Especial: Um Ato de Bondade

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Naquela época, eu olhava para o sol o dia inteiro, uma enorme bola amarela que ilumina todo nosso planeta... era sempre tão legal imaginar, quando eu fosse gigante, igual os adultos, iria chutar o sol e o usar para jogar bola! Com a lua também não era diferente esse pensamento, mas por ela só aparecer à noite, sempre perdia a vontade de brincar por conta do cansaço.

Um lugar sujo, com pessoas imundas, uma vida imunda, tendo que se alimentar de ratos para sobreviver... não tinha como ter nojo daquilo, afinal, o dom da visão nunca me foi dado, me fazendo ter que imaginar a aparência da minha comida, a aparência do lugar em que eu morava, a aparência daquela senhora que sempre me ajudava. Uma vida difícil para alguém da minha idade.

-"Você não é uma garota! Toda bruta e imunda desse jeito!" Lembro-me de uma vez me aproximar dos garotos que jogavam bola, eles utilizavam uma espécie de Temari, uma bola especial semelhante a bola de vôlei, só que mais leve ainda, daria para a chutar também, e arremessar lá para o alto, ela voava pelo céu, meu sonho era ter algo igual àquilo, ou brincar com algo semelhante. Porém, aqueles garotos, que provavelmente tinham nove anos, nem se importaram em me incluir, somente porque cheguei ansiosa e com meu visual. Não tenho culpa se os donos de loja não me deixam pegar as roupas limpas deles.

-"Saia da minha loja! Aberração! Se até mesmo Deus te abandonou, não sou eu que vou te ajudar!" O que aquilo tinha a ver com religião? Não aguentava mais usar aqueles trapos, aquela roupa suja, aquele cheiro imundo, aqueles pés pretos por nem ter um calçado... e minha barriga, ela roncava de fome a todo momento, mas nunca reclamei disso, me desfazia de comida somente para ter uma roupa limpa, somente para não parecer um verme, somente para tentar sair daquela miséria, por quê?

Porque todos me tratam como se eu fosse inferior? O que fiz, além de nascer, para merecer algo assim? Nunca tive um pai, ou uma mãe, fui abandonado(a) logo de início; e se foi Deus que fez algo assim, por que as pessoas devotam sua fé a ele? Por que ainda há gente que reza se ele é cruel desse jeito?

-Que dor de barriga...- Mais uma noite em que me alimentava pouco, dormindo sozinho em um beco qualquer da vila.

-Não estou sentindo minhas pernas... que sede, acho que brinquei demais hoje...- Mais um dia em que caía no chão, no meio da ponte da vila... brinquei muito mesmo? Ou somente fugi das pedras que me jogaram... parando para pensar, meu corpo também doía, mas não precisava me preocupar tanto, elas iam melhorar, logo sairia correndo de novo.

-"Não fique olhando, continue caminhando" Sempre as mesmas palavras.

-"Pobres coitadas" Como algo assim ajuda?

-"Rezo para que possam sair desse estado" Como podem agir dessa forma? Com apenas uma criança. Não gostava de admitir mas... todo dia, eu sentia raiva.

Raiva das crianças que não me deixavam participar das brincadeiras.

Raiva dos adultos que inventavam desculpas, ou falsas ajudas, para não fazerem nada.

Raiva do meu pai que nunca conheci.

Raiva da minha mãe que escolheu me ter somente para me abandonar.

Raiva da vila em que morava.

Raiva desse mundo tão injusto.

Raiva de viver com esperança.

Raiva de continuar caminhando sem enxergar.

A mais pura, e simples, raiva por tudo!

-"Não é uma condição boa para uma criança, desmaiar no meio da ponte" Até... que a raiva simplesmente passou.

Kimetsu no Yaiba: SwapOnde histórias criam vida. Descubra agora