Primeiro dia estressante

290 28 0
                                    

      Desço as escadas pesadamente, preparando-me para o que viria a seguir. Alcanço o corredor rapidamente, ciente de que Chris, Dianna, Annabely e Luize estão logo atrás de mim. Quando chego ao fim do corredor, paro à porta da cozinha. Em volta da mesa estão meu pai, Will, Stive, tia Bel, tio Billy, Vanessa, Hellena, Liam, Amélia e Júnior, como previa, afinal o pai de Hellena e Luize nunca vem, e a mãe de Annabely, Dianna e Chris mora no exterior, estando separada de tio Billy. Não que eu esteja reclamando, claro... a casa já está cheia o suficiente.

      Mamãe serve o café, enquanto todos em volta da mesa conversam animados — exceto por Hellena, que parece estar entediada, e Amélia que está preocupada demais com suas unhas. Ninguém parece notar a mim e aos meus primos até o momento em que Chris adentra a cozinha e se senta ao lado de Hellena.

      Mamãe olha-nos parados à porta e convida:

      — Venham! — e sorri — Acabo de preparar o lanche de vocês.

      Amélia para de lixar as unhas e me fita com um ar de desaprovação e, em resposta, fuzilo-a com os olhos. Não é novidade para ninguém meus sentimentos em relação àquele triozinho, então eu sempre me certifico de mantê-los atualizados sobre isso.

      Annabely, Luize e Dianna obedecem minha mãe, sentando-se — Annabely ao lado do irmão, Dianna ao lado de seu pai e Luize, de Stive. Sobram três cadeiras, uma entre tia Bel e Hellena, outra entre Liam e Will, outra entre papai e Annabely. Eu não tive que pensar muito na hora de escolher onde me sentar; relutante, adentro a cozinha carrancuda e me sento entre papai e Annabely.

      — Que foi, Emma, querida? — pergunta meu pai.

      Corto uma fatia de bolo e coloco-a no meu prato.

      — Nada, pai. — digo de cara feia — Estou perfeitamente bem.

      Como apressadamente, como que descontando no bolo meu desconforto em estar ali. Faço questão de não olhar para ninguém enquanto como, para a segurança deles mesmo.

      — Acho que um bicho mordeu ela — o idiota do Liam ri, debochado — porque ela é sempre tão amável!

      Dou uma garfada no bolo com mais violência, semicerrando os olhos para ele. Eu queria mesmo é jogar um prato no rosto dele, isso sim.

      — Assim como você, não é seu estúpido? — retruco no reflexo.

      Tia Bel parece se engasgar com o suco, mas tio Billy ri, divertido. Will olha dele para mim com um sorriso idiota na cara. O resto dos presentes eu nem perco o meu tempo vendo o que estão fazendo, porque na verdade eles devem estar igualmente surpresos. Afinal, se pararmos para pensar, o que Liam havia dito de tão sério para eu me revoltar? Bem. Eu odeio ele, até sua respiração me incomoda, então isso explica tudo.

      — Exato, florzinha. — ele continua com aquela ironia na voz, e eu acho mesmo que ele está determinado a me irritar. — Assim como eu.

      — Ah, cala essa boca. — revido os olhos, me perguntando o que eu fiz para ter esse inútil dentro da minha casa.

     Dianna pigarreia, chamando minha atenção.

      — Emma, vem aqui comigo rapidinho?

      Nós passamos pelo longo corredor e chegamos à sala, sem dar sequer um pio. Contudo, minha linha de pensamentos ainda está totalmente ligada àquele ensaio de discussão que acabara de ocorrer e nas diversas boas respostas que eu poderia ter dado. Assim que percebo, Diana já havia parado de andar e agora me fita fixamente.

      — O que quer? — pergunto, confusa.

      Ela solta um longo suspiro.

      — Se você continuar dando ideia ao que o Liam fala, vão acabar se matando!

      Fico esperando por algo mais, o motivo real de ter sido chamada. Quer dizer, não é possível que seja só isso.

      — E você me trouxe aqui para falar isso? — pergunto.

      — Isso é sério, Emma.- Ela diz, e pelo tom da sua voz, vejo que realmente se trata de algo sério, que eu não compreendo de jeito nenhum.

      — Espere. — estreito os olhos — Do que você está falando exatamente? Eu não mataria aquele imbecil, por mais que queira.

      Ela deixa que um silêncio paire entre nós por alguns segundos, me encarando diretamente nos olhos. Um suspense esquisito começa a crescer e eu não sei se consigo a encarar por muito mais tempo.

      — Emma, eu tenho um pressentimento — ela diz finalmente.

      A princípio, até tento ficar séria, mas acabo caindo na gargalhada. Quer dizer... O que é todo esse negócio de pressentimento que ela sempre diz? Não é como se as coisas fossem dar errado só porque ela pressentiu isso, não é mesmo?

      — Didi — digo após controlar a risada — Não sei ele, mas eu não sou psicopata, okay?

      — Tudo bem, Emilia. — ela diz e eu, francamente, detesto quando usam meu nome real. — Mas eu trouxe você aqui para te afastar do Liam, feliz?

      Assumo a expressão de quem está impressionada e dou um abraço nela.

      — Obrigada. Eu perto do Liam e de uma faca ao mesmo tempo...

      Ela se separa de mim e me segura pelos ombros, me dando bronca com o olhar.

      — Que foi? — rio. — Você acaba de salvar a vida dele.

      — Agora vai já pro seu quarto. — ela diz. — Eu vou avisar lá na cozinha que você não está se sentindo muito bem.

      Dou um sorriso. Ela sabe que o que eu mais queria era me livrar daquele lanche da tarde horrível.

      — Obrigada.

      Subo as escadas correndo, enquanto Dianna volta para a cozinha. E é lá, no meu quarto, onde eu passo a tarde inteira. Ora lendo, ora recebendo visitas de meu primo e irmãos, outrora de minhas primas, ou descendo para comer algo...

      Até que chega a noite. Vou dormir cedo e, para minha alegria, Dianna e Hellena dividem o quarto comigo. Acontece que eu, por algum motivo desconhecido, não consigo pregar os olhos. O dia tinha sido parcialmente normal, e não faz nenhum sentido minha insônia. Mas simplesmente não posso. Viro e reviro na cama, tentando obrigar-me a dormir. Missão falha, obvio. Então me sento e olho em volta. Está bem escuro, mas posso distinguir as camas que estão ocupadas por minhas primas e outros móveis. Elas dormem silenciosamente.

      Vejo que não serei capaz de fazer o mesmo e, jogando as cobertas para o lado, coloco meus pés no chão frio e levanto. Atravesso o quarto cuidadosamente para não acordá-las. Outra missão falha.

      — Emma? — é a voz de Hellena, praticamente sussurrando. — É você, não é?

      — Sim, Lena, sou eu. — sussurro de volta.

      — Aonde você vai?

      Percebo, por sua silhueta, que ela também está de pé.

      — Só não consegui dormir. — digo. — Vou ali embaixo.

      — Posso ir com você? — ela pergunta.

      — Claro.

O país secreto. Onde histórias criam vida. Descubra agora