Demmie e eu conversamos muito pelos dias que se seguiram, e acabamos não chegando a conclusão alguma. Dianna está cada vez mais alienada, mais respondona e mais impaciente, características que são de longe distintas das da verdadeira Dianna. Não há doçura naquela... nem a expressão séria de quem vai resolver todos os problemas do mundo. Não há o ar de adulta responsável — mesmo que ela tenha apenas dezesseis anos. Sinto falta da verdadeira Dianna... pois a que nos acompanha só me causa raiva.
Demmie tem se mostrado uma amiga incondicional durante nossas conversas. Ela sabe tudo sobre mim, me consola e me entende sobretudo. Me cede seu ombro para eu chorar, enxuga as minhas lágrimas e me dá as sacudidelas mais brutas de todas, ordenando que eu seja forte.
Mas como é "ser forte"? Uma espécie de charada, talvez?
A tarde está um pouco mais fria do que costuma ser e felizmente eu tenho minha reserva de calor para me aquecer. O vento sacode meus cabelos e meu surrado vestidinho roxo, mas a sensação não é nem um pouco ruim.
Depois de caminharmos por horas a fio, nossos pés já não aguentam mais de dor. Paramos sob uma longa árvore robusta e nos sentamos próximos uns dos outros. Aquela parte da floresta é, na verdade, o início de um precipício, onde adiante vê-se um amontoado de colinas e montes enevoados. No chão, folhas secas e gravetos se espalham, provavelmente soltos de algumas dessas árvores, e o único som é o do assobio do vento chacoalhando as folhas ao redor.
Esquento a caça, ao passo que Jayssa nos arranja água e Hellena a esfria, e só quando estamos satisfeitos, começamos a nos dispersar. Os únicos que permanecem sob a árvore são Giroy e Demmie, pois logo eu também me levanto e me dirijo à silhueta gorda e alta do meu avô, postado diante da borda do penhasco.
Doquo é um enigma, e já me convenceu disso. Com seu rosto enrugado pela idade, os poucos tufos de cabelos ruivos na cabeça, sua barriga protuberante e sua barba longa bifurcada, não é tipo de herói que costumamos imaginar. Mas não deixo de pensar em sua importância nessa história, afinal, não fosse por ele, meus irmãos, meus primos e eu jamais nasceríamos... nada disso seria real.
— Emma — diz, de costas para mim. Sua pose solene, as mãos cruzadas às costas, os olhos castanhos esquadrinhando a paisagem de montanhas e vales verdejantes...ele parece um homem incrivelmente sábio. — Vejo que há dúvidas que rondam sua mente. Venha cá. Quero que veja uma coisa.
Incerta, mas curiosa, aperto a barra do vestido entre os dedos, de olhos atentos na figura de costas para mim. Ele é meu avô, afinal. Eu não deveria me sentir intimidada ao falar com ele. Ainda assim, hesito bastante antes de deixar minhas pernas me levarem para o seu lado, perto demais da borda do penhasco, o suficiente para me deixar enjoada. Engulo em seco, imaginando o velho Doquo me empurrando lá para baixo.
— Eu sugiro que relaxe, mocinha — Sua voz grave e rouca surge feito um sussurro. — Não há necessidade de temer ao seu próprio avô.
Olho-o de soslaio, timidamente. Sua semelhança com meu irmão é perturbadora o suficiente para eu não encará-lo por mais que poucos segundos.
— Perdão — murmuro, pigarreando em seguida e repetindo num tom mais alto: — Perdão. É que eu estou com um tantinho de medo de... cair.
— Você não vai cair, que bobagem — ele ri pelo nariz, oscilando levemente para frente e para trás. — Eu só queria... bem, olhe aquilo ali, Emma - Ele aponta para frente, para a mais alta e mais distante montanha, que além de ter o pico coberto por uma camada de neve, está rodeada por uma névoa espessa. Estreito os olhos, arriscando mais um passo para frente, e é então que avisto o pontinho insignificante no alto da montanha. — Aquele é o castelo. O seu castelo. De todos os meus netos.
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O país secreto.
FantasyEmma é uma jovem que gosta de fazer coisas diferentes, que fogem do cotidiano e quase sempre espera viver grandes aventuras com os irmãos e primos. Mas em uma tarde que parecia normal, Emma, seus irmãos, primos e amigos- Não necessariamente amigos...