora estava tudo bem. Eles estavam bem, independente de tudo.
     Família é sobre isso, sobre pertencer. Eles eram uma família, mesmo que  Zack fosse órfão e que aquele homem horrível fosse o pai de Max, ou que ele não conhecesse sua mãe. Nada disso importava, porque eles tinham um ao outro, e isso para eles já bastava. Sempre bastou.

Max estendeu o dedo mindinho:

— irmãos para sempre?

— irmãos para sempre. — Zack deixou um sorriso frouxo escapar. — mas você ainda vai me contar esse seu lance com o Uriel.

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